Lobito - O ensino, em Angola, continua sem a devida qualidade! Na Universidade, os professores reclamam que os estudantes vêm mal preparados do ensino médio; no ensino médio, os professores queixam-se do ensino primário; no ensino primário a culpa vai para o infantário; no infantário, por sua vez, diz-se que os alunos vêm mal preparados das respectivas famílias. Na família, o pai alega que o filho saiu à mãe. A mãe replica, contudo, que o problema é hereditário da família do pai! Neste jogo de empurra JLO diria, sem dúvidas, que o problema vem de JES. Este, responsabilizaria o colonialismo português como estando na causa do fracasso do ensino, em Angola. A fila do jogo de empurra seria enorme. O próprio colonialismo português apontaria o dedo para o indígena que teria "precipitado" a independência, uma independência que continua dependente económica e tecnologicamente. Nesta ordem de ideias, até Adão no Éden culparia a Eva pela desgraça que vivemos no país!

Fonte: Club-k.net

A quem deve ser assacada então a falta de qualidade do nosso ensino, aos professores, aos alunos, aos pais ou encarregados de educação, ou ao governo?

 

Ao que parece, o bolo da culpa, deve ser repartido entre os pares, embora se configure inequívoco que é ao governo que deve ser dada a maior fatia. É ao governo que impende a selecção e recrutamento de melhores professores, a definição de melhores políticas salariais que motivem e dignifiquem a classe, a criação de melhores condições técnicas, a definição e criação de melhores currículos escolares, a cabimentação orçamental equitativa, et cetera... Não pode haver ensino sério e de qualidade que não encontre prioridade no OGE do seu país.

 

A família, contudo, também não fica muito longe na fila da recepção da sua fatia. "Mutatis mutandis" é de uma melhor família que vêm melhores professores; melhores alunos; melhores governantes; enfim, melhores governos... Portanto, Estado e famílias têm mútua responsabilidade no fomento de um ensino de qualidade. Têm mútua responsabilidade na construção da justiça social.

 

A qualidade de ensino, em Angola, passa então por um misto de estratégias e de requisitos dentre os quais a mudança radical de paradigma de governação que passe a olhar para a qualificação do professor e para sua promoção de carreira como elementos fundamentais.

 

Por outra, se se quer realmente qualidade de ensino, no país, o ensino de base deve merecer maior atenção das entidades afins. "É de pequeno que se torce o pepino". As duas idades mais importantes para iniciar a educação, são: dos três aos quatro, para a formação psicológica, e a partir dos dez para o desenvolvimento ético. É, sem dúvidas, aqui que reside o busílis da questão e consequentemente maior trabalho para o professor, mas que nem sempre encontra a devida contrapartida remuneratória. Os baixos salários que se auferem no subsistema de ensino primário não dignificam em nada a classe docente.

 

Nas escolas, via de regra, como se não bastasse, ensina-se muito ainda sobre a lua e pouco ou nada sobre a terra. Ou seja, nem sempre há coincidência estreita entre a convicção do professor e o conteúdo programático que lecciona. O professor nem sempre sabe realmente o que pensa saber e porquê o quer ensinar. Falta-lhe, não raras vezes, a definição de parâmetros para o que se deve ensinar de facto. O professor vive mais como pensa e raramente pensa como vive. As próprias avaliações nem sempre estão de acordo com a aprendizagem significativa. Os próprios manuais escolares nem sempre reflectem a conjuntura cronológica, geográfica e cultural já que Angola é um mosaico multiétnico, multirracial e multicultural a que também deveriam obedecer os currículos escolares que se prezassem. Acresce-se a isso o factor «Luandização» de tudo e de todos. O país inteiro anda atrelado a Luanda por tudo e por nada! A título de exemplo, são os certificados dos licenciados das dezoito (18) províncias do país que devem ser visados apenas na capital do país pelo INAAREES (Instituto Nacional de Avaliação, Acreditação e Reconhecimento de Estudos do Ensino Superior), sob pena de invalidade dos mesmos. Até o Carnaval, que seria a manifestação cultural de cada província, não escapou da referida Luandização . Tal factor compromete o desenvolvimento do país e compromete a desconcentração e descentralização administrativas que se vislumbram, embora de forma tênue, no horizonte. Que venham então as eleições autárquicas sem mais demora e sem mais gradualismo!

 

Exige-se, assim, um olhar crítico do sistema de forma desapaixonada, longe das mesmices de ordem ideológica ou política ou ainda de programas impostos pelas organizações internacionais adversos ao nosso "modus vivendi e operandi". A despartidarização completa das instituições e das mentes, em geral, é uma das metas arrojada a não ignorar nesse desafio. Pois, «em Angola, como refere o renomado jurista Albano Pedro, a despartidarização dos serviços públicos deve começar pelo Presidente da República e estender-se a todos os membros do executivo. É preciso eliminar a promiscuidade dos governadores provinciais e municipais que acumulam os cargos de 1o secretário de MPLA nos respectivos níveis administrativo-partidário. Isso seria despartidarizar os serviços públicos. Tal como deve evitar a todo custo que o JLO assuma o cargo de Presidente do MPLA levando a que o ganho que se conseguiu em separar o Presidente dos Angolanos e o Presidente do MPLA venha a ser perdido a favor do discurso do fim da BICEFALIA no partido. Um discurso de tom ditatorial defendido pelos militantes TOTALITARISTAS do MPLA que pretendem colocar o novo Presidente da República na mesma confusão de servir o povo e o partido em que se meteu JES e deu lugar a violenta onda de corrupção que arrastou a maioria esmagadora dos angolanos a miséria. O mais grave é essa mesma ideia seduzir gente que vem aludindo uma certa ideia de democratização do Estado», fim da citação.

 

Portanto, se quisermos ser "grandes" temos de aprender a pensar grande. Temos de REFORMAR O PENSAMENTO. A reforma do pensamento deve levar necessariamente à reforma do Ensino; à reforma do Estado... "A dificuldade, porém, está em levar os adultos a desaprender, ou em torná-los outra vez crianças", como adverte Robert Kiyosaki em Pai Rico Pai Pobre. Sem Reforma do Pensamento e das mentes, entretanto, é inviável qualquer Reforma que se pretenda. A reforma do pensamento implica necessariamente mudança de atitude. Novas atitudes, novos resultados. No essencial, o importante é ganhar-se flexibilidade intelectual para se ser capaz de mudar de paradigma num mundo global, complexo, veloz, mutável, incerto onde o impossível tornou-se rapidamente possível e o possível provável. Esse exercício intelectual requer uma boa dose de sensibilidade racional, uma ataraxia existencial e uma deslocação da zona de conforto para o desconhecido. Enquanto tivermos medo de pensar diferente e daqueles que pensarem diferente nada será diferente no país. As mudanças impõem tolerância e ousadia. Sabe-se que pensar fora da caixa de ressonância é correr riscos. Todavia, sem um pouco de loucura, sem paixão, nenhuma inovação científica ou tecnológica seria factível. Aliás, aprender de verdade exige energia, paixão e um desejo ardente.


Não podemos continuar a permitir, portanto, que a escola continue um mero espaço de dar aulas; um espaço onde o 'professor ensina' e o 'aluno aprende', numa dialéctica da tábua rasa. Quem continuar a dar aulas, arrisca-se a "chover no molhado", pois, as informações, hoje, estão disponíveis num clique. A missão do professor hodierno é “criar espantos . «Proponho que sejamos professores de Espantos», sugere Rubem Alves, pedagogo brasileiro. O professor deve procurar colocar o estudante num permanente dilema epistemológico. Tal missão requer deste profissional tacto e talento. De nada adianta ser um especialista e possuir uma formação latu ou strictu sensu se não existe talento para "criar espantos", ou seja, se não existe a paciência e as habilidades didácticas essenciais à prática da docência. Para o efeito, é necessário uma educação para a cabeça bem-feita , como dirá Edgar Morin, capaz de fomentar a formação integral do Homem.

 

Uma formação integral que consista em desenvolver, de maneira plena, em cada criança, a totalidade das suas potências hereditárias, como: beleza, destreza e força do corpo, resistência dos órgãos, equilíbrio do sistema nervoso, inteligência, vontade, senso moral, sentido estético, sentimento religioso, capacidade de esforço, alegria de viver. Todas estas actividades são reciprocamente solidárias e devem ser tocadas. O ensino que ignorar essa lógica caminha irremediavelmente para o fracasso. Ora educar não é apenas transmitir conhecimentos científicos de maneira solta, é humanizar o homem, orientá-lo a tornar-se autónomo, praticante de valores humanos. O grande objectivo da educação, afirmou Herbert Spencer, não é o saber, mas a acção. O compromisso maior da educação está na intenção de tornar o Homem mais sensível com relação ao mundo que o cerca e aos seus semelhantes. Toda e qualquer acção educativa que não tenha em mira esta elevação espiritual do Homem falhará, como, aliás, tem falhado até hoje o nosso sistema de ensino, uma vez que nenhuma teoria educacional baseada somente em princípios socioeconómicos e políticos conseguiu um vislumbre sequer, no sentido de se marchar para a realização plena da vida, com respeito irrestrito à natureza irrestrita e, notadamente, ao seu semelhante. É, certamente, para esta perspectiva que apontam os quatro (4) pilares da educação para o século XXI, sugeridos no Relatório da UNESCO, quais: APRENDER A CONHECER (adquirir os instrumentos da Compreensão); APRENDER A FAZER (Traduzir a Teoria em prática); APRENDER A VIVER JUNTOS (Cooperação, Amizade, Conhecimento do Outro); APRENDER A SER (Autónomo, Crítico, Responsável, livre, Criativo e Imaginário).

 

A ideia recorrente de formar quadros, apenas para o mercado de trabalho, já não serve. A formação académica deve visar a vida e nunca o emprego tão só.

 


Este grande desafio requer, governantes, Professores, pais e encarregados de educação com o pensamento reformado, comprometidos com o Homem, com a sua pobreza, sua realidade, seus medos seu potencial, mas acima de tudo sua felicidade.

Fernando Kapetango

Lobito, 22 de Fevereiro de 2018