Luanda - O jornalista angolano Rafael Marques é acusado pelo Procurador-Geral da República de crime contra a segurança do Estado. Em entrevista à DW, Marques promete não baixar os braços.

Fonte: DW

O jornalista angolano Rafael Marques conta em entrevista à DW África que recebeu esta terça-feira (20.06) uma acusação formal de crime contra a segurança do Estado por alegadas injúrias ao Presidente da República e ao Procurador-Geral da República. Em causa está um artigo publicado no portal Maka Angola, em outubro, onde Marques denunciava negócios privados do Procurador João Maria de Sousa, em desrespeito da Constituição, com o consentimento do chefe de Estado, José Eduardo dos Santos.

Marques foi ouvido em dezembro a propósito deste caso no Serviço de Investigação Criminal, em Luanda. Mas, de lá para cá, a acusação terá mudado. A DW África tentou entrar em contacto com o Gabinete do Procurador João Maria de Sousa, sem sucesso.

 

DW África: Em que consta esta nova acusação?

Rafael Marques (RM): Ontem [20.06] recebi a acusação do Ministério Público segundo a qual cometi crime contra a segurança do Estado por supostas injúrias ao Presidente da República e ao Procurador-Geral da República. Isso tem a ver com um artigo publicado em novembro de 2016 que denunciava uma compra de terreno pelo Procurador, enquanto exercia essas funções, para a construção de um condomínio residencial, embora o tenha comprado como terreno rural e pago por um preço rural. Referi ainda que, ao longo das suas funções, o Procurador tem-se envolvido numa série de negócios, inclusive como sócio-gerente, mas nada acontece porque é apadrinhado pelo Presidente, que lhe ampara o jogo, pois é o Presidente quem o nomeia e demite, e o chefe de Estado sempre ignorou as falcatruas do Procurador-Geral da República.


DW África: Na altura em que publicou o artigo, obteve uma reação do Procurador?
RM: Enviei uma série de questões ao Procurador-Geral da República, tenho um documento assinado pela Procuradoria em como as recebeu, mas o Procurador nunca respondeu às perguntas que enviei.


DW África: Em que difere esta acusação que recebeu agora formalmente de uma outra feita em dezembro pelo Procurador, sobre este caso?
RM: Quando eu fui interrogado em dezembro, o que vi lá era uma queixa por difamação. Nessa altura, a alusão era de que o Procurador não tinha terreno. Agora, já teria terreno mas não pagou os emolumentos. Isto é uma pouca-vergonha. Isto, vindo de um Procurador… não tenho palavras para descrever o estado da Justiça.


DW África: Ou seja, a acusação mudou nestes meses?
RM: Sim. [Em dezembro] não respondi por acusação nenhuma de crimes contra a segurança do Estado. Agora, sou acusado disso por causa de um terreno. De facto, a criatividade destes indivíduos para a 'bandidagem' ultrapassa qualquer marca de bom senso.

 

DW África: Este caso vai agora para tribunal?
RM: Eu já fui notificado pelo tribunal, o que é também caricato. Quem me veio trazer a notificação foi o Tribunal Provincial de Luanda.


DW África: Já sabe quando será o julgamento ou quando será ouvido em tribunal?
RM: Estou à espera da marcação da data, e espero que o [Presidente] José Eduardo [dos Santos] também apareça lá para justificar como o injuriei – e eu digo que ele é o padrinho da corrupção em Angola. Estão aí tantas provas que apresentei à Procuradoria-Geral da República e o que é que o Procurador-Geral faz? Engaveta-as todas.


DW África: Acha que esta acusação poderá ter alguma coisa a ver com uma decisão deste mês da Justiça portuguesa, que deu "luz verde" para investigar o crime de branqueamento de capitais, a propósito do caso "Tchizé" dos Santos, e depois de uma denúncia sua?
RM: Obviamente, esses indivíduos sonham, todos os dias, com uma estratégia qualquer ou conspiram uma forma de me silenciar. E aproveitam qualquer oportunidade que tenham para o fazer, e estão no seu direito: São bandidos, têm mesmo de agir assim. Mas eu também, como cidadão que defende a integridade e honestidade neste país, também tenho o direito de, todos os dias, descobrir as falcatruas, os saques que cometem, e denunciá-los. Agora, venham com tribunais, com armas, com o que quiserem – de uma coisa podem ter a certeza: Tarde ou cedo, são eles que vão acabar na cadeia.