Lisboa - O jurista e docente angolano Lazarino dos Márteres André Poulson quebrou o silêncio para manifestar a sua defesa a revisão constitucional em Angola, porque no seu entender está é um dos entraves da democracia desejada para o país. “O atipismo da nossa Constituição, é um dos entraves à elevação da democracia que queremos para Angola. Não ajuda, muito pelo contrario, é um empecilho que deveremos corrigir na primeira possibilidade”.

Fonte: Club-k.net

“O atipismo  é um dos entraves à elevação da democracia”

“O Presidente da República, deveria ser eleito directamente e não numa lista de deputados”, defendeu o jurista em entrevista exclusiva ao Club-K, que pode ser agora apreciada.


Club-k: Qual o modelo de estado e de governo que defende para Angola?

Lazarino Poulson: Defendo que Angola, pela sua dimensão, seja um estado unitário e descentralizado política e administrativamente. Quanto à forma de governo, estou convicto de que deveríamos regressar ao sistema de semi-presidencialismo com pendor presidencial.

Acha que o estado angolano deveria já implementar as autarquias locais e que o mesmo  poderia ser um estado unitário ou federado?
Sim. Não só as autarquias locais como também as regiões autónomas, que iriam imprimir uma nova dinâmica na administração do território e, consequentemente, permitiria uma melhor satisfação das necessidades das populações, com a aproximação dos serviços aos cidadãos. A administração pública seria mais eficiente e eficaz. Por outro lado, com a eleição dos orgãos autárquicos, haveria um maior controlo da gestão da coisa publica. As vantagens da descentralização administrativa seriam substanciais e visíveis.

 

Qual o modelo económico que defende para Angola? Acha que o estado deveria diminuir a sua influência na economia e na intervenção social?
Defendo um modelo neo-liberal, onde o estado diminuiria gradualmente o seu peso na economia, tranferindo para os privados e para as empresas, grande parte da actividade económica e social que ainda hoje esta confinada ao estado. O modelo de estado social excessivamente intervencionista, comumente denominado de “estado-providência”, faliu. O estado deu mostras de ser mau gestor e empresarial. O estado deveria canalizar os seus recursos públicos, nas suas funções tradicionais - defesa, segurança , educação, saúde e justiça. E, de forma comedida, a algumas obras públicas. Fugindo um pouco as teorias keysianas, o estado reforçaria e controlaria as actividades do sector privado através de regulação e de um forte aparato de fiscalização. O estado deveria deixar de ser a casa onde os filhos vão buscar vantagens ilícitas e injustificadas e sem responsabilização. No modelo neo-liberal, onde o sector privado em parceria com o estado, seria um dos pilares do desenvolvimento, através das PPPS, concessões a privados de determinadas actividades fundamentais da economia. No fundo, o estado deveria fomentar a criação de um empresariado forte que garantiria o desenvolvimento do pais.

 

As Parcerias Publico-privadas não surtiram o efeito desejado noutros países. Acha que seria diferente em Angola?
Fui eu quem elaborou a lei das Parcerias Público-Privadas, fiz pesquisas e publiquei um livro a respeito desta tematica e estou à vontade para afirmar que é um modelo que pode resultar no nosso país em alguns sectores, nomeadamente, na construção de obras publicas (construção de auto- estradas, barragens caminhos de ferro, aeroportos, portos e noutras grandes obras de engenharia) e no sector eléctrico. Outros sectores onde as PPPS também poderiam vingar, seria na indústria mineira transformadora pesada, bem como no sector da saúde, educação e até justiça .

Mas tudo dentro de um quadro legal das PPPS que já foi aprovado, mas que não tem sido implementado. Ou seja, muitas das Parcerias Público-Privadas em Angola funcionam fora do quadro legal.

 Na sua opinião a constituição da República se deveria manter ou defende uma revisão constitucional?
Não ha duvida que a CRP de 2010 deve ser alterada. Aliás, ja na sua discussão pública, opus-me publicamente a varias questões que não concordo. Desde logo, a forma de governo e modelo de eleição do Presidente da Republica e dos deputados da Assembleia Nacional, que deve ser alterado. O Presidente da República, deveria ser eleito directamente e não numa lista de deputados. O atipismo da nossa Constituição, é um dos entraves à elevação da democracia que queremos para Angola. Não ajuda, muito pelo contrario, é um empecilho que deveremos corrigir na primeira possibilidade. Existem outras questões na Constituição o que devem ser alteradas, mas que em sede própria poderemos abordar.

Sendo a corrupção um dos maiores males do nosso país, que medidas defenderia para combater este flagelo?
São várias as medidas que podemos elencar para combater a corrupção, nomeadamente: 1. diminuição da intervenção do estado na economia e no sector social (corrigir o gigantismo do estado), 2. desburocratizarão dos serviços administrativos do estado e da futura administração autárquica e autónoma. 3. criar incentivo aos funcionários e agentes administrativos quer a nível de remuneração, quer a nível de promoção das respectivas carreiras (dignificação do agente publico). 4. reforçar os mecanismos de controlo. 5. criar um sistema legislativo claro e sistemático de combate a corrupção. 6. punir severamente os infractores e moralizar a sociedade nas escolas e locais públicos. 7. promover a meritocracia na sociedade.

Sendo professor e investigador de direito, como vê o modelo de educação mais próprio para Angola?
Angola deveria adoptar um modelo que eu chamaria “progressista de duas válvulas “. Passo a explicar. Válvula interna, 1. investir significativamente na educação pública, quer a nível da qualidade dos professores, quer na modernização e criação de condições material e de instalações no ensino básico e ensinar os estudante a ter mérito. 2. no ensino superior, rever todo o currículo superior público e adaptá-lo à realidade angolana. No ensino superior ,privado, não permitir o funcionamento nem surgimento de universidades ou institutos superiores que ministrem cursos sem saídas profissionais ou cujos os cursos ja estejam suficientemente sobrecarregados de estudantes, nomeadamente de ciências sociais - direito, gestão. Não só fiscalizar a qualidade de ensino como também os cursos ministrados. 3. criação de centros de investigação cientifica em alguma áreas a serem eleitas, nomeadamente, na agricultura, novas tecnologias , sector mineiro, etc.

Valavula externa : promover um alargado programa de bolsas de estudos em vários ramos estratégicos para o desenvolvimento de angola. Aqui os melhores alunos seriam enviados para as melhores universidades do mundo, para depois poderem sustentar os centros de investigação cientifica avançados em Angola. Estes centros de investigação cientifica, seriam a placa giratória para o desenvolvimento de Angola. Num futuro próximo, Angola seria um país de referência em pesquisas e trabalhos científicos que estes centros produziriam.

Sendo um figura de inquestionável intervenção pública, tem alguma ambição política?

Ainda sou muito jovem, estou empenhado em prestar o meu saber nas áreas cientificas em Angola. No futuro poderia ponderar essa possibilidade.

 

Estando Angola num período de transição , qual a sua visão para Angola pós-eleicoes?

Na minha opinião será um país que marcará passos significativos rumo ao desenvolvimento. Acredito na capacidade dos angolanos para se reinventarem e procurarem soluções para os seus problemas.

 

Já alguma vez assumiu um cargo político? Se não , qual seria o cargo que acha que melhor poderia dar o seu contributo ?
Nunca assumi nenhum cargo politico ou público.

 

Qual é o político que mais admira ?

Mahatma Gandhi, por ser o único ser humano que não foi político de carreira, general de exercito, não assumiu nenhum cargo público, não foi monarca e liderou um povo, usando a luta não violenta.

 

Qual os seus hobbies favoritos ?

Leitura, filmes e automóveis desportivos.

 

Um desejo para Angola ?

Estabilidade para uma transição pacífica.

 

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