Lisboa - As revelações feitas no primeiro semestre deste ano pelo antigo comandante da Polícia Nacional, Paulo de Almeida, ao "Novo Jornal", detalhando a forma como supostamente foi humilhado ao ser exonerado sem prévio aviso, continuam a merecer atenção na sociedade angolana. Sobressaem críticas às alegadas lacunas no "modus operandi" de João Lourenço em relação aos seus colegas, que, em alguns casos, resultam na marginalização dos visados. Diz-se que José Eduardo dos Santos, o seu antecessor, fazia quase a mesma coisa (exoneração sem aviso), mas nunca ao ponto de levar um governante a pegar numa arma de fogo para dar um tiro.

Fonte: Club-k.net

Essa conclusão baseia-se nas exonerações mais mediáticas realizadas por João Lourenço, que causaram ressentimentos tanto no executivo quanto no próprio partido no poder. O Club-K fez um levantamento de algumas exonerações mediáticas que merecem atenção durante o mandato de Lourenço.

A saber:

CONGRESSO DE 2018 - No congresso extraordinário que visou "resolver" a questão da liderança do partido, João Lourenço afastou figuras históricas sem sequer comunicar previamente ou, pelo menos, enviar um emissário para abordá-los. Eram veteranos que, meses antes, subscreveram uma carta convidando José Eduardo dos Santos a ceder a liderança do partido a favor de JL. Entre os veteranos subscritores da carta estavam os generais Dino Matross, Petroff e França Ndalu. Magoado, este último renunciou ao seu assento no parlamento e foi viver em Portugal.

 

ALVARO BOAVIDA NETO – Depois de ter afirmado publicamente que nunca "estaria contra o camarada José Eduardo dos Santos", este dirigente do MPLA foi castigado. João Lourenço, o novo líder, realizou um congresso extraordinário para afastar Boavida Neto. Na sua qualidade de Secretário Geral, Boavida Neto organizou esse congresso em 2019, e no dia "D", foi proibido de participar no ato que ele próprio estava a organizar. Desde então, manifestou desapontamento com a deselegância de JL.

 

TCHIZÉ DOS SANTOS - Em intervenções públicas, acusa o líder do seu partido de perseguição política e de a ter desalojado do parlamento e do Comité Central de forma "injustificada", sem nunca ter sido ouvida.

 

MARCOLINO MOCO - Exonerado em Fevereiro de 2021 do cargo de administrador da Sonangol, este antigo Secretário-Geral do MPLA revelou à agência Lusa que soube da sua exoneração pela televisão, dias depois de ter escrito no Facebook críticas sobre a forma como os órgãos de comunicação social tratam os líderes da oposição.

 

CÂNDIDA TEIXEIRA – Terá sido exonerada sem prévio aviso do cargo de ministra da educação. Desagradou-se e foi ter com João Lourenço, de quem tem boas relações, tendo este garantido que a tornaria na próxima embaixadora de Angola em Cuba, o que foi efetivado.

 

FERNANDO HEITOR – Em 2021, revelou durante uma entrevista que estava em missão de serviço na província do Huambo quando soube da sua exoneração do cargo de administrador do BPC, um ato que considerou "arrogante". "Eu não fui exonerado do BPC, fui pontapeado", disse o antigo deputado da UNITA que, em 2017, se distanciou do seu partido para dar o voto de confiança a João Lourenço, a quem agradeceu publicamente pelo novo cargo após o pleito de 2017.

 

JOSÉ FERNANDES GUERREIRO - Foi presidente do conselho de administração da Televisão Pública de Angola (TPA), de onde saiu após 11 meses, porque, segundo revelou em suas memórias citadas pelo portal Telegrama, "o Presidente João Lourenço não gostou de uma reportagem exibida" pelo canal público "sobre o combate à corrupção". Na altura o ministro da comunicação social era João Melo. Guerreiro conta que tudo parecia andar numa perfeição, quando, às 19h45, do dia 15 de Outubro de 2018, momento em que se preparava para jantar, é convocado pelo ministro Melo para uma reunião de emergência na sede da estação televisiva. No encontro, juntou-se Francisco Mendes, então administrador de conteúdos (o mais directo e alto responsável editorial do Telejornal), que tinha acabado de chegar do Palácio. Colocado numa situação complicadíssima, onde a sua opinião não foi dita nem achada, a João Melo coube apenas o papel de mensageiro, informando “que o Senhor Presidente João Lourenço comunicara, no final de uma reunião convocada com alguns Ministros, para outros efeitos, que dera instruções para que eu fosse exonerado”. “O que ele, Ministro, teria depreendido das parcas palavras que ouviu do Senhor Presidente a propósito é que estaria descontente com uma reportagem exibida no Telejornal da TPA no dia anterior, relativa ao combate à corrupção”, descreveu José Guerreiro, citado pelo Telegrama.

 

JOÃO ANIBAL MELO – Na manhã de 28 de outubro de 2019, foi visto no palácio presidencial reunido com o staff do Presidente João Lourenço. Falaram e sorriram, mas não imaginavam que naquela mesma noite o noticiário da TPA anunciaria sua exoneração. Recorreu ao Twitter, transmitindo que "deixei de ser ministro. Vou ser o que realmente sou: jornalista, escritor e professor." Fontes do Club-K, explicaram que JL tinha reservas antigas  para com  JM, porem devido ao bom trabalho que este teve na campanha eleitoral de 2017, alguns amigos convenceram o novo líder  a considerar este antigo deputado a fazer parte do governo.  Certo dia JL terá  reclamado  que João Melo “não mudou” e o exonerou do cargo de ministro. 

 

CELSO DOMINGOS JOSÉ MALAVOLONEKE – Exercia o cargo de Secretário de Estado do Ministério da Comunicação Social. Em finais de março de 2020, foi exonerado após o Ministro do Interior, Eugenio Cesar Laborinho, queixar-se ao Presidente da República de que Malavoloneke havia criticado nas redes sociais o comportamento da sua filha Chelsea Laborinho em relação às medidas de precaução do COVID-19. Em menos de 20 dias, isto é aos 6 de Abril daquele mesmo ano, o PR – por via do despacho 90/20, exonerou Celso Malavoloneke do governo.

 

EXALGINA RENÉE VICENTE OLAVO GAMBÔA – Em fevereiro de 2022, o Chefe de Estado convidou-a a apresentar uma carta de demissão na sequência de denúncias de dois ministros sobre a sua gestão. O seu afastamento resultou em atos constrangedores, incluindo uma acusação pública por parte de João Lourenço. Foi constituída arguida, teve os guardas retirados antes do prazo e recebeu ordem de despejo, além do corte de salário.

 

MANUEL TAVARES DE ALMEIDA - Antigo Ministro das Obras Públicas e afilhado de casamento de João Lourenço, foi exonerado por alegados abusos de confiança ao Presidente. Era dado como faltando respeito aos ministros e a outros quadros do regime. Lourenço o exonerou sem aviso prévio, após constatar alegados gastos excessivos em estradas que não se traduziram em trabalho.


MANUEL DOMINGOS AUGUSTO - Era Ministro das Relações Exteriores e passou a ser o governante não adstrito ao gabinete presidencial que mais privava com João Lourenço. Surgiram intrigas e reclamações de que estava a extrapolar. Numa tarde de sábado, almoçou com o Presidente da República. Porém, na segunda-feira, aos 7 de Abril de 2020, foi exonerado. A inesperada exoneração aconteceu depois de ter participado na tarde do mesmo dia, numa videoconferência do conselho de ministros da Comunidade do Desenvolvimento da África Austral – SADC que abordava a questão do Covid-19. Foi posteriormente reabilitado como Secretario das relações exteriores do BP do MPLA e deputado à Assembleia Nacional.


VICTORIA FRANCISCO CORREIA DA CONCEIÇÃO - Em janeiro de 2019, esta antiga Ministra da Família deu-se um tiro na barriga após saber da sua exoneração pela televisão. A arma utilizada teria sido retirada do guarda da casa.