Luanda -  O Presidente da UNITA, Isaías Samakuva termina as jornadas de avaliação do estado partidário e denuncia actos de intolerância política e violações do ordenamento jurídico-administrativo pelas comissões de bairros. Falando para os dirigentes dos municipios das Ingombotas e Maculussu, Isaías Samakuva disse que o governo está a mentir as populações com a promessa...


Caros compatriotas,


Como já afirmamos diversas vezes, o nosso contacto com as estruturas de base do nosso partido visou avaliar o estado de execução das tarefas constantes das orientações que demos no princípio do ano corrente sobre a reestruturação do nosso aparelho partidário.

Cabe-nos, hoje, avaliar o trabalho que está sendo realizado nos Municípios do Rangel e das Ingombotas, encerrando assim a ronda que efectuamos aos municípios da Província de Luanda.

Esta ronda tem-se revelado importante, pois para além de nos permitir avaliar o grau do cumprimento das orientações atrás referidas, tem-nos facultado a oportunidade de medir o calor, a força, a vontade e, sobretudo a determinação dos membros do nosso partido em continuar a trabalhar no sentido de manter bem vivo o projecto de Muangai.

Também nos permitiu sentir de perto a ansiedade e as aspirações do nosso povo que, embalado por promessas eleitoralistas, começa a aperceber-se, face à realidade do dia – a –dia, que afinal tudo continua na mesma:

- a água que precisa para viver, continua e continuará a ser comprada das cisternas pertencentes aos mesmos senhores que deveriam facultar-lhes água canalizada;

-a energia, se a quiser ter, continuará a vir dos “fofandós” comprados nas lojas cujos proprietários, em muitos casos, são os mesmos senhores que deveriam facultar-lhes a energia pública;

-a saúde continua a ser negócio dos mesmos senhores que deveriam velar pela rede de hospitais públicos;

-as escolas e as universidades continuam escassas para permitir o negócio de colégios e universidades privadas dos mesmos senhores que deveriam lhes facultar educação em escolas públicas;

Como disse, com esta sessão, estamos a encerrar a ronda que efectuamos aos municípios de Luanda. Ocorre-me lembrar-vos que para além das tarefas puramente partidárias, a vossa missão é defender os direitos dos cidadãos, fiscalizando a acção dos governantes e contribuir, de forma republicana, com sugestões para a solução dos problemas que afectam os cidadãos.

Durante estas jornadas, escutamos muitos relatos sobre actos de intolerância política e estamos preocupados pela dimensão que estão a tomar estes actos que ainda se verificam mesmo aqui na capital, onde dirigentes máximos do nosso País pregam a tolerância e o respeito pela diversidade. Enquanto cidadãos deste País, é nosso dever combater e denunciar todos os actos que atentam contra os nossos direitos de cidadania consagrados na Constituição.

Apesar desta política de exclusão praticada pelos detentores do poder político, não aceitemos ser mantidos à margem da sociedade de que somos parte integrante. A nossa missão é lutar para a conquista do espaço que nos pertence na sociedade e no País que são nossos.

As Comissões de Bairro e as arbitrariedades dos seus chefes são uma matéria que deve merecer a nossa atenção e a nossa denúncia. Elas são resquícios de uma forma bolchevista de organização comunitária. Que saibamos, não constam do ordenamento jurídico administrativo do nosso País. As comissões de bairro são, pois, reminiscências das brigadas populares de vigilância no sistema do Poder Popular.

As condições em que a maioria do nosso Povo vive aqui na capital e no País no seu todo, são ainda muito precárias. Nesta nossa ronda, pudemos verificar a degradação dos bairros que a propaganda do Poder diz estarem a melhorar. Verificamos como os problemas de acesso aos locais de residência pioram quando a chuva cai. O abastecimento de água continua a ser um problema sério e não há sinais da sua solução. A habitação que é também um direito constitucionalmente consagrado é, para a maioria dos angolanos, ainda uma miragem.

O senhor Presidente da República havia prometido aliviar este problema, mandando construir 1.000.000 de casas nos 4 anos da legislatura actual. Quando foi anunciada a realização da Conferência Nacional de Habitação, abriram-se novos horizontes e os corações de muitos necessitados encheram-se de esperança da materialização deste promessa. Porém, apesar do muito que se disse e dos rasgados elogios que foram pronunciados a favor do senhor Presidente da República e dos organizadores desta conferência, fiquei sem saber se devia felicitar o Governo por ter finalmente acordado do sono profundo em que se encontrava em relação à esta questão da habitação, ou se devia me reter no significado real das palavras que constituíram o cerne de algumas declarações feitas na altura. De facto, vejamos com atenção o seguinte:

1º - A promessa do senhor Presidente da República foi entendida que o Estado faria em 4 anos 1.000.000 de casas. Porém, agora, o senhor Engenheiro Carlos Santos, do Ministério do Urbanismo e Habitação, portanto, da instituição executora, veio a público para dizer que destas 1.000.000 de casas, apenas 115.000 estão a cargo do sector público, ficando as restantes a cargo do sector privado (120.000), das cooperativas (80.000), e dos auto-construtores (685.000). Significa que, afinal, só 11.5% destas 1.000.000 de casas serão da responsabilidade do Estado.

2º -Afinal os membros do Governo e o senhor Presidente da República sabiam que o nosso povo vive em condições miseráveis de habitação mas, ao invés de facilitar a vida aos que através dos seus próprios esforços procuravam melhorar as suas condições, o Governo foi complicando cada vez mais o sistema;

Afinal, os membros do Governo e o senhor Presidente da República sabiam que as localidades, a nível provincial ou nacional, precisam de planos directores para um melhor ordenamento das zonas urbanas e peri-urbanas, mas até aqui, nada foi feito nesse sentido! As cidades cresceram e cresceram de forma desordenada.

Afinal, o Governo sabe que os preços de materiais de construção são elevados mas mesmo assim não deixou, por exemplo, de monopolizar o cimento, encarecendo-o ainda mais, quando se sabe que a liberalização da sua importação permitiria adquirí-lo a preços mais baixos não longe do nosso país!

Afinal, os membros do Governo e o senhor Presidente da República sabiam, que existe especulação na venda e trespasse de terrenos e nada haviam feito para impedir esta situação ao longo destes anos todos!

Afinal, o Governo e o senhor Presidente da República têm consciência desta situação toda e deixaram-na andar ao longo de anos para só agora acordar para as terríveis consequências que a ausência de uma política de habitação, antecedida por adequado ordenamento do território podia acarretar!

Afinal, sabiam. E se sabiam, porque só agora descobriram a pólvora? Será porque terão prevalecido antes interesses económicos de grupos bem instalados? Pergunto-me. Ou porque antes prevaleceram conveniências e cálculos políticos e eleitoralistas?

Bom, de qualquer forma, mais vale tarde do que nunca. De resto, salve-nos Deus, Nosso Senhor e oxalá que, pelo menos desta vez, não fiquemos apenas nos discursos e nas promessas.


Isaías Samakuva
Presidente da UNITA
Ingombotas, Luanda, 16/04/09

Fonte: Unita