Ao mesmo tempo, será feita uma aposta forte no domínio da habitação social, assim como da educação e da saúde. Os jovens e as mulheres serão priorizados, o que se justifica plenamente, pois trata-se da esmagadora maioria da população angolana.
Esta aposta clara do MPLA na questão social está baseada em diversos factores.
O primeiro é a própria história do referido partido, que sempre foi uma organização focada na satisfação dos interesses populares.

O segundo é a própria ideologia e natureza actuais do MPLA, tal como definidas no seu último congresso, realizado em 2003. Nesse encontro, o partido no poder reiterou o socialismo democrático como sua base ideológica e definiu-se como uma organização que combina a sua vocação de partido de massas com a integração, utilização e respeito pelos quadros e intelectuais, bem como outros grupos sociais (empresários, religiosos, etc.).

O terceiro – e talvez o mais determinante – é o resultado das opiniões, críticas e pressões de sectores da sociedade civil e até de alguns militantes, quadros e intelectuais pertencentes ou simpatizantes do próprio MPLA, nos quais modestamente me incluo. Nos últimos tempos, várias têm sido as vozes alertando para uma certa “deriva elitista” dos projectos de desenvolvimento do país, em detrimento da resolução das questões sociais básicas. Tudo indica que a actual direcção política do partido no poder soube captar os chamados “sinais da rua” (e não só) e está pronta a corrigir o(s) tiro(s).

Apenas para que conste, diga-se que não se trata de regressar aos princípios do “socialismo estalinista” do período de partido único, nomeadamente a centralização política e económica. Esse foi um momento da história do MPLA (1977-1990) que, a rigor, teve muito mais a ver com o clima de guerra fria então existente do que com a própria identidade original do partido (o “MPLA profundo”, digamos assim). De igual modo, não correspondia aos fundamentos da sociedade angolana no seu conjunto.

Assim, a democracia e a economia de mercado são hoje assumidos de forma irrevogável pelo MPLA. Em relação, especificamente, à economia de mercado, ficou claro, na sua 3ª conferência nacional, que o partido defende uma “economia de mercado com justiça social”, abandonando-se, felizmente, o esdrúxulo conceito de “economia social de mercado”.

Pode dizer-se, por conseguinte, que as vozes que alertavam para o “elitismo” de certas opções tinham razão. Filosoficamente, a batalha parece ganha. Contudo, o problema não é apenas filosófico.

Desde logo, e obviamente, é preciso actuar de acordo com as teses e os princípios filosóficos definidos. Ou seja, o MPLA tem de fazer o que diz que vai fazer. Isso é particularmente crítico nos sistemas democráticos como aquele que está a ser construído em Angola, pois os partidos que detêm o poder são escrutinados de quatro em quatro anos.
Mas, nas nossas circunstâncias, há um aspecto peculiar, para o qual quero hoje chamar a atenção: a responsabilidade social das elites, sobretudo políticas e económicas (que, no caso angolano, se confundem até fisicamente). Num país com os problemas sociais como aqueles que ainda existem em Angola, essas elites têm, no mínimo, um dever de recato e solidariedade absolutamente crucial, quer para o sistema quer para eles próprios.

Apenas para dar um exemplo actual, organizar um rodeo (!) com cowboys e músicos americanos, brasileiros e canadenses numa pequena cidade do interior, cujas sanzalas à volta estão na mais completa miséria, é, para ser generoso, uma iniciativa perfeitamente inapropriada, a todos os títulos (sociais, culturais, circunstanciais, etc.). Os seus reflexos políticos são inevitáveis.A responsabilidade social das elites é uma questão ética. Mas também de inteligência.

Fonte: JA