Luanda - Depois de todo o debate que surgiu e bem, em torno da proposta de lei das chefias militares e após ter dado uma opinião (Pelos frutos, pois, os conhecereis…), sem que tivesse acesso ao texto oficial do projecto, partilho a análise à versão oficial do texto do projecto (que circulou nas redes sociais e não sei se foi aprovada nestes termos) esta opinião é complemento do primeiro texto que partilhei:

Fonte: Facebook

…A VERDADE LIBERTA…

1. DO PRESSUPOSTO DA LEI (PREÂMBULO): ao depararmo-nos com o documento a primeira coisa que sobressai no preâmbulo é a necessidade de se “assegurar a estabilidade institucional dos órgãos de Defesa e Segurança” através da “adequação legal do instituto do mandato das chefias militares” entretanto o termo correcto seria a UNIFORMIZAÇÃO E/OU REGULARIZAÇÃO, pois que a única “novidade” introduzida (mandato de 4 anos prorrogáveis) já consta do artigo 33.º, da Lei n.º 2/93, de 26 de Março, Lei da Defesa Nacional e das Forças de Segurança que consagra: «O Chefe de Estado Maior das Forças Armadas e os Chefes de Estado-maior dos Ramos são nomeados por um período de 4 anos prorrogáveis pelo mesmo período, sem prejuízo da faculdade de exoneração por limite de idade, incapacidade física permanente ou comprovada violação das Leis e Regulamentos Militares».


2. DA NATUREZA ANÁLOGA DAS CHEFIAS: O referido Projecto de Lei, opinião minha, introduz confusão ao querer fazer equiparar os Directores Nacionais do SINSE, SIE e do SIM às Chefias militares, não obstante fazerem parte do Conselho de Segurança Nacional (artigo 25.º e 26.º do Decreto Legislativo Presidencial (DLP) n.º 5/12, de 15 de Outubro), penso que o faz erradamente, pois que uma estabilidade institucional seria aproximar os Directores Nacionais da Comunidade de Inteligência (artigo 10.º, da Lei n.º 12/02, de 16 de Agosto) aos Departamentos Ministeriais, já que são equiparados à Secretários de Estado e/ou Vice Ministros, i. e, equipará-los ao regime do acontece como Inspector Geral da Administração do Estado e não às Chefias militares como o Projecto de lei deixa implícito e, se necessário fosse, submetê-los a dupla dependência Presidente da República e Assembleia Nacional;


3. O traço distintivo que se tentou ocultar, como deixei expresso no meu primeiro artigo, é o de contrariamente às chefias militares e policiais, subordinadas ao Comandante em Chefe das Forças Armadas, os órgãos da Comunidade de Segurança (artigo 25.º e 26.º do DLP n.º 5/12, de 15 de Outubro) são órgãos Auxiliares Específicos do Presidente da República e têm a categoria de Secretário de Estado (SINSE e SIE) nos termos dos artigos 49.º e 50.º e de “Vice – Ministro” o do SIM, artigo 51.º todos do DLP n.º 5/12, logo em relação a estes seria razoável que o seu mandato fosse regulado nos precisos termos dos demais responsáveis pelos Departamentos Ministeriais, com limitações especificas quanto à Comunidade de Inteligência de não excederem 10 anos, de resto como sucede com cada titular do Poder Executivo. O que não percebo é por que razão os Membros da Comunidade não podem ter a categoria de Ministros, como acontece com os Chefes das Casas Civil e Militar do Presidente da República? E mais, como está o projecto desenhado, por si só introduzir confusão, numa quase tentativa de advertir que quem aí deve chegar (SINSE e SIM) tem de necessariamente ter sido Militar/Polícia, o que não corresponde à verdade.


4. DA ARQUITECTURA DOS MANDATOS: O artigo 1.º do Projecto de lei estabelece «um mandato de quatro anos, prorrogáveis por igual período», ora é uma redacção que traz mais instabilidade do que estabilidade, pois ao dizer “PRORROGAVEIS” e não introduzir “UMA ÚNICA VEZ” dá lugar a que se interprete no sentido da inexistência de limite à prorrogação ou seja, que podem ser prorrogáveis tantas vezes quantas achar conveniente, não pode ser este o sentido, antes, se deve entender que o plural “PRORROGÁVEIS” foi utilizado para tratar a totalidade dos mandatos das chefias objecto da lei e que individualmente considerado ela deve ocorrer uma única vez, melhor dito, a redacção deve ser entendida como PRORROGÁVEL UMA VEZ. Por que o limite de mandatos é pois consequência do princípio republicano e preside a todo o exercício de cargos políticos à excepção das funções vitalícias que têm como limite a idade.


5. O n.º 2, do respectivo projecto de lei, que peca pela “aborrecida” e excessiva repetição das entidades, pois bastaria utilizar a expressão “a nomeação para/dos cargos indicados no n.º 1…”, dizia o n.º 2, do artigo 1.º diz que para a sua nomeação “devem ser cumpridos todos requisitos e formalidades legais previstas” ora, uma lei que visa trazer estabilidade, não devia desde logo dizer que formalidades e requisitos legais se tratam? Pois que,


i. Nos termos da Lei n.º 2/93, de 26 de Maio, no seu artigo 9.º sob a epígrafe “PRESIDENTE DA REPÚBLICA”, pode ler-se na alínea b), do n.º 2: “nomear e exonerar o Chefe de Estado Maior General Das Forças Armadas e seus Adjuntos, quando existam, bem como os Chefes do Estado-maior dos Ramos”. Esta norma, em particular e a lei no geral, não estabelece nenhuma formalidade para o efeito. A única formalidade, se assim se pode denominar, vem expressa na alínea c), do n.º 2, do mesmo artigo “nomear e exonerar os Oficiais Generais das FAA, ouvido o Conselho de Defesa Nacional”.

ii. O Decreto n.º 20/93, de 11 de Junho, Estatuto Orgânico da Policia Nacional, no seu artigo 13.º, com a redacção introduzida pelo Decreto n.º 10/95, de 28 de Abril, estabelece: “O Comandante Geral é nomeado pelo Presidente da República, ouvido o Conselho de defesa” e “os Segundos Comandantes são nomeados, sob proposta do Comandante Geral (…) ”. Não há requisitos, nem formalidades outras, nem duração do mandato.


iii. O Decreto – Lei n.º 1/08, de 06 de Junho (segundo percebi sofreu derrogações e alterações no ano 2016, cuja versão e diário não localizei…), Estatuto Orgânico do SINSE, atribui apenas de forma implícita, o poder de nomeação ao “Chefe do Governo” sem indicar formalidade e requisitos.


iv. O Decreto – Lei n.º 13/02, de 06 de Dezembro, Estatuto Orgânico dos Serviços de Inteligência Externa – SIE, no artigo 16.º, sob epigrafe “DEPENDÊNCIA” consagra: “O serviço de Inteligência Externa está da dependência hierárquica e directa do Presidente da República, a quem compete…alínea f) A nomeação em comissão de serviço (…) os quadros superiores da hierarquia do Serviço de Inteligência Externa”. Não consagra nenhuma outra formalidade, nem requisitos.


6. Das disposições e dos diplomas analisados fica claro que a única formalidade que existe é de “ouvir o Conselho de Defesa” para a nomeação dos oficiais generais e - não inclui o Chefe de Estado-maior das FAA, seus adjuntos e os Chefes de Estado-maior dos Ramos – para o Comandante Geral da Policia e nada mais. Pergunto-me: um projecto de lei que se propõe dar estabilidade institucional não deveria indicar, desde logo as formalidades e requisitos legais para a nomeação? Ou a única preocupação foi de criar requisitos apertados para a cessação de mandatos (vide artigo 2.º do projecto)? E mais como foi possível que o legislador (formal e material) “desenhasse” leis sem limites de mandatos, sem formalidades de nomeação, sem causas objectivas e subjectivas de cessação de mandatos? Numa óbvia situação de instabilidade institucional (como bem reconhece o preâmbulo do Projecto)? Será que se esquecera o legislador de outrora (que é o mesmo de hoje) que o Estado era democrático e que estas instituições e os respectivos órgãos precisassem de certeza e segurança jurídicas quanto aos critérios, requisitos e formalidades? Ou foi uma técnica de os tornar “submissos” duvidando das suas competências e capacidades, uns, e outros a perpetuarem-se nos “postos” convencendo-se de que eram os únicos com habilidades extraordinárias ao ponto de se “eternizarem” nos “postos” enterrando o sonho de colegas que, numa normal concorrência e aspiração na carreira sonhavam chegar ao mais alto cargo na instituição? Sem comentários…os “acólitos da instabilidade”, num ápice, “transformaram-se em sacristãos” e guardiãs da estabilidade institucional…


7. O n.º 4, do artigo 1.º, do Projecto de Lei, representa o perigo fulcral que a primeira versão do diploma trazia e com a redacção que sobreviveu cheira a um “pacto omissão” de fintar a boa vontade das pessoas, entretanto também ela acrescenta pouco ou quase nada à pretensa estabilidade e configura um presente envenenado para o “próximo inquilino da Cidade Alta” pois que Diploma legal nenhum coloca nas mãos do seu executor a possibilidade a possibilidade de fixar o período em que o prazo começa a correr e mais este n.º 4, do artigo é por si só inconstitucional e, se por ventura passasse este crivo é ilegal e por fim é um atentado às características da norma jurídica que qualquer estudante do 1º ano de Faculdade de Direito, porque ela não é nem geral, nem abstracta foram feitas para os actuais Titulares destes postos e no limite era sempre isto que se queria proteger ou seja para assegurar que os ACTUAIS COMANDANTE GERAL DA POLICIA, O ACTUAL DIRECTOR DO SIE, DIRECTOR DO SIM E DIRECTO DO SINSE SE MANTENHAM, o que não faz sentido nenhum, pois pelo menos os três primeiros já la estão, se a memoria não se atraiçoa, a tempo igual ou superior a 8 anos, o que em tese e a luz deste projecto de lei das Chefias Militares não lá não podem ficar e, o “arquitecto” deste projecto de lei sabendo disto, fez uma fuga para frente e colocou nas mãos do futuro inquilino esta decisão, vai-se lá saber porque, mas não foi para facilitar a tarefa do vizinho do paço Episcopal de Luanda! Ao menos devia o “proponente” considera-la como uma disposição transitória…o que não se pode dizer, fazer ou permitir é considerar que quem exerce estas funções há mais de 4 ou 8 anos, merece uma “AMNISTIA PRAZAL” e comece do zero, pois GENTE COMPETENTE nas respectivas instituições é que não faltam…

 


8. O Artigo 2.º “CAUSA DE CESSAÇÃO DE MANDATO” apenas merece que lhe seja dito o seguinte: então o decurso do tempo não faz cessar mandato? Findo o primeiro mandato a entidade competente pode não renová-lo; A Constituição, a Lei de Defesa e das Forças Armadas conferem ao Comandante em Chefe a faculdade de exonerar e pode faze-lo quando entender que sim, obviamente, não sem fundamentar a decisão mas pode fazê-lo e ponto, logo é inconstitucional. Do mesmo modo, o Presidente da República ou o Titular do Poder executivo, nos termos da Constituição pode exonerar os Directores da Comunidade de Inteligência por razões estratégicas e/ou subjectivas e de cumprimento de metas.


A alínea d) seria uma excelente oportunidade para se CRIAR ESTABILIDADE e mais uma vez passou ao lado, trazendo confusão, pois que ao estabelecer o limite de idade como uma causa de cessação de mandato, a questão é: qual é o limite de idade para se cessar funções nas FAA? Na Policia nacional? No SIM? No SIE? No SINSE? Ora se usarmos a fórmula do regime geral da reforma: 60 anos ou 420 meses de de contribuição para segurança social (artigo 3.º, do Decreto n.º 40/08, de 02 de Julho) ou se fizermos recurso ao Decreto – Lei n.º 16/94, de 10 de Agosto, que regula o Sistema de Protecção Social das FAA, onde se pode ler no artigo 23.º: “transita para a situação de reforma o militar que: alínea a) atinja 55 anos de idade; alínea b) requeira (…) depois de completados 30 anos de serviço” e/ou o Decreto – Lei n.º 4/08, de 25 de Setembro, que regula o Sistema de Protecção Social do Ministério do Interior que estabelece no artigo 22.º “transita para a situação de reforma o pessoal que: alínea a) atinja 55 anos de idade; alínea b) requeira (…) depois de completados 30 anos de serviço”, então o tiro sai pela culatra, pois que, dos que estão em exercício de funções nestas entidades ninguém “sobrevive” ao projecto de lei. Coisa para dizer: o inquilino do “Palácio da Cidade Alta” terá aqui uma soberba oportunidade para pela via da alínea d), do n.º 1, do artigo 2.º de substituir todos ou quase todos e dos diplomas mencionados operar de facto alterações com base na lei que lhe parecia atar as mãos ou simplesmente requer a fiscalização da constitucionalidade da mesma.


Depois desta análise ao Projecto de Lei das Chefias militares, só lhe consigo reconhecer um mérito a de ter generalizado para todas estas entidades um mandato claro de quatro anos renovável por mais um, entretanto, fica claro também que este mérito traz em si um demérito que foi o de equiparar e submeter os Directores da Comunidade de Inteligência (SIE, SINSE e SIM) ao mesmo regime de mandatos e prazos que as FAA e PN, quando como Órgãos Específicos de Apoio ao Presidente da República (SIM, SIE) e ao Titular do Poder Executivo (SINSE) poderiam em boa verdade estar submetidos ao regime dos titulares dos Departamentos Ministeriais, entretanto à excepção do que fica dito, este projecto de lei contém normas inconstitucionais quer pelo texto, quer pela interpretação que se pretender dar e outras tantas que são de facto uma negação de noções básicas de Introdução ao Estudo de Direito no que as características da norma jurídica diz respeito, por isso, advirto-vos “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” (João 8, 32.).