Luanda - O caro leitor entra para um site de notícias, daqueles que lhe dão a possibilidade de comentar, como o Angonotícias ou o Club-K. Vê uma notícia que lhe desagrada. Vai para os comentários e começa a desancar o autor do artigo ou a pessoa referida na notícia. Chama-lhe todos os nomes feios que lhe ocorrem e envia o comentário. Corajoso, né? Nem por isso.

Fonte: SA


É que na parte identificativa você não escreveu nada. Ou escreveu «Anónimo». Por outras palavras, você escreveu o que escreveu porque sabia que ninguém saberia que foi você o autor. Doutra forma, provavelmente não o faria. E isso, caros leitores, não é coragem, nem exercício de democracia: É cobardia pura e simples.

 

O jornalismo do Séc. XXI impõe-nos um tremendo desafio ético e moral. Com as novas tecnologias, a Informação tornou-se totalmente democrática. Todos nós, com um simples celular, para não falar de um computador, tornámo-nos em emissores que atingem massas de gente, uma coisa que antes só os jornalistas e os meios de comunicação social podiam fazer. Com uma simples SMS, ou com o repasse de um e-mail atingimos em tempo real qualquer ponto deste Planeta que desta forma transformou-se numa mesma aldeia global. Dali que, é cada vez mais fácil sujar a imagem de alguém, atingimo-lo com insultos, invadir a sua privacidade, etc etc. caso para dizer que a democratização da Informação, uma das maiores conquistas humanas de todos os tempos, vira-se contra nós…

 


Vêm-me estas reflexões a propósito das reacções dos internautas comentadores aos meus dois últimos artigos, um sobre a família Pinto de Andrade e outro sobre a soltura de Quina da Silva. Compreendo que seja Rui Pinto de Andrade, seja Quina da Silva não colha as simpatias de uns e outros. Mas que pelo facto de um artigo falar favoravelmente deles sejam vilipendiados como foram e o autor do artigo – eu no caso – seja apodado com toda uma gama de epítetos menos simpáticos – de bajulador a bêbado, passando por outros do mesmo cariz – isso não só não concordo como denuncio como um dos males que os mesmos internautas dizem querer combater.

 

Explico-me: nenhum dos internautas identificou-se. Logo, não foram intelectualmente honestos. Ora, quem nos garante que quem age a coberto da sombra do anonimato para atingir outrem não vai roubar quando pense que ninguém o está a ver e se para isso tiver ocasião? Quem nos garante que alguém que insulta outro a coberto dessa mesma sombra não vai arremessar polícias e soldados contra populações pacíficas se se lhe der azo para isso? Alguém alguma vez viu uma pessoa honesta a esconder-se dos outros? Quem se esconde? Os que devem e temem…

 

E são esses internautas que se assumem como os paladinos da democracia. Tudo bem. Mas escondem-se no anonimato porquê? Eventualmente porque têm medo. Medo de quê? Daqueles corajosos que põem o seu parco saber ao serviço da Nação e têm a honestidade de dar a cara e assinar por baixo? Será que estes também não têm medo de morrer numa esquina qualquer, ou de ser-lhe negada qualquer uma oportunidade, ou de ser mal interpretado ou qualquer dessas coisas que «acontecem» a quem dá a cara e diz algumas verdades incómodas…?

 

Um outro sinal do cinismo a que os internautas devem evitar sucumbir é o preconceito e a parcialidade nas análises. Um analista honesto não se pronuncia em função dos seus gostos, convicções, credo, género ou afins. Fá-lo aplicando com o maior rigor possível um conjunto de critérios objectivos que o levam a conclusões muitas vezes contrárias às suas próprias convicções. A preocupação de um analista comprometido com a sua sociedade é ser sempre positivo e contribuir a todo o momento para a harmonia social. Por isso muita gente – incluindo os meus alunos – dizem que não compreendem como numa análise teço críticas ao regime e noutro o elogio. Explico nessas alturas que não compete a mim ou a qualquer outro analista julgar o regime. Isso cabe à Oposição, e os que assim fazem não são analistas. São activistas.

 

O que compete a um analista é aferir de um determinado acto, ou de um determinado momento que a sociedade atravessa e procurar honestamente fazer uma leitura dos sinais dos tempos para aduzir conclusões que ajudem os seus concidadãos a compreender melhor os factos em análise. Dali que defenda que estão redondamente enganados aqueles que acham que uma «boa análise» é apenas aquela que aponta as falhas do regime ou o inverso. Esse é um preconceito que, na minha opinião está por trás do aforismo que «a media pública só deve falar bem do regime e a media privada falar mal dele». Preconceito nocivo para o exercício de um bom jornalismo, ele é sobretudo prejudicial para a reconciliação que se quer entre todos os angolanos.

 

Uma última questão que todos devemos dominar, caso queiramos entrar nesse mundo que é o jornalismo, mesmo como simples comentadores: Um artigo de análise é uma coisa – como aquele dos Pinto de Andrade – e um testemunho, como foi aquele sobre Quina da Silva é outro. O primeiro é resultado da tal análise dos factos em referência e o segundo é a exposição de uma opinião pessoal. Um tenta ser objectivo e o outro é emocional. Ninguém tem que concordar ou discordar; apenas digo que fiquei contente e porquê.

 

E daqui deste «Meu Canto» vai mais um recadinho aos paladinos da nossa democracia: se vocês ficam furibundos porque alguém tem opinião diferente da vossa, qual é então a diferença entre vocês e os que censuram jornais e maltratam os jornalistas? Se você chamam bêbado a quem diz que tem consideração por alguém que vocês não gostam, qual é a diferença entre vocês e os que criam as Tchavolas e mandam a PIR contra as zungueiras?


Para mim, não há diferença. E o anonimato atrás do qual quase todos se escudam é igual ao Poder atrás do qual estes tais – os causadores das Tchavolas e quejandos – também se escudam. A intolerância é igual, a arrogância é igual.


Caso para dizer: Anonimato… que beleza! Beleza para quem, pergunto eu…?