Mas quem vai desenvolver Angola e «reconstruir» o nosso devastado país? Que «angolanos» irão trazer o desenvolvimento para Angola e fazer desta terra um grande país? É que nos deparamos com dois graves problemas:

Primeiro Problema: Não temos população suficiente para desenvolver o País. Ainda em plena época colonial, e desde cedo, os estudiosos debruçaram-se sobre a «carência demográfica de Angola». Eles apontavam como causas determinantes da fraca densidade populacional e do pequeno crescimento das populações nativas, entre outras, a tremenda razia demográfica operada durante a escravatura, as endemias tropicais, o alcoolismo, a mortalidade infantil e a dispersão familiar determinada pelas migrações do trabalho. A hedionda guerra civil e a infame má governação desolaram e agudizaram este iníquo cenário. Acredito, profundamente, que somos menos, mas segundo as estatísticas oficiais Angola tem cerca 14 milhões de habitantes.

Para um país tão vasto como o nosso e cuja superfície equivale ao somatório das áreas geográficas de Portugal (92.446 km2); Itália (301.268 km2); França (551.500 km2); Holanda (40.844 km2); Bélgica (30.519 km2); Suíça (41.293 km2); Dinamarca (43.007 km2); Áustria (83.853 km2); Croácia (56.538 km2); Luxemburgo (2.586 km2); Singapura (618 km2); Mónaco (1, 95 km2); Andorra (453 km2); Liechtenstein (160 km2); Malta (316 km2); São Marino (61 km2) e Ilhas Seychelles (455 km2), este número é bastante escasso para o seu pleno desenvolvimento.

Precisamos, pelo menos, do triplo da população portuguesa. Ou seja, se Portugal, que é menor do que a Província de Malange (97.602km2), tem 10 milhões de habitantes, o nosso pais, além de muita paz, precisa de pelo menos 30 milhões de habitantes valorizados, saudáveis e nutridos. Contudo, e apesar de confrangedor, este é o menos aterrador dos cenários.

Segundo Problema: Este é, de longe, o mais abominável dos obstáculos, o mais aterrador dos cenários. É que, e sem exagero, 13 dos escassos 14 milhões de angolanos definham na mais absoluta degradação humana que, segundo o PNUD, é mais do que privação de rendimentos e de alimentos. A pobreza humana é também “a negação de escolhas e oportunidades para viver uma vida aceitável, tais como a educação e saúde escassas, privação de conhecimento e comunicação, falta de condições para exercer os direitos humanos e políticos, e ausência de dignidade, confiança e respeito próprio”.

Nenhum país, por mais que se afogue em abundantes riquezas naturais, é capaz de se desenvolver enquanto a grande maioria dos seus habitantes definhar numa vergonhosa indigência. Assim, os 13 milhões de angolanos que, em geral, são gerados em famílias degradadas, nascem em condições degradadas, crescem em ambiente degradado e sobrevivem em condições degradantes, não estão em condições de «arregaçar as mangas e reconstruir o país», não estão à altura de trazer o desenvolvimento para Angola e fazer desta terra um grande país.

Pelo contrário, quem precisa de, urgentemente, «arregaçar as mangas» são os próprios dirigentes que terão de trabalhar afincadamente no sentido de retirar os 13 milhões de compatriotas da abjecta miséria que os envolve, elevando as suas condições de vida para níveis aceitáveis, isto porque, apesar de Angola ser um país com abundantes recursos naturais, é a qualidade dos seus recursos humanos que irá determinar o seu progresso e desenvolvimento. É que, como dizia o Papa Paulo VI, “o desenvolvimento não se reduz a um simples crescimento económico. Para ser autêntico, deve ser integral, quer dizer, promover todos os homens e o homem todo”. Ou como bem disse o Papa João Paulo II, “o desenvolvimento é uma questão de pessoas. São as pessoas, de facto, os sujeitos do desenvolvimento verdadeiro; são elas a finalidade do desenvolvimento verdadeiro. O desenvolvimento integral das pessoas constitui a meta e o ponto de aferimento de todos os planos de desenvolvimento”. E dado que o Homem é o centro do progresso, o nosso país jamais sairá da vergonhosa estagnação enquanto se não promover intensamente um pleno desenvolvimento humano e uma valorização integral do angolano.

Ao contrário dos governantes da Etiópia ou da Somália, os dirigentes angolanos dispõem dos meios e recursos necessários para rapidamente «arregaçarem as mangas». E não é assim tão difícil proporcionar aos angolanos o pleno usufruto das riquezas de Angola, isto porque, e contrariamente a certos gananciosos «compatriotas», os verdadeiros filhos de Angola são simples por natureza. Eles não clamam por exigências extravagantes e exorbitantes, nem ambicionam ilusórias grandezas ou imensas riquezas. Aspiram apenas à satisfação das exigências básicas dos homens de hoje. Segundo o Papa Paulo VI, os homens de hoje aspiram a ser libertos da miséria, encontrar com mais segurança a subsistência, a saúde, um emprego estável; ter maior participação nas responsabilidades, excluindo qualquer opressão e situações que ofendam a sua dignidade de homens; ter maior instrução; numa palavra, realizar, conhecer e possuir mais, para ser mais.

Está, assim, na hora de os nossos dirigentes «arregaçarem, seriamente, as mangas». Porque os filhos de Angola jamais estarão em condições de colaborar na «reconstrução do nosso país» enquanto continuarem a ser altamente desvalorizados, intensamente oprimidos, desumanamente tratados, exaustivamente explorados e perenemente humilhados. Os ditos «artífices do desenvolvimento» nunca estarão à altura de «trazer o desenvolvimento para Angola e fazer desta terra um grande país» enquanto não gozarem de liberdades políticas e poderem plenamente participar na vida da comunidade bem como nos debates e decisões que moldam as suas vidas. Enquanto não forem instruídos, educados e livres de se exprimirem. Enquanto não forem capazes de ter uma vida longa e saudável. E enquanto não tiverem um padrão de vida digno.

É necessário, portanto, tornar acessíveis aos angolanos todas as coisas de que necessitam para arregaçarem as mangas, desenvolverem o país e levarem uma vida verdadeiramente humana: alimento, vestuário, casa, direito de escolher livremente o estado de vida e de constituir família, direito à educação, à saúde, ao trabalho, ao respeito e à protecção da sua vida.

Fonte: http://www.angolainterrogada.blogspot.com/