Lisboa - ”A vitória é certa", repete-se no congresso do MPLA. Mas que "vitória" é que é "certa"? Era do "marxismo-leninismo", depois foi da "acumulação do capital", agora é do "mercado", o que é que é "certo"? O slogan está cansado e Hélder do Amaral, do CDS, declara deliciado ao "Jornal de Angola": "Eu digo que Angola faz bem ao preferir coxear no caminho certo do que correr em caminhos errados".

Fonte: Expresso

Coxear no caminho certo, portanto. Com uma economia totalmente dependente do petróleo e uma sociedade baseada na distribuição clientelar desta renda, Angola foi atropelada pelo colapso do preço - e já se percebeu que a ameaça está para ficar, com enormes perdas orçamentais. Já não há dinheiro. As consequências são devastadoras, porque os recursos de um Estado pobre para os pobres são comprimidos e a riqueza de um Estado rico para os ricos escasseia. A incerteza tornou-se na única certeza.


A burguesia angolana, formada pela elite militar e política que ganhou a guerra civil e tutelada por José Eduardo dos Santos ao longo dos seus já 37 anos de madato, distribuindo prebendas e garantindo pessoalmente aos seus generais e empresários o acesso à fortuna, acumula mais consumo de luxo do que capital, compra mais casas no Estoril e diamantes na Avenida da Liberdade do que máquinas agrícolas e pouco cuida da produção. Espera o investimento estrangeiro e a comissão que lhe corresponde, enquanto o palácio prefere reter matreiramente os dividendos porque precisa de divisas para distribuir entre a corte. Com o que sobra compra empresas que gerem outras rendas. Vivendo de mão estendida para o Presidente, os dirigentes do regime seguem o chefe, que lhes declara agora, com bonomia, que "vamos passar a governar com o cidadão", como titula o jornal oficial. Mas o cidadão perde-se no caos das ruas, desespera nos mercados, teme os hospitais, sabe que a escola ignora os seus filhos, tem medo da polícia e de quem o vai assaltar a seguir.


O processo.farsa contra Luaty Beirão e os seus camaradas demonstrou aos jovens que ler um livro pode ser crime, mas o imbróglio jurídico obrigou o Presidente a recuar. Ninguém sabe o que virá a seguir. Para o povo, a incerteza é a sua vida. Siga o espectáculo, portanto, No congresso são dados mais alguns passos para a sucessão dinástica e aplaudem-se com carinho os representantes dos partidos portugueses que vão dar testemunho de como a antiga metrópole, arrependida de algumas liberdades que a imprensa se permite ou a justiça se atreve, espera e desespera por mais um contrato, uma palavrinha, um aceno.


A peregrinação dos candidatos a empregos generosos cruza-se com os políticos que querem remediar os agravos que o palácio possa ter sentido ou pressentido - convidando portanto o regime angolano a tratar Portugal com uma prosápia que se transforma em reverência quando se trata de qualquer outro Estado poderoso. Todos os favores se cobram e alguns até se pagam, essa é a lei da política angolana. Covém que saibam que, no dia em que as contas das arcas angolanas começarem a ser descortinadas, muitas orelhas arderão em Lisboa. A incerteza angolana é um castelo de cartas.