Lisboa -  O episódio da anulação da atribuição a Viriato da Cruz do Prémio Nacional de Cultura 2009, categoria de Literatura, causou mal estar no regime, em especial entre dirigentes do MPLA apontados como históricos; José Eduardo dos Santos (JES) é a figura mais fustigada pelos descontentes.


Fonte: AM

Caso Premio Nacional da Cultura e Viriato da Cruz


JES foi, de facto, a entidade que originalmente se opôs à escolha de Viriato da Cruz, numa atitude formalmente baseada no incumprimento de uma disposição do regulamento do prémio e por questões de princípio como a não atribuição prévia do mesmo a Agostinho Neto – mas, inferidamente, também, por razões políticas.

 

Viriato da Cruz, principal inspirador, fundador e primeiro líder do MPLA, passou à condição de proscrito no seguimento de um processo político que o opôs a Agostinho Neto, já no exercício da liderança. Foi poeta de mérito. Morreu na China, no princípio da década de 70; só há cerca de 10 anos as suas ossadas foram trasladadas para Angola.

 

2 . O Prémio de 2007, atribuído a Paula Tavares, também mereceu reacção negativa de JES; escusou-se, então, a estar presente numa sessão do Conselho de Ministros de cuja agenda o assunto fazia parte. Justificou a atitude com a alegação de que a contemplada tinha uma conduta maldizente em relação a si próprio.

 


O Prémio Nacional de Cultura, que tem diferentes modalidades, é organizado pelo Ministério da Cultura. A sua atribuição é, porém, da responsabilidade de um júri independente, de cujas decisões não cabe recurso. Ao Governo cabe apenas providenciar as verbas correspondentes ao valor pecuniário dos prémios, sendo esta a razão pela qual o assunto é levado a Conselho de Ministros.


O mal estar a que o a atribuição do Prémio 2009 deu azo também atingiu a ministra da Cultura, Rosa Cruz e Silva. Depois de uma atitude descrita como “entusiasta” da decisão inicial do júri, mudou de posição após audiência para que fora entretanto convocada pelo PR.


Ante o mesmo júri que, com a sua aprovação, escolhera Viriato da Cruz, passou a defender que o Prémio 2009 deveria ser conferido ao escritor e jornalista João Melo, como de facto aconteceu. Nos termos do regulamento o prémio não pode ser atribuído postumamente a alguém cujo passamento tenha ocorrido em data anterior ao ano em apreço.


3 . Na audiência para a qual a convocou, JES perguntou à ministra da Cultura se tinha ouvido previamente o partido (MPLA) acerca da decisão que, a título póstumo, contemplava Viriato da Cruz; ante uma resposta negativa, sugeriu-lhe que o fizesse, ainda que a posteriori.

 

Em meios conhecedores do inside do assunto circula uma versão segundo a qual JES já teria então dado instruções ao SG do partido, Dino Matross, no sentido de persuadir a ministra a emendar a decisão. Com tal procedimento terá procurado evitar vir a ser directamente ligado à decisão final.

 

Dino Matross acatou a instrução de JES; justificou a “inoportunidade” da atribuição do Prémio 2009 a Viriato da Cruz com argumentos formais e de princípio, evitando os de natureza política. Contou com o apoio de dirigentes presentes, entre os quais Magalhães Paiva “Nvunda”, mas não de Paulo Jorge e João Martins.