Luanda - O obscurantismo é o estado de quem vive na escuridão, na ignorância, no atraso e no subdesenvolvimento. Ou seja, na gíria, diz-se: tapar a vista de alguém de modo a enganá-lo. Na sociologia, o obscurantismo é uma doutrina dos que se opõem ao desenvolvimento da instrução e do progresso, pelo facto de os considerarem perigosos para a estabilidade social.

Fonte: Club-k.net

Logo, a política, na sua caracterização social, é a habilidade para lidar com qualquer assunto de forma a se obter o que se deseja. A política, acima de tudo, é uma estratégia, uma táctica, astúcia, esperteza ou maquiavelismo. Qualquer uma dessas definições da política, pode encontrar seu enquadramento apropriado, dependendo das circunstâncias concretas ou do contexto específico, em abordagem.

 

Portanto, a política situa-se num campo bastante vasto e altamente complexo, que requer uma visão ampla e muito tacto; muita prudência e coragem; muita flexibilidade e firmeza; e sobretudo, a percepção intelectual dos fenómenos sociais e a providência de acautelar situações difíceis e complexas. Pois, o mundo é evolutivo e o ser humano é dinâmico, que se adapta facilmente à realidade concreta e específica. Criando um ambiente propício de fazer as coisas transformarem-se. Buscar mudanças constantes que, de certa forma, são provocadas por factores internos e exteriores.

 

A metafisica, que é a teoria do absoluto, leva-nos a acreditar na eternidade das situações, da permanência do status quo presente e do obscurantismo sociocultural. Porém, os anais da História da Humanidade, revelam que, o ser humano partiu do estado primitivo, como outras criaturas, para atingir os níveis mais avançados da época contemporânea. Tendo passado por várias etapas, enfrentando grandes desafios, por várias vias – tanto pacíficas, quanto violentas. Neste respeito, o estratega militar e pensador estratégico, General da Prússia, Carl von Clauswitz, afirmava, nesses termos:


“ A guerra não é meramente um acto político, mas sim, um instrumento real da política, a continuação das relações politica, a realização do mesmo por outros meios.” Noutras palavras, as guerras sempre acontecem se os interesses sociais, económicos, culturais, políticos (em termos da cidadania) e territoriais estiverem em causa. Logo que os factores que estiveram na origem da guerra forem dissipados e acautelados, a guerra deixa de existir. Mas, a inexistência da guerra, e o surgimento da paz, não são definitivos se não acautelar e cuidar-se seriamente dos factores que causaram a guerra. É por isso que, a História da Humanidade tem sido caracterizada por períodos da paz e períodos de guerra, sucessivamente. Esta é uma análise científica que nos ajuda a perceber bem a dinâmica da paz e dos conflitos, e buscar as formas e as fórmulas de salvaguardar a paz. A paz social deve ser construída todos os dias, na consciência das pessoas e na realização das suas vidas e das suas aspirações profundas. Com efeito, a paz não é um elemento abstracto; mas sim, uma realidade material, social, económica, moral, espiritual e politica.

 

É por isso que, a demagogia e o populismo são elementos bastantes nocivos para a construção da paz duradoira, que todos almejamos, que de facto, pendure no tempo infinito. O ser humano é racional, sabe distinguir o bem e o mal. Nesta lógica, ele é essencialmente social, tem anseios, motivações, aspirações e desideratos reais e concretos. O bem-estar e a vontade de se realizar na vida, são desideratos primários da Humanidade, independentemente da sua condição social, racial, étnica, cultural ou geográfica. Pois, «viver bem», «estar bem» e «pensar livremente», são factores-básicos para a realização do Homem.

 

Portanto, a liberdade não é um elemento subjectivo, como algumas pessoas acreditam. Se as faculdades humanas, as capacidades intelectuais e técnico-profissionais dos cidadãos forem condicionadas, para que eles não possam desenvolve-las livremente, de modo a capacitá-los para atingirem o bem-estar social, não pode dizer que, esteja diante a liberdade, a cidadania e a igualdade de oportunidades. Senão vejamos! Na sociedade angolana tudo é feito diante o cartão-de-membro do partido no poder, MPLA. Se um sujeito não tiver o cartão-de-membro do MPLA, por mais qualificado que seja, por mais apto que seja, e por mais talentoso que seja, não pode ocupar o seu lugar bem merecido na sociedade. Fica logo bloqueado, aliciado, perseguido e pressionado pelo sistema. Existe médicos, de renome, alguns foram Ministros de Saúde, no GURN; porém, hoje não têm lugares nos hospitais e nas clinicas públicas e privadas, somente por não ser militantes do MPLA. Muitos desses médicos andam ai sem emprego fixo, dando aulas nas universidades privadas de algumas Igrejas, sob condições restritivas, impostas pelo partido no poder. Enquanto, o Governo vai buscar médicos e técnicos estrangeiros, com salários astronómicos. Em função disso, em todas instituições públicas e privadas, os lugares de chefia e bem remunerados são reservados exclusivamente aos expatriados, ou aos militantes privilegiados do MPLA. Esta condição abrange igualmente o mercado informal, em que os vendedores das Praças e nas ruas (tais como zungueiras, quitandeiras, vendedores ambulantes, roboteiros, lavadores de carros, engraxadores de sapatos, estivadores, quinguilas, trabalhadores de limpeza, taxistas etc.) requer possuírem um Cartão-de-membro do partido MPLA para que tenha o direito de exercer sua actividade. Sem o Cartão-de- membro, perde sua Bancada na Praça, fica blocado ou bloqueada para vender, de modo a ganhar o pão, sustentar a família e pagar as propinas dos filhos. Mergulhando-se, assim, na desgraça, no atraso, na dependência e no obscurantismo. Assim, interroga-se, onde estará o patriotismo, que tanto rogamos e propalamos? Neste contexto, será que alguém pode-me convencer de que, isso seja a liberdade ou a cidadania? Onde estará o subjectivismo da liberdade ou da cidadania? Estarão esses cidadãos, nessas condições de exclusão social e politica, a usufruírem os seus direitos fundamentais, consagrados teoricamente na Constituição do Estado Angolano? Nessas circunstâncias, qual é a diferença entre esta condição de segregação sociopolítica e o colonialismo português? Ora! Este é o carácter real da nossa independência nacional.

 

Quanto ao Maquiavelismo, inerente da política, é uma doutrina, de carácter fascista, segundo a qual ao Príncipe ou ao Estado é lícito recorrer a todos os meios para atingir os seus fins. Desde que os fins sejam realizáveis, o maquiavelismo não olha para os meios de alcança-los. Só assim que pode perceber bem os actos bárbaros dos regimes autoritários e tirânicos. Mergulham as sociedades em situações caóticas, sabendo bem que, são capazes de criarem instabilidades sociais na sociedade, com consequências desastrosas. A paz e a guerra são círculos viciosos que servem de instrumentos poderosos da autocracia, da ditadura e da tirania, a fim de consolidar e fortificar o poder político, ou de conduzir-se a uma derrocada. Por isso, quando se pratica, em grande escala, a injustiça social, visa essencialmente criar um ambiente turbulento de instabilidade social, que permita criar condições de repressão e de matanças dentro de uma sociedade. Os exemplos mais concretos e mais recentes, desta doutrina, foram os acontecimentos dramáticos no Burundi e na República Democrática do Congo. Ao impôr a alteração da Constituição, sabia-se bem que iria provocar um movimento de contestação cívica e política. O que conduzira aos massacres verificados nos dois países. Que vinha culminar na consolidação dos poderes políticos do Presidente Pierre Nkuruziza e do Presidente Joseph Kabila, respectivamente.

 

Constata-se que, o Governo Angolano, nestes dois casos, foi instigador e mestre na preparação dessas situações conturbadas, acima referidas, para depois aparecer com um rosto bonito de «Mediador da Paz dos Grandes Lagos». Enquanto, na verdade, as tropas angolanas estiveram presentes no Burundi e na RDC, ter participado nas repressões, nas perseguições e nos massacres dos manifestantes e das populações indefesas. Enfim, este comportamento espelha o carácter real do maquiavelismo, que era característico do Império Romano, da Idade Média.

 

Nas minhas andanças, ainda este ano, em conversa com um Diplomata importante do Sudão do Sul, dizia-me o seguinte: Ele tivera sido aconselhado por um dirigente destacado do MPLA, para não optar-se por uma reconciliação nacional equilibrada, que passasse pela negociação efectiva, que resultasse na formação do governo, em paridade entre as partes. Pois, segundo o dirigente do MPLA, era fundamental que criasse um cenário que prolongasse a Guerra Civil no Sudão do Sul até comprometer outra parte, do grupo étnico Nuer, do Vice-Presidente Riek Machar, ao ponto de isolá-lo da comunidade internacional, conforme tivera acontecido em Angola, com a UNITA, do Dr. Jonas Malheiro Savimbi.

 


Pois, afirmava o dirigente do MPLA, isso vai «criar uma supremacia do vosso grupo étnico Dinka», do Presidente Salva Kiir, de modo a exercer a autoridade absoluta, forçando outras tribos submeter-se à vossa hegemonia política e étnico-cultural. Este modelo de governação, dizia o dirigente do MPLA, é mais eficaz e realista para os Países Africanos. Fim de citação. De qualquer modo, esta «doutrina maquiavélica», em referência, explica tão bem os massacres perpetrados no Monte Sumi, na periferia da Cidade do Huambo, no Planalto Central, contra a Igreja do Sétimo Dia – Luz do Mundo, do Pastor Julino Kalupeteka.

 

Em síntese, esta reflexão, feita no dia da independência nominal de Angola, visa realçar dois aspectos fundamentais, que inibe a qualidade da nossa independência: a) O carácter obscurantista da governação actual do país, que ultrapassa os níveis do sistema colonial português, assente na alienação cultural, na política de assimilação e na exclusão dos povos indígenas de Angola. b) O carácter maquiavelista do sistema político vigente, que se apoia na violência gratuita e na repressão sistemática do povo, como instrumento da sustentação da hegemonia política e do monopólio económico. Nesta senda, a corrupção representa o «factor-determinante» da manutenção do Partido-Estado – sem equilíbrio político; sem a separação efectiva dos poderes executivo, legislativo e judicial; e sem o exercício real da democracia, que tivesse a capacidade de alternância do poder público. Este é o tipo da independência que temos, que tanto almejávamos, pela qual derramou-se o sangue dos melhores filhos e filhas desta Pátria Mãe. Num País em que, os que eram libertadores nacionalistas, hoje tornaram-se opressores do seu próprio povo, roubando a riqueza do país e enriquecendo-se a si próprios. Mantendo o povo na opressão, na pobreza, na penúria e na desgraça.

 

Esquecendo-se, deste modo, das causas que estiveram na origem do surgimento do nacionalismo angolano e da luta contra a escravatura e a colonização portuguesa. Algures neste texto, lê-se o seguinte: “A inexistência da guerra, e o surgimento da paz, não são definitivos se não acautelar e cuidar-se seriamente dos factores que causaram a guerra.”


Luanda, 11 de Novembro de 2016