Luanda – A intervenção do candidato número 1 do MPLA às eleições de 2017 trouxe à tona alguns aspectos que, insistentemente, os cidadãos angolanos de uma maneira geral, mesmo os que não pertencem a nenhuma força política, pediam e aguardavam.

Fonte: NJ

Mais solto, igualmente mais à vontade, até porque uma maior facilidade na utilização do verbo virá da continuidade da pré-campanha e da campanha, não foi aparentemente difícil para João Lourenço deixar uma postura que se entende sem dúvida discreta e pouco propensa à demagogia fácil e a populismos exacerbados ou corresponder a algumas das expectativas essenciais das populações.

A necessidade de um caminho sério e continuado na procura da auto-suficiência alimentar, cujos resultados podem aparecer a médio prazo, a noção exacta dos quadros angolanos existentes nos mais diferentes domínios - que têm capacidade real de inserção em áreas fulcrais da nossa economia e que estão muitos deles abandonados e quantas vezes são ostracizados -, a inevitável luta contra a corrupção, tudo isso conjugado, são três bandeiras que se virão a revelar fundamentais no combate político de João Lourenço.

Decerto que enfrentará muitos escolhos, dos quais vai ter de se libertar pelo meio, mesmo porque conhecemos demasiado bem a superstrutura do nosso país, ou seja, numa linguagem mais simples, "o que a casa gasta". E não será fácil enfrentar pressões, grupos de interesse e gente que, sem um pingo de patriotismo nem vergonha na cara, insiste em prolongar uma situação da qual tirou proveito para o acumular de fortunas incalculáveis, sem nunca ter produzido na vida nem nunca ter criado riqueza alguma, a não ser a que lhes coube do erário público.

O problema é que não pode, não deve nem é aceitável nenhuma duplicidade na forma de comunicar. Ou seja, o que o candidato João Lourenço diz e vai dizer, tem de ser acompanhado forçosamente por alguma coerência da parte de todos os candidatos, ainda que não na forma, pelo menos no conteúdo.

Chegados a um momento da nossa História recente, em que é cada vez mais evidente que, tarde ou cedo, todos teremos de prestar contas pelos nossos actos - e um dos primeiros "tribunais" é o eleitoral -, não é admissível qualquer desfasamento entre o discurso do candidato a Presidente da República e da longa fila de candidatos subsequentes, alguns dos quais estarão, já à partida, em desacordo com o que se antevê vierem a ser os assuntos centrais da campanha do actual Vice-Presidente do MPLA.

Não apenas por quererem manter um sem-fim de privilégios e prerrogativas, como por acreditarem, com algum grau de sinceridade (infelizmente para nós), que lhes assiste uma espécie de direito divino a eternizarem-se enquanto classe social, enquanto possíveis herdeiros de uma pseudo-aristocracia que nunca existiu, a não ser no seu pensamento surreal.

Ainda há uns meses, para que conste, ouvíamos da boca de um militante do MPLA - daqueles que durante décadas insultou e desprezou o partido e os seus militantes, fazendo até campanhas contra a República Popular e depois contra a República de Angola - esta pérola: "Os organismos da Segurança de Estado têm de começar a criar mecanismos para proteger a burguesia..."

É mais do que evidente que gente desta estirpe não pode continuar a aparecer como sendo militante, simpatizante, nem sequer apoiante pública do Movimento Popular de Libertação de Angola.

É bem verdade que dentro do partido que detém o poder há um sem-número de opiniões diversas, até divergentes, e isso é saudável, no quadro de uma discussão interna que tem forçosamente de resultar na vitória dos que defendem os princípios programáticos há longos anos enunciados e que não estão dispostos a abrir mão deles.

Porém, qualquer ambivalência, qualquer opinião descuidada ou até mesmo mal-intencionada estará a contribuir para a desvalorização das opiniões do candidato João Lourenço e para a incompreensão por parte de todos os eleitores, se o discurso e as práticas subsequentes não obedeceram à sua estratégia.