Luanda - O Presidente angolano, João Lourenço, criticou hoje a forma como foi atribuída a construção do novo porto da barra do Dande, obra de 1.500 milhões de dólares, adjudicada pelo anterior chefe de Estado, admitindo que será revista.

Fonte: Lusa

A posição foi transmitida pelo chefe de Estado, que após as eleições gerais de 23 de agosto sucedeu a 38 anos de liderança de José Eduardo dos Santos, na primeira conferência de imprensa realizada em mais de 40 anos no Palácio Presidencial, em Luanda, juntando mais de uma centena de profissionais de órgãos nacionais e estrangeiros.

"Vamos procurar rever todo o processo no sentido de, enquanto é tempo, e porque o projeto não começou ainda a ser executado, corrigirmos aquilo que nos parece ferir a transparência, na medida em que um projeto de tão grande dimensão quanto este, que envolve biliões, com garantia soberano do Estado, não pode ser entregue de bandeja, como se diz, a um empresário, sem concurso público", disse João Lourenço.


A Lusa noticiou a 29 de setembro que o Governo de Angola vai emitir uma garantia de Estado de 1.500 milhões de dólares a favor da construção, por privados, do novo porto da Barra do Dande, face ao esgotamento da capacidade do porto de Luanda.

De acordo com um decreto presidencial do mesmo mês, assinado por José Eduardo dos Santos e publicado seis dias antes de João Lourenço chegar ao poder, aprovando o projeto, o novo porto será construído a cerca de 60 quilómetros para norte de Luanda, em regime de concessão por 30 anos, pela sociedade privada angolana Atlantic Ventures, a qual contará com uma participação de até 40% pela empresa pública que gere o atual Porto de Luanda.

"O Governo pretende criar as condições necessárias para que a província de Luanda tenha um novo porto de dimensão nacional e internacional com capacidade de abastecimento para todo o país e que, estrategicamente, possa ser, também, um entreposto internacional de mercadores", lê-se no mesmo decreto.

Um modelo de contratação que João Lourenço afirma que não irá manter: "É evidente que não".

"Quer este projeto em concreto, quer outras obras públicas da dimensão do mesmo terão um modelo de adjudicação bem diferente. Ou seja, aberto, que vai permitir que quem estiver em condições, desde que concorra e vença, obviamente, poder executar a obra", acrescentou.

O decreto em causa, noticiado anteriormente pela Lusa, refere que o porto de Luanda, "de acordo com a evolução registada nos últimos anos nas operações portuárias" e face às "projeções de tráfego realizadas, não logrará, a curto prazo, satisfazer as necessidades de estiva e movimentação de cargas e descargas exigidas pelo comércio nacional e internacional".

Para o efeito, foi definido pelo Governo, segundo o mesmo documento, o objetivo estratégico para instalação, na nova cidade do Dande (já na província vizinha do Bengo) do novo porto da capital, serviços associados e uma Zona Económica Especial, reservando para o efeito uma área total de 197,2 quilómetros quadrados e um perímetro de 76,4 quilómetros.

"O Governo considera a construção, a exploração e a manutenção do porto da Barra do Dande um empreendimento prioritário, de interesse nacional e público, considerando ainda que o empreendimento deve ser realizado com recurso a financiamento privado, de acordo com os princípios da eficiência da distribuição, partilha e gestão do risco pela parte que melhor o sabe gerir", escreve ainda o decreto.

Ficou ainda previsto que a concessão do futuro porto à sociedade Atlantic Ventures seja por um período de 30 anos, incluindo a tarefa de licenciamento, conceção, financiamento, projeto, desenvolvimento técnico e sua construção, "em associação com a autoridade do porto de Luanda".

O decreto assinado ainda por José Eduardo dos Santos autorizava o Ministério das Finanças a "prestar uma garantia de Estado de pagamento à primeira solicitação, a favor das entidades financiadoras da concessão no valor de até 1.500.000 dólares [1,2 mil milhões de euros], sem prejuízo da possibilidade de prestação, pelo Estado angolano, de outras garantias no âmbito e para efeitos de viabilização de financiamento para o desenvolvimento da concessão".

 

PR angolano admite renegociação da dívida pública de Angola


O Presidente angolano, João Lourenço, desvalorizou hoje o processo de renegociação da dívida pública angolana previsto pelo executivo, reconhecendo que é algo "permanente" e feito por todos os governos.

O chefe de Estado respondia no Palácio Presidencial, em Luanda, às questões colocadas pelos jornalistas durante a primeira conferência de imprensa do género realizada na presidência angolana, em mais de 40 anos.

"A negociação da dívida é um processo praticamente permanente, que todos os governos fazem, no sentido de encontrar melhores condições para honrar com os seus compromissos perante os credores, para não fugir das suas responsabilidades", recordou.

"Uma das saídas é sempre procurar renegociar", enfatizou o chefe de Estado.

Um recente documento do Governo refere que o stock de dívida interna angolana ascendia, no final de 2017, a 5,3 biliões de kwanzas (26,5 mil milhões de euros) e a externa a 4,4 biliões de kwanzas (22 mil milhões de euros).

Em 2017, só na emissão de bilhetes de Tesouro com maturidades de um ano, o Estado angolano pagou juros de 23,90%, segundo dados do Banco Nacional de Angola.

A Lusa noticiou a 04 de janeiro que a compra antecipada de dívida pública angolana de curto prazo, recorrendo à emissão de dívida com maturidades mais longas, é uma das medidas previstas pelo Governo para reduzir a atual trajetória de endividamento público.

Em comunicado enviado na ocasião à agência Lusa, o Ministério das Finanças refere-se em concreto ao Programa de Estabilização Macroeconómica (PEM), apresentado quarta-feira, em Luanda, pela equipa económica do executivo, que aponta à "necessidade de reverter a atual trajetória da dívida pública", para "reduzi-la para os níveis de referência estabelecidos na Lei-Quadro da Dívida Pública".

"Nesse sentido, o PEM reforça a necessidade de uma gestão fina da carteira da dívida pública interna e externa, utilizando os instrumentos de mercado à sua disposição, para, entre outros, promover a fungibilidade dos títulos", lê-se no comunicado do ministério liderado por Archer Mangueira.

Acrescenta que, para o efeito, a nível do mercado interno, "o Ministério das Finanças, sempre que necessário, poderá realizar resgates antecipados", enquanto no mercado externo o objetivo "é afinar a gestão dos passivos do Estado, com recurso à compra antecipada de dívidas de curto prazo e à contratação de dívida de mais longo prazo".

"O Ministério das Finanças reitera o compromisso com os credores no cumprimento do serviço da dívida interna e externa, objetivo que se reflete já na proposta do Orçamento Geral do Estado 2018 e suportado pelos atuais níveis de tesouraria do Estado", refere o mesmo comunicado.

Com um volume de dívida pública da Administração Central acima dos 61% do Produto Interno Bruto (PIB) angolano no final de 2017, o PEM reconhece que a dívida externa "tem aumentado de forma significativa".

"A evolução do rácio da dívida pública total no PIB mostra que, se a trajetória se mantiver, em breve Angola terá de enfrentar sérias dificuldades com a sustentabilidade da sua dívida", lê-se no documento do Governo, a que a Lusa teve acesso.

Refere ainda que o Governo pretende "obter a visão correta do total da dívida", incluindo pagamentos atrasados do Estado e dívida externa privada, e dos seus fluxos, "bem como previsões precisas do serviço da dívida".

Prevê igualmente a adoção de medidas para assegurar a "sustentabilidade da dívida pública", nomeadamente negociando "o alongamento da curva de rendimento do endividamento nacional, com os principais parceiros nacionais e internacionais".