Luanda - O Tribunal de Contas como órgão superior de fiscalização e controlo das despesas da gestão das finanças públicas pelos organismos do Estado, Institutos e Empresas Públicas, cujo principal traço característico do seu regime legal é a garantia da sua independência, autogoverno, mobilidade, neste actual contexto político e económico que o país vive, torna-se fundamental e pertinente a sua actuação na fiscalização e controlo das contas públicas. Este prisma deve constituir (ao meu ver) uma manifestação tácita da preocupação das entidades que detêm o poder político. O controlo e fiscalização das contas públicas, torna-se cada vez mais premente como revela à própria história económica de Angola e a actual geografia da sua conjuntura política e social. A fiscalização da legalidade da utilização dos dinheiros públicos, o Tribunal de Contas (TC) como instituição indispensável do regime político, democrático e de direito que, paulatinamente e de forma gradativa se vêm implantando em Angola, tem de mostrar ou mostrar-se cada dia que passa a sua razão de ser. E, actividade de controlo financeiro externo a luz das reformas das instituições e a incrementação dos princípios da «good governance» e gestão pública deve servir de bússola para se definir e assegurar a coordenação e acompanhamento das linhas da governação, tendo em vista a promoção do desenvolvimento e progresso sustentável nas diversas dimensões da governação.

Fonte: Club-k.net

O Tribunal de Contas deve desempenhar um papel de relevo na mais variadas áreas de actuação do Estado angolano, não se limitando apenas á considerações de aspectos de ordem estritamente financeira, mas com uma certa abrangência em dimensão económico-financeira e social. Daqui resulta também, o seu papel relevante, que se coloca verdadeiramente ao serviço dos cidadãos, isto mediante uma compreensão humanista das finanças públicas. Mas deve ser reforçado o seu poder de actuação e independência. O Juiz Presidente do Tribunal de Contas, os seus conselheiros e coadjutores (técnicos), como também a Instituição em si, deve ser despartidarizados (os seus juízes devem obedecer apenas a sua consciência e a lei). Como também devem ser conscientizados regularmente da sua nobre missão. Porque, eles actuando com rigor, responsabilidade, ética e patriotismo, estarão a prestar um bom serviço, não só ao Executivo/Governo para que este consiga cumprir com o seu programa de governação, como também, estarão a prestar directa ou indirectamente um excelente serviço aos angolanos.

 

É mister assumir/assumirmos que, no âmbito da acção de fiscalização da legalidade das finanças públicas e de julgamento das contas que a lei «afunila» na sua jurisdição, continua até a data presente a demonstrar a existência de várias irregularidades de gestão do património do Estado, evidenciando a falta de registos, má conservação dos meios, não actualização dos inventários, insuficiências de dados sobre o estado dos bens e as suas alocações, entre outros aspectos. A luz do seu exercício, a acção de constatação de auditorias, a perspectiva do Tribunal de Contas em si, deve ser reforçada com a emissão do/s parecer sobre a Contas Gerais do Estado (CGE) regularmente, e torna-la pública para que os angolanos (cidadãos comuns) possam perceber e ter informações suficiente para poderem contribuir. E, é nesta perspectiva, que acredito que deve assentar à acção multidisciplinar da fiscalização do património do Estado, de modo particular os aspectos atinentes ao seu uso e afectação.

Analisando o Tribunal de Contas e a sua Coexistência com outros Organismos de Controlo do Estado

O Tribunal de Contas (TC), nesta missão deve coexistir com outros organismos de controlo do Estado como: a Assembleia Nacional (AN), a Inspecção Geral da Administração do Estado (IGAE), a Inspecção Geral de Finanças (IGF) e os Conselhos Fiscais (CF) que exercem o controlo financeiro público em Angola. Porque, materialmente, tais organismos actuam quase sobre o mesmo objecto, variando apenas, nos níveis de intervenção que lhes é conferida pela maior ou menor independência orgânica de que gozam em relação à entidade fiscalizada e pela natureza jurisdicional que enforma o estatuto do Tribunal de Contas que lhe distingue dos demais órgãos. Porque no âmbito da independência orgânica, têm-se distinguido os organismos de controlo em interno e externo. Portanto, a distinção entre o controlo interno e o controlo externo, como o faz a doutrina de Finanças Públicas e Direito Financeiro (FPDF), como também a Declaração de Lima sobre as linhas mestras de controlo das finanças públicas (n.o 2 e 3 da Secção 3), que «Cada organismo ou Instituição Pública possui o seu

serviço de controlo interno, enquanto os serviços de controlo externo não fazem parte da estrutura orgânica das instituições fiscalizadas. As Instituições supremas de controlo das finanças públicas são, pois, serviços de controlo externo». Distinto do controlo externo é o controlo interno que se baseia no princípio da autotutela dos órgãos executivos – é o controlo exercido pelos órgãos fiscalizados pelo Tribunal, integrando normalmente o poder hierárquico de controlo e supervisão e a superintendência dentro dos mesmos organismos.

O Que no Fundo Dita Ordenamento Jurídico Angolano?

A luz do ordenamento jurídico angolano, os órgãos do controlo interno, ou seja, os órgãos que possui a incumbência do controlo interno são, a IGAE, a IGF, CF, e todos os órgãos do controlo externo, tais como a Assembleia Nacional e o Tribunal de Contas. A lei define, sobre as suas relações institucionais, que os mecanismos de cooperação entre o Tribunal e os organismos de controlo. Sobre esta matéria a Carta Magna consagra ou estabelece no âmbito da função jurisdicionais no n.o 3 do artigo 174.o que «Todas as entidades públicas e privadas têm o dever de cooperar com os tribunais na execução das suas funções, devendo praticar, nos limites da sua competência, os actos que lhes forem solicitados pelos tribunais». Em forma de consagração de um matrimónio sem direito á divórcio com a Carta Magna, a Lei Orgânica e do Processo do Tribunal de Contas (n.o 1 e 2 do art. 18.o/LOPTC) no âmbito do dever de cooperação que «No exercício das suas funções, o Tribunal de Contas tem o direito à cooperação de todas as entidades públicas e privadas. As entidades públicas devem, obrigatoriamente e sempre que solicitadas, prestar informação transparência sobre as irregularidades que o Tribunal de Contas deve apreciar e de que tomem conhecimento no exercício das suas funções».

É deste modo que a lei ou este diploma legal (n.o 3 do art. 18.o/LOPTC) estabelece a obrigatoriedade de «Os relatórios dos diversos serviços de inspecção, devem ser sempre remetidos ao Tribunal, quando contenham matéria de interesse para sua acção». O Tribunal de Contas no âmbito da sua relação com outros organismos de controlo, ainda podemos estabelecer, como consagra o n.o 1 do artigo 63.o da Lei n.o 15/10, de 15 de 14 de Julho (Lei o Orçamento Geral do Estado), que a «A fiscalização orçamental, financeira, patrimonial e operacional da Administração do Estado e dos órgãos que dele dependem, é exercida pela Assembleia Nacional e pelo Tribunal de Contas, ao nível do controlo externo, e pelo Presidente da República, através dos seus órgãos especializados, ao nível do controlo interno». E no n.o 2 do mesmo dispositivo legal, podemos encontrar estabelecido que «O controlo externo é exercido pela Assembleia Nacional, a quem compete aprovar a Conta Geral do Estado, podendo a mesma ser acompanhada do Relatório parecer do Tribunal de Contas e todos os elementos necessários à sua analise, nos termos da lei».

Assembleia Nacional e Tribunal de Contas: Casamento Perfeito no Interesse de Fiscalização

A Assembleia Nacional e o Tribunal de Contas, ambos no fundo exercem controlo externo, a sua actividade é assaz e concomitantemente diferente. Assembleia Nacional, exerce o controlo político e o Tribunal de Contas o controlo técnico- jurisdicionais. De forma geral, as competências de controlo e fiscalização financeira, patrimonial e operacional da Assembleia Nacional constam do artigo 162.o/CRA. Entre as várias matérias ali previstas consta na alínea b) a de «receber e analisar a Conta Geral do Estado e de outras instituições públicas que a lei obrigar, podendo as mesmas ser acompanhadas do relatório e parecer do Tribunal de Contas, assim como de todos os elementos que se reputem necessários à sua análise, nos termos da lei». No exercício das suas competências de controlo financeiro, a Assembleia Nacional dispõe do auxílio técnico do Tribunal de Contas. Está acção não representa uma acção limitativa. Porque até, no quadro legal estão previstas duas situações em que a Assembleia Nacional pode socorrer-se da actividade do Tribunal de Contas (TC), que são a solicitação de realização de auditorias ao Tribunal a um determinado organismo objecto de fiscalização e controlo político e pedido da emissão do parecer sobre a Conta Geral do Estado (CGE).

O Tribunal de Contas no âmbito da sua fiscalização e controlo da arrecadação das receitas e da realização de despesas realiza as auditorias como forma de efectivação da sua fiscalização sucessiva com vista à análise da legalidade. As constatações de auditorias (fiscalização externa) obtidas nestas acções visam primariamente servir de matéria de facto para o próprio Tribunal em acções de efectivação de responsabilidades financeiras em processos jurisdicionais específicos. Portanto, fora deste objectivo e da iniciativa própria, no âmbito da alínea d) do artigo 6.o da Lei 13/10, o Tribunal pode realizar auditorias por iniciativa da Assembleia Nacional, que servirá de base para a fiscalização política a cargo deste órgão de representação política.

A relação e coexistência entre os organismos de controlo financeiro interno e externo, no ordenamento jurídico angolano é nítida, vejamos; o Tribunal de Contas exerce diversos controlos que na maior parte das vezes é assegurada pelos órgãos de controlo interno, entre elas, o próprio controlo prévio, o que se traduz efectivamente numa duplicação de controlos, quer quanto ao âmbito, quer quanto ao tipo de controlo e mobiliza recursos para avaliar o controlo interno. Portanto, o controlo externo, nos termos da legislação vigente em Angola, consiste num controlo de legalidade, de regularidade e de boa gestão das despesas públicas.

É daqui que, decorre, naturalmente, os recursos (as vezes poucos) para que o Tribunal de Contas faça, um controlo sobre o mérito da gestão das instituições, organismos e gestores da coisa pública. É neste sentido e visão, que se criou uma base de sólida cooperação e inter-relação com organismos como a IGAE, a IGF e os CF que exercem o controlo financeiro público. Para efectivação desta cooperação, colaboração e inter-relação, são realizadas, a nível dos técnicos, reuniões metodológicas em fica definida com regularidade, dentre outras matérias são tratadas, a submissão dos programas anuais de trabalhos destes organismos de controlo e fiscalização de forma: a evitar-se que a mesma entidade fosse objecto simultâneo de uma acção de inspecção dos órgãos de controlo interno e de uma auditoria ou inquérito do Tribunal de Contas; o Tribunal de Contas, poder solicitar os relatórios do controlo interno e acções de auditoria que venha a analisar num momento posterior relativamente ao período económico. Para eficácia e eficiência destas linhas metodológicas de acção, foram criadas comissões de trabalho e reforçados os mecanismos de submissão dos relatórios de controlo interno ao Tribunal sempre que contenham matéria de interesse para a actividade do Tribunal. Isto revela fruto da cooperação destes organismos, muitos processos de responsabilidade reintegratória financeira tiveram como base os relatórios dos organismos de controlo interno, sobretudo da Inspecção Nacional de Finanças

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*Politólogo