Luanda - No meado da década de 80 que se começou a verificar graves desequilíbrios macroeconómicos e sociais em Angola, a princípio, estes desequilíbrios estavam directamente relacionadas com choques internos e externos (políticos e económicos). Ao nível económico, estava a questão relacionada com a queda acentuada do preço do petróleo no mercado internacional (1985-1986) e, ao nível político, havia uma subdivisão dos desequilíbrios: a nível interno, com a intensificação da guerra civil entre a UNITA e o Governo, a nível externo, o desmoronamento do BLOCO SOCIALISTA e o término da GUERRA FRIA.

Fonte: Club-k.net

Portanto, o ano de 1989 a 1991 assinalou-se aquilo que ficou conhecida como a virada da história contemporânea, isto com o fim do suposto REGIMES FECHADOS/COMUNISMO e sublevação da GUERRA DO GOLFO PÉRSICO. Angola foi exactamente afectado também com estas mudanças e transformações que o mundo viveu, na qualidade de um país periférico do BLOCO SOCIALISTA. Com isso, os efeitos da guerra civil a nível interno, degradou as infra-estruturas do país, provocando instabilidades macroeconómicas como também no quadro político-institucional. O baixo nível de desenvolvimento do capital humano e tecnológico foi (e continua a ser) uma das principais limitações à recuperação efectiva ao desenvolvimento e crescimento económico e do capital humano. Apesar dos grandes esforços do Governo na altura (e continua a sê-lo) para alargar o acesso à educação e reconstrução e recuperação das infra-estruturas, facultar a formação académica aos cidadãos, a situação ainda era agravada devido à deterioração aguda do sistema de ensino e de saúde. Como também de outros sectores sociais.

O resultado estava por um lado, na baixa produtividade em muitos ramos da economia e por outro, a guerra civil que travava com toda pujança os investimentos para recuperação dos sectores-chaves da macro e microeconomia, como também o processo de inclusão socioeconómica para a galvanização da sociedade. Nas áreas rurais durante o período de instabilidade política, verificou-se uma rotura forte ou mesmo quase total da vida normal dos cidadãos, devido à guerra, com excepções de algumas áreas codificada como seguras, nomeadamente no Sudoeste do país. Ora, na maior parte das zonas rurais, as comunidades ficaram reduzidas ao nível mais elementar de auto-subsistência, não conseguindo muitas vezes satisfazer as suas necessidades básicas, como também, o agravamento da pobreza resultante da rotura das ligações comerciais, da redução das áreas cultiváveis (insegurança, campos minados e a insuficiência da força de trabalho masculino para preparação da terra) e da descapitalização resultante da perda de animais, instrumentos de trabalho e sementes.

Durante este processo turbulento que inundou o país, muitas comunidades rurais foram vítimas de pilhagens sucessivas pelas tropas das FALA/UNITA e submetidos também (rapazes e raparigas) a um processo de recrutamento forçado e muitas aldeias e povoados, perderam a maior parte ou a totalidade do seu gado e dos seus outros recursos. A fome e seca, a falta de acesso á cuidados de saúde e outras formas de privação, para além da insegurança regular, foram os principais factores que levaram as populações das zonas rurais a migrarem para a capital (Luanda), abandonando as suas propriedades em busca de ajuda humanitária e de protecção contra os ataques.

Nos anos de guerra, as zonas rurais foram reduzidas a um nível de prática de actividades de agricultura de subsistência para os guerrilheiros, afastando a produção ao sistema de escoamento para todo país e simultaneamente para os mercados, nos casos em que não se viram forçados a fugir para as cidades tidas como seguras. E as zonas urbanas, onde a população aumentou com o êxodo rural foi elevada a taxa de crescimento populacional, a economia sofreu reveses de estagnação profunda quase sem interrupção desde o período de transição para a independência em 1975 e transição política e económica em 1990/1991. O desemprego começou aparecer sob forma disfarçada de subemprego e generalizou-se o fluxo de deslocamentos que fez ainda mais crescer as enormes pressões que eram exercidas sobre a capacidade e resistência dos agregados familiares, especialmente nas cidades seguras e com relevo para a capital, onde a percentagem dos deslocados em relação aos residentes locais era maior e a economia era particularmente débil. E as famílias neste período, já viviam em condições de extrema pobreza.

Muitos destes deslocados, o que se verificou, quando chegassem a essas cidades tidas como seguras (com principal pendor para Luanda), eram absorvidos por parentes, membros das suas famílias alargadas já instalados nas áreas urbanas, o que agravava ainda mais as situações dessas famílias hospedeiras, que muitas vezes, já viviam em condições de extrema pobreza e variais privações sociais.

            Dado às pressões relacionadas com as deslocações, a urbanização e a luta pela sobrevivência, as relações tradicionais de género no seio da família começaram a mostrar sinais de mudanças e deterioração. Já no que concerne a habitação, a problemática ainda persiste até a data presente, inadequadas, isto fruto, da dimensão fundamentalmente da pobreza e da superlotação populacional, tanto nas áreas urbanas como nas áreas rurais. Segundo o Inquérito sobre a Disposição e Capacidade no Pagamento dos Serviços Sociais Básicos (IDCP) de 1998, apenas ou era apenas 9% das casas em Luanda e 5% nas outras cidades do país eram ou são tradicionais, ou seja, casas com paredes de blocos de adobe e matérias de cobertura precárias.

Ora, 90% dos agregados familiares de Luanda e 75% dos outros agregados familiares urbanos vivem hoje em casas convencionais, ou melhor, casas com paredes construídas com materiais como cimento ou blocos e coberto com chapas de zinco ou materiais rígidos semelhantes e, nas áreas rurais, pouco era mais de metade 58% dos agregados familiares que têm casas de tipo semelhante e 42% vivem ainda em casas tradicionais. Porem, o desenvolvimento de enormes assentamentos humanos informais nas áreas periurbanos onde vivem agora a grande parte dos habitantes urbanos, deu origem a graves problemas. O planeamento nestas áreas tem sido mínimo ou inexistente, resultando num sobrepovoamento e numa falta quase total de serviços urbanos, tais como de abastecimento de água e sistema de saneamento básico.

            Durante as últimas duas décadas, estes assentamentos humanos espontâneos cresceram ainda mais como resultado da migração das áreas rurais e da falta de planificação e investimento em terrenos para habitação urbana de baixo custo. As casas têm sido construídas de forma anárquica, sem autorização por parte das agências e instituições responsáveis pelo planeamento físico da capital do país e, em zonas periurbanas, são muitas vezes desprovidas de serviços e nalguns casos, vão surgindo bairros em locais perigosos com grandes riscos de erosão e desabamento de terras. Além disso, no centro urbano (das cidades como por exemplo Huambo, Luanda, Benguela e Huíla), o stock habitacional degradou-se devido a falta de manutenção e cerca de 17 ou 18% dos agregados familiares em Luanda e outras zonas urbanas vivem nestas áreas, principalmente em prédios. E, quase todos estes edifícios foram construídos antes da independência, e a maioria delas deteriorou-se desde então, isto devido à falta de manutenção nos anos a seguir à sua nacionalização ou ao seu confisco. Embora muitos apartamentos e vivendas tenham sido privatizados a partir do início da década de 90, a maior parte dos prédios continuam ainda nas mãos do Estado, que continuam sem qualquer manutenção de rotina.  

 

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Politólogo & Jornalista