Luanda - A defesa dos 17 activistas angolanos condenados a 28 de março por rebelião e associação de malfeitores pretende processar o juiz Januário Domingos, do tribunal de Luanda, pela "negligência" na forma como conduziu o processo.

Fonte: Lusa

A posição foi transmitida hoje à Lusa pelo advogado de defesa David Mendes, após análise detalhada do acórdão do Tribunal Supremo sobre a providência de "habeas corpus' que permitiu a libertação dos activistas, a 29 de Junho, ao fim de três meses a cumprir pena por rebelião e associação de malfeitores.

 

"Vamos enveredar por um processo contra o juiz da 14.ª Secção [do Tribunal de Luanda, que julgou o caso], tendo em conta o acórdão do Tribunal Supremo, que reconhece que o juiz agiu contra as regras em matéria de "habeas corpus'. Eles estiveram presos durante três meses por negligência do juiz", disse o advogado.

 

"Vamos acionar os mecanismos legais para que o juiz seja processado e o Estado condenado", acrescentou o também dirigente da associação de defesa dos direitos humanos "Mãos Livres".

 

O Tribunal Supremo angolano critica duramente o juiz Januário Domingos, responsável pelo julgamento que condenou 17 ativistas angolanos até oito anos e meio de prisão, acusando-o de ter contribuído para os meses de prisão destes jovens.

 

A posição surge no acórdão sobre o "habeas corpus' apresentado pela defesa dos activistas a 01 de abril, pedindo a libertação, mas que só a 24 de Junho chegou ao Supremo para análise e que ordenou a soltura dos 17 jovens, que já estavam a cumprir pena desde o final de Março, apesar dos recursos interpostos pelos advogados.

 

Angola, como o próprio Supremo reconhece neste acórdão, a que a Lusa teve hoje acesso, não tem regulamentação própria para as providências de "habeas corpus'. Embora dirigidos ao presidente do Tribunal Supremo, os "habeas corpus' têm de dar entrada no tribunal de primeira instância e são depois enviadas para o tribunal competente.

 

Contudo, neste caso, e com os 17 ativistas já a cumprirem pena, o juiz da causa, Januário Domingos, conforme acusação dos advogados que a Lusa noticiou em junho, "reteve" a providência durante 20 dias, tendo enviado o expediente para o Tribunal Constitucional (que analisa um dos recursos da condenação) e não para o Supremo.

 

"Não se justifica tal conduta incauta do M.º juiz, porquanto em tempo oportuno o Tribunal Supremo baixou instrutivos orientadores para a tramitação das providências de "habeas corpus' (...) Por conseguinte, julgamos que o M.º juiz estava apetrechado com ferramentas suficientes para dar andamento célere ao expediente", lê-se no acórdão, que também colocou em liberdade os ativistas.

 

Acrescentam os juízes do Supremo que é necessária "uma veemente chamada de atenção ao M.º juiz da causa". Isto porque "de forma estouvada mandou juntar o expediente no processo principal, provocando uma demora de quase três meses para que a providência de "habeas corpus' desse entrada nesta suprema instância, onde só chegou no dia 24 de Junho de 2016, vinda do Tribunal Constitucional".

 

"Como se não bastasse, perante os clamores dos requerentes e da própria opinião pública, o M.º juiz não se dignou informar à câmara [criminal, do Supremo] o paradeiro do "habeas corpus', que só ele sabia tê-lo remetido ao Tribunal Constitucional", critica ainda o Supremo.

O tribunal vai ainda mais longe, ao solicitar uma investigação ao comportamento do juiz Januário Domingos: "Este facto deve ser comunicado imediatamente ao Conselho Superior da Magistratura Judicial, para que sejam desencadeados procedimentos em conformidade".