Luanda  - O Polvo é um animal muito hábil, capaz de lidar em ambiente hostil com as  suas presas de forma a sobreviver em situações bastante adversas. Possui vários tentáculos e nestes, um número elevado de ventosas que o ajudam na deslocação e na captura das presas sem que essas se consigam livrar por mais que tentem, acabando vítimas da voracidade do molusco.
 
Fonte: Club-k.net
 
É lugar comum dizer-se em Angola que o MPLA se tornou refém de JES[1], das suas desmedidas ambições de poder com contornos de megalomania e nepotismo. Não se pode negar o esforço visível de uns círculos do partido tentando evitar essa colagem mas, a bem da verdade, não têm tido o sucesso desejado, senão vejamos:
 
 
01. O episódio de 27 de Maio de 1977 não foi do agrado de muitos membros do partido, muitos se mantiveram calados levando o segredo para a cova, caso do falecido Lúcio Lara, Paulo Jorge e quiçá o próprio Agostinho Neto, a história o dirá. Outros se afastaram dedicando-se a escrita, aos negócios ou simplesmente à família, Pepetela, Lopo do Nascimento só para citar alguns;
 
 
02. Vários quadros do MPLA sentem que a Democracia é uma boa forma de governação e, em 1992 viam no equilíbrio entre a UNITA e o MPLA, uma forma de reduzir a hegemonia de JES, cada vez que se registasse uma vitória mesmo que temporária ou efémera da UNITA e de Jonas Savimbi no campo de batalha, eles aplaudiam baixinho, assim, João de Matos[2] depois da batalha da Nhareia em 1998 recua o seu posto comando avançado e aconselha o Berreau Politico do MPLA a negociar pois o processo apresentava um empate técnico em termos militares e em alguns casos, com vantagem a favor da UNITA;
 
 
03. Durante o curto equilíbrio politico e militar as hostes do Regime contiveram alguns instintos de delapidação do erário público. Com a morte de Jonas Savimbi, o MPLA ficou definitivamente refém de JES e sua família; iniciou-se um processo de enriquecimento ilícito e desmesurado da família e de alguns membros do círculo próximo do PR, deixando uma boa parte de descontentes mesmo dentro do aparelho.
 
 
04. Como senão bastasse, o processo de aprisionamento do Partido precisava de ser legalizado e foi feito em duas vertentes; a interna (por via do congresso autoritário de 2008 em que JES demitiu o burreau politico e conduziu os trabalhos do congresso pessoalmente), a externa ao partido, por via da Assembleia Nacional, em que JES fabrica e impõe a constituição atípica[3] em vigor neste momento no país. Nestes dois casos, procura e consegue humilhar duas personalidades; João Lourenço quando esse se prontifica para a sua sucessão, caindo numa verdadeira cilada. No segundo caso, o Dr Burnito de Sousa, então chefe da bancada parlamentar da MPLA forçado a aceitar a constituição sem estar prevista nas duas propostas consensuais produzidas após longos e aprofundados debates na comissão criada para o feito. A nova constituição dá a possibilidade a JES de se candidatar por via de uma lista e não a concorrer de forma isolada para presidente como regia a anterior lei magna. 
 
05. Hoje, o polvo faz valer os seus tentáculos, mesmo moribundo e com idade avançada, as ventosas conservam a sua força teleguiada, manifestada nas propostas que a bancada parlamentar do MPLA faz em fim de legislatura. O estatuto de presidente emérito é despropositado por quanto, o mesmo é habitualmente empregue no âmbito religioso e/ou académico cujas acções e objectivos se revestem de nobreza, servidão, humildade, sabedoria e valores intangíveis; ora, o campo da politica  e sobretudo em África se tem revestido de acções ligadas a alguma promiscuidade, violência, e falta de seriedade. Seria a primeira vez que o termo EMÈRITO estaria ligado a tal adjectivação negativa - sabemos no entanto que Angola é fértil em atipicidades  mas, até esse ponto, não seria desejável. É normal que o MPLA queira proteger o seu Leão envelhecido numa selva plena de leões jovens dispostos à inevitável luta geracional mas como se vê, várias vozes de dentro como sempre houve, não estão dispostas a engolir esse sapo...
 
 
É o momento de todos tirarem uma lição desse episódio da história do país, não se deve fazer uma constituição à medida de uma pessoa como se de um fato se tratasse. O MPLA não se livrará tão cedo do polvo que ele próprio alimenta, ainda é o presidente do partido e, com o estatuto especial que se pretende, aprisionará também o país.
 
21 de Maio de 2017
Eduardo Daniel Ekundy
 
[1] José Eduardo do Santos
 
[2] CEMG das FAA durante o período de 1991 a 1999
 
[3] de relembrar que no quadro da normalização das instituições estava-se perante o facto inconclusivo da 2ª volta das eleições presidenciais de 1992.