Luanda - No passado dia 18 de Outubro, enderecei uma carta ao Director do Jornal de Angola, onde entre outras coisas fazia alguns “motes para reflexão” como então chamei a alguns reparos técnicos. Quis na altura e quero agora ressaltar o profissionalismo e espírito de missão dos colegas desse nosso único diário, quase todos eles amigos, camaradas, companheiros de muitas lutas, enquanto juntos fazemos “as estórias e a história do nosso jornalismo” como diria o saudoso Sebastião Coelho. Por isso, tomo um extremo cuidado nesta carta aberta que é afinal um verdadeiro lamento, para jamais ferir estes camaradas de trincheira com essa mágoa que me vai no peito.
 

Fonte: SA/Club-k.net

Intolerância e o buçalismo que impede-nos de discutir em paz as nossas diferenças


A minha carta mereceu uma resposta “da Direcção do Jornal de Angola”. As aspas devem-se ao facto que de tão malcriada, arrogante e ofensiva, duvidei desde o princípio que ela tivesse originado do diplomata urbano, afável e probo que é o José Ribeiro, ou do humilde e competentíssimo mestre que é o Filomeno Manaças, ou outro qualquer dos membros do Conselho de Direcção do Jornal de Angola que eu conheço e que me conhecem. Uns poucos telefonemas chegaram para dar-me razão, dali o cuidado neste lamento.

 

A dita resposta foi parida por um  “apêndice anómalo da própria Direcção” como frizou humorísticamente um jornalista sénior daquela casa. Mas mandam as regras que seja ao Zé Ribeiro que enderece este lamento, até porque a ele cabe a responsabilidade primeira e última na selecção de quem em seu nome fala e do JA também. Podendo como contribuinte imiscuir-me se calhar nisso, deixo no entanto estar. Já me basta ter que dizer públicamente a um dos maiores mestres deste nosso “pobre” jornalismo que a sua habitual elevação não se coaduna com a arrogância da tal “resposta” que de tão soez, ataca os próprios jovens que ao longo da sua vida prima como poucos por formar. Com a vida, com a palavra, com as obras. Mas lá chegaremos...


 
Como sabem, não sou, nunca fui membro do partido UNITA, assim como nunca fui nem sou membro do MPLA ou de qualquer outro partido político. Sou e sempre fui uma pessoa com um passado humanitário, cívico e profissional com o qual me identifico e cujo presente satisfaz-me plenamente. De formas que quando escrevi aquela simples missiva que quis “mote para reflexão” não o fiz em nome da UNITA, apesar de ter referenciado uma intervenção do seu líder que me pareceu oportuna. Dali que não faz qualquer sentido que ela tenha sido usada para um ataque – desnecessário, descabido e soez, na minha opinião – contra este partido. Tive ao longo de mais de 20 anos o privilégio de privar, trabalhar, pensar e construir Angola com membros lídimos de qualquer destes dois partidos e posso afirmar que todos eles, sem excepção, são patriotas que amam este País e por ele dariam quiçá a vida.

 

Não devemos confundir a luta política que eles fazem – aliás benéfica à democracia – com ódios viscerais de qualquer espécie. De formas que, vindo da Direcção do Jornal de Angola, um órgão público, aquilo não ficou bem. É minha esperança que o Director Ribeiro e o próprio Ministério da Comunicação Social identifiquem o autor do rascunho da tal resposta e o submetam a uma lavagem profunda na banheira de democracia que estamos a encher com tanto sacrifício. Isso se for angolano. Se não o for, mandem-no embora, que é mal gasto o dinheiro e benesses gastos com arautos das tempestades que já tanto mal nos fizeram. É que, da mesma maneira que, hoje por hoje, já não importamos as bananas da América porque podem trazer-nos doenças, porque haveríamos de importar jornalistas que trazem-nos o ódio, a intolerância e o buçalismo que impede-nos de discutir em paz as nossas diferenças?


 
De formas que, Senhor Director, escrevi aquela carta na condição de mim mesmo e – com orgulho e humildade o digo – do primeiro filho desta terra que as nossas universidades pariram enquanto técnico superior de Comunicação Social. O dia que atitudes como essa que lamento ou a minha própria consciência me fizerem optar por um partido (e a UNITA ou o MPLA podem ser um deles ou outro ainda que nem exista) assumi-lo-ei. Então falarei em seu nome se para isso tiver prerrogativas e quem responder poderá insultá-lo e vilipendiá-lo como quiser na certeza porém que receberá a resposta adequada. Mas não sendo esse o caso, um pedido de desculpas da vossa parte à UNITA – que aliás não é um “meio de comunicação privado” como diz a dita “resposta”, mas um partido político que tem direito aos fundos públicos pelos votos que obteve e se faz ou não um bom serviço isso é problema dos seus militantes e não nosso –  ofendida por algo com que não tinha nada a ver, ficaria mais conforme à probidade dos verdadeiros homens que compõem a Direcção do Jornal de Angola. Dos outros não sei, nem quero saber.
 


Quanto aos recém licenciados em Comunicação Social da UPRA: Caro Director Ribeiro, algo está muito mal nisso tudo. Essa baixeza não é sua, nunca foi vossa, eu não compreendo realmente o que pretenderam em assim destratar os jovens, mulheres e homens que dia a dia galhardamente procuram melhorar a sua formação. Se eles não saem da UPRA bem formados, nós os patriotas responsáveis sabemos que isso deve-se às más opções que a nossa geração (a vossa mais que a minha, creio, por força da idade) fizemos depois da Independência. Portanto, a culpa não é deles mas tão nossa que devemos-lhes as desculpas que a sua generosidade nunca nos pediu. Por isso é que, nós que assumimos essa responsabilidade sem medos nem complexos, lutamos dia a dia, algumas vezes sem bibliografia, outras vezes sem docentes sem salas condignas, algumas vezes ainda com salários atrasados para corrigir isso mesmo da única maneira que sabemos: trabalhando com coragem e espírito de missão patriótica. Dali que esse ataque – estranhamente parecido ao discurso habitual nos colonos saudosistas beberricando aguardente nas tabernas das margens do Tejo, graças a Deus uma (má) espécie em vias de extinção – doa mais ainda vindo de alguém como o senhor que até agora ocupou um lugar importante nesta luta.
 


Talvez aqui coubesse uma nota de esclarecimento: Nem as três instituições académicas superiores que ministram cursos de Comunicação (a UPRA, a Faculdade de Letras da UAN e a Universidade Independente) puseram ainda 50 licenciados no mercado. Quam nos dera que assim fosse. Serão uns vinte, se tanto, entre os quais alguns jornalistas séniores do JA que não são maus jornalistas não senhor!  E aos quais duvido que o tal “profissional de jornalismo de longa data” (pobre dele!) tenha alguma lição a dar a não ser de missivas como esta. E esse exíguo número deve-se exactamente ao rigor que procura-se imprimir na outorga do grau de licenciado. Dir-nos-ão que os nossos cursos superiores são piores que os da Sorbonne, Coimbra ou Lisboa onde uns e outros andaram. Não responderemos, por razões óbvias...


 
Resumindo: Se fui eu quem escreveu a tal ben(mal)dita carta, porquê não atacar a mim ao invés de fazê-lo a jovens que estão a fazer o que nós fizemos quando éramos da sua idade, isto é, formar-se com sabe Deus quanto sacrifício? Porque não dizer então que eu sou mal formado (apesar de 20 anos de carreira em organizações internacionais incluindo as Nações Unidas) não sei falar ou escrever português (faço-o em cinco línguas nacionais e três internacionais, graças a Deus) ou porquê não se assume então os complexos de alguns “cooperantes” e assumimos de uma vez por todas que os formados neste país não prestam?


 
E fico-me por aqui. Lamento deveras ter tido que escrever este... lamento. Deus é testemunha do quanto faria para não ter que fazê-lo. Mas acontece que a terra é muito nossa, por ela lutamos e sofremos, e o Jornal de Angola também – e isso não é negociável.  É da nossa terra, é nosso, é parte importante na construção da nossa angolanidade, da nossa nacionalidade por isso a todos os angolanos diz respeito.


 
E em nota de rodapé, Director: Que estória é essa de eu ser “indesejado” no vosso sistema informático – se é que é só nisso...? E quantos outros angolanos, para além de mim estão na mesma “categoria? Em termos de gestão de um órgão de informação ké’isso?!? Alguma disa qualquer? Não será por essas e por outras que os líderes da Oposição e arredores queixam-se do que se queixam?
 

Bem, no que me diz respeito eu lhe peço, de joelhos se preciso: Tire-me daí!!!

 

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