Luanda - O Executivo, por intermédio do Ministério da Agricultura e Florestas, proibiu a partir de 1 de Fevereiro o corte, circulação e transporte de madeira em toro e serrada, bem como a cessação da campanha de exploração florestal 2017 em todo território nacional. O secretário de Estado para os Recursos Florestais, André de Jesus Moda, em entrevista ao Jornal de Angola, disse que a medida  destina-se a disciplinar a actividade do sector, organizar os empresários e proteger os recursos florestais do país.

Fonte: JA
Quais as razões que levaram à suspensão da exploração florestal no país?
É uma medida excepcional que foi tomada por causa de alguns constrangimentos que fomos tendo na aplicação da nova Lei que foi promulgada a 24 de Janeiro de 2017. Tínhamos uma série de medidas a cumprir depois da - da Lei e daí começámos a sensibilização dos diferentes ministérios, dos governos provinciais e da própria sociedade e depois organizámos a Conferência Nacional das Florestas.

O sector conta com quadros suficientes?
Com os poucos quadros profissionais que temos no sector, tivemos um atraso no cumprimento daquilo que foi estipulado na concepção das normas e do regulamento florestal. Porque não se pode aplicar a Lei sem um regulamento. E  a questão do regulamento atrasou-nos. Foi exarado um Decreto Presidencial que permitiu a abertura da campanha florestal a 14 de Junho de 2017. Tivemos um atraso na emissão das licenças e só começámos a distribuir as licenças em Setembro. A nova Lei estipula que a exploração florestal devia começar no dia 1 de Maio para terminar a 31 de Outubro e como começámos tarde  não havia hipótese de a campanha terminar na data estabelecida pela Lei. Logo, pedimos uma derrogação ao Presidente da Re-pública que exarou o Decreto 274/17 de 10 de Novembro  que prorroga para até 31 de Janeiro de 2018 o período da campanha florestal. O prazo estipulado pelo Decreto cessou e é óbvio que tudo deve parar.

E o regulamento já foi elaborado?
Os técnicos estão a trabalhar desde o dia 15 de Janeiro e podem apresentar o texto do regulamento em breve. Estamos a trabalhar no sentido de cumprirmos  os prazos para que a partir de Maio possamos trabalhar em conformidade com a nova Lei.

E essa suspensão vai vigorar até quando?
A medida vigora até ao momento em que nos sentirmos confortáveis em abrirmos a campanha de exploração florestal. O Estado, como pessoa de bem, não pode penalizar os empresários e estes devem entender que estamos numa fase de transição entre a antiga e a nova Lei. É um trabalho muito complexo que exige trabalho. Quer o Executivo, quer os empresários temos todos dificuldades e todos vamos ter sacrifícios. Acreditamos que os próximos momentos vão ser melhores. Depois desta suspensão, os empresários devem organizar-se  para concorrerem à próxima campanha de acordo com aquilo que a nova
Lei estipula.

Quais são as medidas a ser  aplicadas aos incumpridores?
O Estado é uma pessoa de bem e estão a ser acauteladas medidas concretas onde todos vão ter de trabalhar no sentido de cumprir. Primeiramente, o Estado vai criar entrepostos   localizados em áreas estratégicas onde não há nenhuma alternativa de passagem. Todo e qualquer madeireiro vai ter de passar por aí, e o entreposto vai ser como uma espécie de funil onde estão presentes todas estruturas de controlo como o Instituto de Desenvolvimento Florestal (IDF), os representantes dos ministérios das  Finanças e do Comércio, a Polícia Nacional, a Administração Geral Tributária (AGT)  e todos os que participam no processo de importação e exportação. Se a madeira não for explorada legalmente fica retida a favor do Estado. Se for legal devem-se cumprir  os trâmites de exportação porque o produto não pode sair do país sem termos constatado a entrada das divisas.

Os técnicos já trabalham neste dossier?
Os nossos técnicos estão a trabalhar no sentido de fiscalizarem o preço mínimo de referência que vai ser estabelecido por cada espécie e aí temos o controlo da movimentação da madeira. Neste período em que a medida entrou em vigor até à data da abertura da próxima campanha quem não cumprir arrisca-se a sanções muito graves. Primeiramente essa pessoa perde o direito à licença durante um período de  dois ou três anos. Depois a madeira é retida e revertida a favor do Estado e o seu equipamento também é confiscado. Estamos em sintonia com os órgãos de Defesa e a Polícia e outras entidades para que a medida seja cumprida.

Há meios técnicos suficientes para permitir a execução dessas medidas?
O problema da fiscalização foi uma das questões  debatida  na última conferência nacional sobre florestas que realizámos em Luanda. Os recursos humanos em todos sectores são escassos, quer do ponto de vista de quantidade, aptidões e qualidade quer de condições de trabalho. Mas para contornarmos isso, sensibilizámos a população, porque o bom cidadão é aquele que sabe respeitar a Lei, proteger o seu espaço territorial e sobretudo os recursos naturais.

Os actuais níveis de abate ou de desflorestação do país são preocupantes?
Temos um estudo sobre o inventário florestal que diz que crescemos. O crescimento das florestas para o nosso país é de três a quatro por cento. Os volumes de 40 por cento explorados hoje são muito inferiores em relação ao que está estipulado. Angola tem uma quota de 500 mil metros cúbicos por ano para a exploração, mas somente são explorados cerca de 200 mil metros cúbicos ao nível de todo país. Isto é para dizer que a situação não é tão alarmante como se costuma dizer. O inventário florestal feito em 2015 diz que Angola tem 69 milhões de hectares de floresta. A floresta é um recurso dinâmico que está sempre a crescer. Devido ao conflito armado que tivemos não permitiu uma exploração substancial desses recursos. O que preocupa o Executivo é tão-somente o abate desordenado de algumas espécies.

Há denúncias do abate indiscriminado de madeira em várias províncias do país realizado sobretudo por estrangeiros de nacionalidade chinesa. Já foram tomada medidas para contornar a situação?
A situação está a ser divulgada de forma exagerada. Os estrangeiros estão em parceria com o empresário nacional. Não vemos um estrangeiro  ir  até onde estão os nossos recursos sem a colaboração do cidadão nacional. É obvio que ele tem a tecnologia e  equipamentos.

Quer dizer que há um apoio relevante de cidadãos nacionais?
É assim que nós entendemos a presença dos estrangeiros em certas zonas de exploração. Não é verdade que o estrangeiro vai e corta. Já fizemos o nosso trabalho de verificação e fomos a áreas onde encontrámos estrangeiros, como chineses, vietnamitas e portugueses que estão a auxiliar os nacionais em termos de maquinaria, e quando são vistos nessas áreas são tomados como indivíduos que estão a assaltar os nossos recursos. Não é verdade. Sabemos que há algumas anomalias nas parcerias entre os nacionais e os estrangeiros.  Já tomámos   medidas para que todas as parcerias com estrangeiros devam ser monitorizadas pelo Instituto de Desenvolvimento Florestal (IDF). A parceria é livre para qualquer  que cumpra  as normas estabelecidas pelo Estado. Não podemos ceder os nossos recursos a qualquer um e de qualquer maneira. O Estado tem normas que regulam esta questão, por isso todos os contratos a ser celebrados no sector entre nacionais e estrangeiros vão ter de ser monitorizados pelo IDF. Aliás, a nova Lei abre a questão das concessões florestais e temos a empresa nacional Madang, que vai trabalhar nesse sentido. O cidadão nacional deve trabalhar com o estrangeiro dentro das normas estabelecidas pelo Estado. Certos critérios na formulação dos contratos de parceria devem ser seguidos pelo sector para evitar essas situações.

Em Cabinda há denúncias de que empresas chinesas vieram  a título de empresas construtoras e de repente tornaram-se  empresas de exploração e exportação de madeira. Tem conhecimento desses factos?
Não é só em Cabinda. É um assunto nacional. Sabemos que logo que houve o problema de escassez de divisas no país, os empresários que estavam a trabalhar na área de construção e em outras áreas sentiram-se em baixo e todos  entraram no sector florestal e nós demos conta disso. Mas não entraram sozinhos, entraram com conivência de cidadãos nacionais.

Mas entraram de forma legal ou ilegal?
Houve contratos mas  não foram bem sucedidos. O cidadão nacional só estava a perder porque não conseguia acompanhar o produto até ao mercado internacional, onde se vendia. O estrangeiro  ditava o preço de compra e a forma de exploração. O nosso empresário está muito fraco nesta matéria. O Estado já deu conta dessa situação e estamos a trabalhar no sentido de repor a legalidade.

Qual tem sido a contribuição financeira do sector para a economia nacional?
O sector florestal é um sector estratégico do Estado. A madeira passou a ser um recurso estratégico do Estado na mesma linha do petróleo e dos diamantes devido a sua importância económica e social. Contribuiu com receitas consideráveis para o Produto Interno Bruto (PIB) do país.

Os dados que temos revelam que em 2017 foram arrecadados 1.522.866.018,00 kwanzas para os cofres do Estado. Não acha esse valor  pouco para um país que possui uma superfície florestal avaliada em 69,3 milhões de hectares e reservas de madeira comercial estimadas em 4,5 mil milhões de metros cúbicos?

Esse foi um dado que obtivemos naquele momento em que realizámos a conferência nacional sobre florestas. Mas aquilo que está previsto para a próxima campanha vai ultrapassar esses dados e está estimado em dois mil milhões de Kwanzas. Os dados que referiu são lineares porque a exploração é anual. Com o preço mínimo de referência a ser estipulado para cada metro cúbico, o Estado vai arrecadar muito mais do que aquilo que arrecadou nos anos anteriores.

Quais são os preços praticados neste momento no mercado?
Estamos a organizar o sector empresarial. Os acordos que os empresários fizeram com os seus parceiros são débeis. Há quem vendeu por 30 mil kwanzas o metro cúbico e há indivíduos que venderam menos do que disso. O cidadão nacional, pela sua ignorância, julga que ganhou, mas perdeu. E quem perde mais com isso tudo é o Estado que é o detentor dos recursos. Já sensibilizámos os empresários do sector para que se organizem em associações e apelamos que cada um esteja legal. Nos próximos exercícios só terão licenças as pessoas que vão obedecer aos critérios ora impostos. Deve ter uma miniserração na área de exploração. Nem todos devem exportar. A partir dos entrepostos temos o máximo de controlo da venda e da própria exploração da madeira.

Os preços vão-se aproximar aos do mercado internacional?
Os técnicos estão a trabalhar nesse sentido. Há espécies de madeira que custam no mercado internacional cerca de 1.200 dólares o metro cúbico  e outras o mínimo são 600 dólares. Não vamos estabelecer um preço que prejudique o empresariado. Vamos dar uma margem de benefício para os poder potenciar economicamente. São obrigados a exportar pelos preços a ser estipulados e vamos trabalhar na certificação do produto para correspondermos às exigências do mercado internacional.

Que benefícios traz a nova lei  para o Estado e para os operadores do sector?
Quando o sector não é organizado isso facilita a exploração ilegal e com a nova Lei já não há concorrência desleal entre o empresário. Outro ganho tem a ver com a capitalização das próprias empresas. A Madang vai trabalhar para captar investimentos e enquadrar as empresas organizadas para trabalhar e ganhar. A Lei  vai proteger  os recursos. Os empresários vão ter a capacidade de trabalhar numa zona de exploração que lhes for atribuída num período de exploração de 20 a 25 anos. Os empresários que não têm  capacidade de exploração vão ser encaminhados para o sector de povoamento florestal.
É necessário conservar as nossas florestas naturais. A partir de agora só vamos  atribuir licenças de exploração de madeira aos empresários que podem fazer o repovoamento, porque como   está a situação, o empresário tem dificuldade em encontrar o produto de que necessita e muitas  vezes não consegue  honrar os compromissos com os clientes. Às vezes, no momento de vender, o cliente recusa e o produto fica desvalorizado, com isso o Estado perde e o próprio empresário nacional perde. A Lei vai  ajudar a pôr  ordem, a organizar o sector, a organizar os empresários e a estarmos nos mesmos patamares com os outros países.

Em relação aos garimpeiros que não têm licença, quais são as medidas a tomar?
Com  as medidas rígidas que estamos a tomar vão desaparecer voluntariamente porque elas vêm mesmo para disciplinar. O seu produto não vai circular no país devido à presença dos entrepostos. Quem estiver a explorar à margem da lei não vai ter sucesso porque o seu produto quando cortado na mata não vai poder circular para ir ao encontro do consumidor. Qualquer movimento dos garimpeiros vai cair sempre no radar dos entrepostos, que são um verdadeiro crivo para fazer funcionar a lei. Também estamos a  formar uma policia florestal com o auxílio da Polícia Nacional e podemos absorver os efectivos dispensados das FAA. A futura polícia florestal tem como tarefa fiscalizar a actividade de exploração florestal. Os próximos momentos são diferentes do passado. Vamos tentar pôr ordem e acreditamos que não vai haver tantos empresários a exportar. Só exporta quem tem capacidade e condições e for aceite pelo Estado.