Luanda - Quando José Eduardo dos Santos assumiu a Presidência de Angola, em setembro de 1979, poucos lhe auguraram 38 anos no poder, naquela que viria a tornar-se na segunda liderança mais duradoura de África, depois da Guiné Equatorial.

Fonte: Lusa

José Eduardo dos Santos nasceu a 28 de agosto de 1942 em Luanda. O seu pai, Eduardo Avelino dos Santos, era um pedreiro reformado e a sua mãe, Jacinta José Paulino, era doméstica.

Em inícios da década de 1950, o jovem José Eduardo frequentou o Liceu Nacional Salvador Correia, na capital da Angola colonial portuguesa.

Foi no Liceu Salvador Correia (assim batizado em honra ao militar português que reconquistou Angola aos holandeses em 1648) que José Eduardo dos Santos começou a envolver-se em atividades políticas.


Em 1956, a fusão de vários grupos dava origem ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), um dos exemplos do novo fôlego de movimentos independentistas que nasciam na maior colónia portuguesa de então. Nessa altura, José Eduardo dos Santos teve um papel ativo na organização de grupos clandestinos nos arredores de Luanda, algo que viria a intensificar-se a partir de 1961.

Em fevereiro e março de 1961 - com o ataque do MPLA a uma cadeia de Luanda e um ataque da UPA, União das Populações de Angola (antecessora da Frente Nacional de Libertação de Angola) contra populações brancas - a guerra em Angola tornou-se inevitável.

Então com 19 anos, José Eduardo dos Santos não vai logo combater os portugueses no mato. Em vez disso sai em segredo do país e segue com outros seis jovens angolanos para Leopoldville (atual Brazzaville), no Congo. Aos 20 acumulava as funções de vice-secretário da JMPLA (juventude do MPLA) e de representante do MPLA.

Um ano depois, no entanto, José Eduardo dos Santos juntou-se mesmo à guerrilha. Foi uma breve passagem, já que em 1963 recebeu uma bolsa de estudo para estudar no Instituto de Gás e Petróleo de Baku, na antiga União Soviética, onde se formou como engenheiro industrial (setor petrolífero) em junho de 1969.

Após terminar a tese, foi enviado para uma academia militar soviética para receber instrução como operador de comunicações militares. Este treino fê-lo subir na hierarquia militar do movimento, assumindo a chefia do centro de comunicações da Frente Norte, de 1970 a 1974 e, mais tarde, ocupando o cargo de chefe-adjunto do serviço de comunicações da segunda região político-militar do MPLA, Cabinda.

Membro da Comissão Provisória de Reorganização da Frente Norte e chefe dos serviços financeiros do segundo distrito político-militar, só em setembro de 1975 - e por indicação do Presidente Agostinho Neto - José Eduardo dos Santos foi escolhido para integrar o Comité Central do MPLA.

Com a independência da então República Popular de Angola, a 11 de novembro de 1975, José Eduardo dos Santos foi escolhido como ministro dos Negócios Estrangeiros.

Por essa altura, o MPLA vivia uma forte divisão interna: por um lado o líder e Presidente, Agostinho Neto, e por outro o ministro da Administração Interna e membro do Comité Central, Nito Alves, apoiado por José Van-Dúnem. O MPLA acusou-os de "fracionismo" ou "nitismo", encarregando José Eduardo dos Santos de liderar uma comissão de inquérito à conduta de ambos.

Nito Alves e Van-Dúnem acabariam por ser assassinados na sequência das manifestações de 27 de maio de 1977, quando milhares dos seus apoiantes foram detidos e/ou mortos pelas forças governamentais de então, apoiadas por militares cubanos.

No primeiro congresso do agora designado MPLA - Partido do Trabalho, em dezembro de 1977, José Eduardo dos Santos manteve-se como membro do Comité Central e do Comité Político. Em funções governamentais, José Eduardo dos Santos foi vice-primeiro-ministro (até dezembro de 1978) e ministro do Planeamento.

A 20 de setembro de 1979 morria o Presidente Agostinho Neto e, apesar de ser visto na altura como um tecnocrata com pouco brilho - a que se juntava uma expressão impassível e, por vezes, inescrutável - foi José Eduardo dos Santos a ser eleito secretário-geral do MPLA, assumindo, no dia seguinte, o cargo de Presidente de Angola e Comandante-Chefe das Forças Armadas Angolanas.

Ainda que poucos, naquela altura, pudessem augurar uma carreira de 38 anos no poder, a sua escolha em 1979 não foi grande surpresa em Angola: era conselheiro próximo de Agostinho Neto, era de Luanda e Kimbundu, a etnia que dominava o MPLA, tinha estudos superiores e uma grande experiência administrativa, especialmente quando comparado com muitos dos seus camaradas. Por outro lado, não estava demasiado perto de nenhuma das fações em disputa dentro do partido.

Aos 37 anos, José Eduardo dos Santos era um dos mais novos presidentes no continente africano e estava à frente de um país com uma área maior do que Portugal, Espanha e França juntos, rico em recursos minerais (petróleo, diamantes, ferro e cobre), mas em guerra com outro dos movimentos independentistas, a UNITA de Jonas Savimbi, e com a África do Sul do regime de segregação racial ou 'apartheid', na fronteira com a Namíbia.

Apoiada pela África do Sul e pelos Estados Unidos, a UNITA nunca tinha reconhecido o MPLA como um governo legítimo em Angola.

Só em 1984, Angola e a África do Sul acordaram um cessar-fogo num conflito que já durava há quase duas décadas na fronteira namibiana. José Eduardo dos Santos acertou pouco depois com o Presidente cubano, Fidel Castro, a retirada das tropas cubanas de Angola.

O acordo de Luanda com Pretória assentava precisamente na retirada dos cubanos, no reconhecimento por parte dos sul-africanos da independência da Namíbia e o fim do apoio à UNITA de Savimbi. As negociações para o cumprimento destas três condições duraram vários anos.

A guerra civil em Angola, que ganhou força na década de 1980, vitimou centenas de milhares de pessoas e dizimando a economia angolana. Foi nessa altura que a Angola e o MPLA começou a abandonar gradualmente a filosofia marxista, passando para uma economia de mercado livre e aderindo ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

O Presidente anunciou que Angola iria adotar um sistema multipartidário e que realizaria eleições no prazo de três anos após um acordo de paz.

Em janeiro de 1989 chegam a Angola os primeiros capacetes azuis da ONU, o primeiro contingente de cubanos abandona Angola e, em junho, a MPLA e a UNITA chegam a um acordo de cessar-fogo, interrompido e retomado várias vezes.

Dois anos depois, em 1991, José Eduardo dos Santos e Jonas Savimbi assinam o acordo de Bicesse, que prevê o cessar-fogo, a constituição de um único exército angolano e a realização de eleições gerais sob supervisão da ONU.

O MPLA acabaria por vencer, com maioria absoluta, as eleições gerais que se seguiram ao acordo, em setembro de 1992, e José Eduardo dos Santos foi o mais votado na primeira volta das presidenciais. Apesar de a ONU ter validado as eleições, Jonas Savimbi e a UNITA consideraram que o ato eleitoral foi uma fraude e, após novos confrontos, em outubro reacende-se em força a guerra civil.

O conflito acabaria por durar - com intermitências - até à morte de Jonas Savimbi, em 2002, durante combates com as forças governamentais no Moxico.

Em 2007 José Eduardo dos Santos anunciou a realização de eleições parlamentares em 2008 (que o MPLA viria a ganhar novamente) e presidenciais em 2009.

As presidenciais acabariam por ser adiadas, a tempo de ser aprovada uma alteração constitucional (em 2010) que eliminava a eleição presidencial e abria caminho à designação como presidente do líder do partido mais votado no círculo nacional nas eleições para o parlamento.

Nas novas eleições gerais de agosto de 2012, José Eduardo dos Santos garantiu mais cinco anos no poder, já que o MPLA ganhou novamente por maioria absoluta.

A organização não governamental (ONG) Transparency Internacional considera Angola como um dos países mais corruptos do Mundo (164.º lugar em 176 países), e são muitos os observadores internacionais e ONG que dizem que esta situação não pode ser dissociada do homem (e do partido) que liderou o país nos últimos 38 anos.

Entre outras críticas, acusam-no de ter usado o cargo para enriquecer pessoalmente e à sua família. O seu filho mais velho, José Filomeno dos Santos, dirige o Fundo Soberano Angolano, um instrumento financeiro de 5 mil milhões de dólares para canalizar as receitas do petróleo para projetos de investimento.

Já a filha Isabel dos Santos, uma das mulheres mais ricas de África e do mundo, assumiu em 2016 a presidência do conselho de administração da poderosa petrolífera estatal angolana, a Sonangol.

Quando, em 2016, José Eduardo dos Santos - atualmente um homem enfraquecido pela doença - anunciou que abandonaria a política angolana os nomes dos filhos e do vice-presidente, Manuel Vicente, chegaram a ser equacionados como possíveis sucessores na Presidência.

Mas em fevereiro último o MPLA acabaria por confirmar que o candidato às eleições presidenciais indiretas de 23 de agosto seria o ministro da Defesa e número "dois" do MPLA, João Lourenço.