WASHINGTON — "A situação dos direitos humanos em Angola está pior", disse à Voz da América a investigadora sénior da Human Rights Watch (HRW), que nesta segunda-feira, 7, divulgou uma investigação na qual diz que as forças de segurança angolanas cometeram mais de uma dúzia de execuções ilegais, bem como vários outros abusos graves contra ativistas políticos e manifestantes pacíficos desde Janeiro de 2023.

Fonte: VOA

"O Governo deve garantir a realização de investigações urgentes, imparciais e transparentes às alegadas violações de direitos e aplicar sanções adequadas ou levar a tribunal os membros das forças de segurança responsáveis", continua a HRW, que lembra que "há décadas que as forças de segurança angolanas violam estes direitos fundamentais, cometendo execuções extrajudiciais e outros homicídios ilegais, fazendo uso de força excessiva e desnecessária contra manifestantes, bem como perseguindo, detendo arbitrariamente e mantendo na prisão ativistas da oposição.


Zenada Machado afirma que "no tempo do Presidente José Eduardo dos Santos estávamos habituados a um regime de um ditador, opressivo, mas com o Presidente João Lourenço tínhamos expectativas muito altas de que ele iria melhorar essa situação porque estava má", situação que não melhorou apesar de pequenas medidas nomeadamente ao nível da introdução da disciplina dos Direitos Humanos na formação das forças de segurança e algum trabalho com organizações não governamentais na matéria.


Aquela investigadora sénior reitera que Lourenço "estava consciente dos problemas dos direitos humanos que o país tinha, entre eles nas forças de defesa e segurança, e até agora, no segundo mandato, não introduziu mudanças significativas, nem avançou o processo de reabilitação das Forças Armadas".


Na investigação, a HRW escreve que "foram implicados membros da Polícia Nacional de Angola e do seu Serviço de Investigação Criminal, bem como do Serviço de Segurança e Inteligência do Estado, na execução ilegal de pelo menos 15 pessoas, bem como na detenção arbitrária de centenas de outras pessoas".

Entre as vítimas estão ativistas sociais e políticos, artistas que criticam abertamente o Governo e manifestantes que organizaram ou participaram em atividades antigovernamentais pacíficas em todo o país.


Machado sublinha que a "polícia angolana visa quem se pronuncia contra as políticas do Governo”, como prova o documento.

A HRW entrevistou, de Janeiro a esta parte, 32 pessoas por telefone, incluindo vítimas de abusos e familiares das mesmas, testemunhas e fontes de segurança em Luanda, a capital, bem como em Cabinda e Bié.

Nos muitos casos citados, a organização escreve que, em Fevereiro, homens que se identificaram como membros do Serviço de Investigação Criminal detiveram um grupo de jovens cujos corpos foram encontrados três dias depois, na morgue de um hospital em Luanda.


"Um amigo das vítimas, de 24 anos, disse que os agentes estavam a vigiar o grupo, conhecido por participar em vários protestos contra o Governo em diferentes partes da cidade.

“Já sabia que eles [a polícia] não gostavam de nós”, disse, concluindo, "as nunca imaginei que pudessem matar".

Deveres assumidos pelo Estado angolano não cumpridos

A polícia deteve o rapper ativista conhecido como Kamesu Voz Seca, que esteve cinco dias na prisão sem nenhuma acusação, após o carro dele ter sido parado num bloqueio policial noturno, em Luanda, e agentes da polícia terem encontrado panfletos com “Fora, Presidente” e mensagens semelhantes.


"Angola tem de investigar a morte dos manifestantes no Huambo", diz Human Rights Watch
A HRW destaca que o "Governo de Angola tem a obrigação de respeitar os direitos humanos à vida, à liberdade de expressão, reunião pacífica e associação, garantidos pela Constituição de Angola, bem como pelos tratados internacionais de direitos humanos que Angola ratificou, incluindo a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos".

No entanto, continua a organização de defesa dos direitos humanos, "há décadas que as forças de segurança angolanas violam estes direitos fundamentais, cometendo execuções extrajudiciais e outros homicídios ilegais, fazendo uso de força excessiva e desnecessária contra manifestantes, bem como perseguindo, detendo arbitrariamente e mantendo na prisão ativistas da oposição".

Apelos e falta de cumprimento de promessas

No capítulo das execuções ilegais, a HRW acusa a polícia de estar "implicada em vários casos de execuções extrajudiciais" e documentou vários casos entre Janeiro e Junho que "resultaram na alegada execução ilegal de pelo menos 15 pessoas desarmadas".


Situação de direitos humanos em Angola foi "terrível" em 2022, diz Amnistia Internacional


No documento, a organização apela ao Governo a "adotar urgentemente reformas concretas e significativas à conduta e supervisão da polícia, para promover o pleno respeito pelos direitos humanos e o Estado de direito" e exorta a comunidade internacional, incluindo a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, a União Africana, a União Europeia e as Nações Unidas a pedirem ao "Governo angolano, tanto em público como em privado, a responsabilizar os autores destes abusos".

Em jeito de conclusão e recomendação, a HRW pede ao Governo que mande "investigar imediata e imparcialmente todas as alegações de uso excessivo e ilícito de força e outras violações de direitos humanos por agentes da polícia, militares e outros oficiais do Estado e levar todos os responsáveis a prestar contas em julgamentos públicos e justos", bem como am adotar "reformas concretas e significativas à conduta e supervisão da polícia, para promover o pleno respeito pelos direitos humanos e o Estado de direito".

Na conversa com a Voz da América, Zenaida Machado afirma haver um canal aberto com o Governo angolano, através de visitas, de alto nível no passado, e contactos permanentes.

Como revela o documento, o Executivo justifica algumas ações e refuta acusações de outras, mas, concluiu aquela investigadora sénior da HRW, "tivemos do Governo angolano a promessa de que esses casos que fossem bem documentados e expostos seriam investigados, mas não vimos desenvolvimento desde a última reunião".