Luanda - A ministra da Comunicação Social, Carolina Cerqueira (na foto), disse em entrevista ao «Novo Jornal», em Luanda, que o seu Ministério não dá autorização a muitos pedidos de abertura de televisão e rádio porque mostram à partida incapacidade para sobreviver.


Fonte: Novo Jornal

 

Foi nomeada em Fevereiro deste ano. Como é que encontrou a casa?
Em primeiro lugar gostaria de agradecer ao Novo Jornal pela oportunidade que me dá. Ser ministra da Comunicação Social da III República é um desafio novo, uma missão que me foi entregue superiormente e que espero cumprir com zelo, dedicação e com rigor para o desenvolvimento da estratégia do Governo em relação ao sector para os próximos três anos.


É a quinta titular desta pasta desde que foi criada em 1991, mas, a primeira mulher. Vai fazer a diferença?
O facto de ser mulher entusiasma grande parte da população, porque nós, as mulheres, somos sempre conotadas com outras valências, às vezes, ligadas a uma maior sensibilidade. Eu vejo este cargo com grande responsabilidade, uma área estratégica no panorama político do país. Sou uma mulher de convicções fortes, que valoriza o diálogo, o equilíbrio e a procura de soluções para questões difíceis. Aceitei o desafio como mais uma meta na minha vida, mais uma missão a cumprir com a mesma humildade e dedicação que tenho vindo a cultivar.


Antes de chegar ao Ministério, estava na Assembleia Nacional como deputada e presidente da 9.ª comissão da Assembleia Nacional. O que é mais difícil? Ser deputada ou ministra?
Eu digo sempre que são tarefas distintas. A missão no Parlamento deume uma visão mais ampla, é uma actividade mais ligada à fiscalização dos actos do Governo, ao contacto com a população. O privilégio que tive em trabalhar como presidente da nona comissão (Direitos Humanos, Petições, Reclamações e Sugestões dos Cidadãos) permitiu que ganhasse muita experiência. Saber ouvir e ajudar a resolver problemas. Aqui no Ministério da Comunicação Social encontrei mais trabalho, mais dificuldades, mais problemas, mais desafios e, sobretudo, maior necessidade de me entregar com mais dedicação a questões específicas e problemáticas, porque somos o principal instrumento de informar e recrear. De fazer apanágio dos valores morais, cívicos e ambientais.


Qual é a leitura que faz sobre a Comunicação Social, em 35 anos de independência do país?
Nós pensamos que a comunicação social tem vindo a crescer. Eu entrei na comunicação social, há muito anos. Era muito jovem. Tínhamos muitas dificuldades, muitas limitações naquela altura. Não havia jornais, televisão nem rádios privadas e tínhamos poucas oportunidades para a formação. Hoje temos um panorama de abertura da comunicação social. Temos uma comunicação social que nos transporta para a mudança e pensamos que a formação dos nossos jornalistas em vários níveis mostra que o mundo da comunicação social é um mundo em pleno desenvolvimento, em plena mutação, na qual são chamados os jovens para darem o seu contributo e criar uma comunicação social forte, isenta e aberta para o mundo.


A Lei de Imprensa já foi aprovada há quatros anos, mas, até agora, não está regulamentada. Porquê?
Consideramos que a regulamentação da Lei de Imprensa e Radiodifusão são premissas importantes para garantir a existência de legislação e regulamentação adequada, actualizada e coerente com a missão e objectivo da comunicação social, que dê resposta aos objectivos constitucionais. Com vista a conformar a legislação vigente ao actual modelo constitucional, nós constituímos grupos de trabalhos de jornalistas, não só dos órgãos públicos, mas como dos privados e das associações dos jornalistas e do Conselho Nacional de Comunicação Social, para darem o seu contributo na adequação dos projectos-de-Lei existentes. Remetemos ao Conselho de Ministros, estamos à espera que sejam agendados para serem aprovados.


Não há um horizonte definido?
A agenda do Conselho de Ministros está muito sobrecarregada. Tão logo seja possível estes projectos leis serão analisados.


Diz-se que a TV Zimbo se encontra em situação de ilegalidade, por começar a emitir numa altura em que a lei de televisão ainda não está regulamentada...
Eu ouvi os comentários, mas a TV Zimbo não está em situação de ilegalidade,
até porque estão a emitir. Eles apresentaram toda a documentação necessária e nós autorizámos.


Mas há mais pedido de abertura de televisões privadas?
Há, mas nós deixámos de conceder autorização para determinados casos, porque para abrir uma televisão privada é preciso determinados requisitos. É preciso recursos financeiros e quadros especializados. A televisão é cara. Para manter uma televisão no ar são necessários muitos recursos.


Mas isso não tem nada a ver com a regulamentação da lei...
Claro que não, mas as rádios e televisões privadas têm que responder a determinados preceitos. Infelizmente, dos pedidos que estão aqui no Ministério e que nós analisámos, não têm capacidade de sobreviver, não respondem aos preceitos que estão estabelecidos. Por exemplo, o tipo de nome que é dado à televisão, os planos editoriais que nos apresentam, que não são aliciantes nem abrangentes, e pela falta de capacidade financeira. Mas temos dado autorização para revistas e jornais. Em relação à rádio e televisão, são interesse do Estado que devem ser precavidos. Tem que haver um tratamento diferenciado. Por exemplo, as televisões públicas têm que corresponder aos interesses do Estado, como a soberania do próprio Estado.


A Igreja Universal do Reino de Deus também fez um pedido para abertura de uma televisão...
Peço que tenham calma, porque no momento oportuno vão saber quais são os pedidos que nós tempos para abertura de rádios e televisões.


Como é que vão funcionar os recém- empossados conselhos de administração das empresas públicas de comunicação social?
Gostaria de referir que os conselhos de administração que mereceram aprovação do Conselho de Ministros, na sua sessão do dia 29 de Outubro, foram nomeados posteriormente por despacho do Chefe do Executivo e tomaram posse no dia 5 do mês de Novembro, representam o primado de um exercício levado a cabo pela primeira vez, nos termos de comunicação social no nosso país. Porque são órgãos directivos colegiais que são chamados a executar práticas de gestão profissionais. Garantir a rentabilidade e a sustentabilidade das empresas, desenvolver soluções para melhoria das mesmas, evidenciando metas a atingir com base em resultados para o sector da comunicação social, que permitam a elaboração de planos e programas para progressiva actualização tecnológica e a melhoria do funcionamento das empresas públicas do sector.


Como vão funcionar?
São sete membros executivos, um presidente do conselho de administração e dois membros não executivos. Já foram aprovado os estatutos orgânicos. Cada um dos administradores deverá responder especificamente pelas suas áreas. Estamos a pensar em áreas ligadas ao marketing comercial, à administração e finanças, recursos humanos. Mas, cada conselho de administração terá que criar a sua própria estrutura de trabalho, que responda ao compromisso com o Estado.


Também terão influência nas linhas editoriais?
Claro que sim. Há uma linha editorial a ser protegida e melhorada. Eles estão lá para trabalhar, para melhorar a vida das empresas, não só do ponto de vista de gestão, saneamento financeiro, operacionalidade, mas, sobretudo, na valorização do jornalismo.


Diz-se, ainda, que o número de membros é elevado e que desta forma os conselhos serão inoperantes?
Temos nove membros. Vocês não podem esquecer-se que as empresas da comunicação social são empresas estratégicas, de grande dimensão, de projecção nacional. Nós temos rádios nas províncias, temos rádios municipais, temos o centro emissor da TPA; o jornal de Angola está em todo o país, a Angop está projectada a nível nacional e internacional. Portanto, são empresas que justificam que tenham conselhos de administração com este modelo. Há conselhos de administração que tem nove membros mais dois. Estas empresas têm muitos trabalhadores, pelo menos, numa primeira fase para reorganizar. O volume de problemas também justifica este modelo.


Qual é o papel dos administradores não executivos?
São consultores, ou, digamos, conselheiros das empresas, não têm direito a voto, mas tem um papel importante devido à sua experiência.


O mandato é de quantos anos?
Três anos.


A ministra leu as cartas abertas, e anónimas, dirigidas a si, e publicadas no site Club K, que davam conta de problemas de gestão nas empresas públicas de comunicação social?
Não leio o Club K. Eu visitei as empresas públicas, fiz diagnósticos e vi que era urgente uma intervenção directa. Era preciso fazer um saneamento económico e financeiro destas empresas. Era necessário melhorar o estatuto dos trabalhadores, a situação laboral, a situação da segurança social, problemas que quase todas as empresas têm, questões de salários. Problemas ligados à saúde ou a incentivos que, muitas vezes, não eram concedidos. Trabalhamos directamente com as empresas, no caso particular da Rádio Nacional de Angola.


O que a imprensa privada pode esperar de si?
O Ministério da Comunicação Social tem estado aberto para dar apoio a iniciativas da imprensa privada. Temos apoiado actividades do Sindicatos dos Jornalistas Angolanos, Associação de Mulheres Jornalistas, União dos Jornalistas Angolanos. Estamos a materializar o princípio da parceria, apoio e encorajamento da actividade privada da comunicação social.


A Lei obriga as empresas, públicas e privadas, a divulgar num jornal de expansão nacional as suas contas anuais, mas isso não se faz. Quer comentar?
É urgente criar uma mentalidade de rigor e de profissionalismo na gestão das empresas públicas. Tem que haver uma boa gestão, fazer prevalecer o princípio da transparência e da prestação de contas.


A Lei proíbe, ainda, a concentra- ção de empresas de comunicação social numa só entidade de modo a evitar monopólios e pôr em causa o pluralismo da nformação. Como encarou aquisição dos jornais o A capital e Semanário Angolense?
A lei de imprensa está a ser adequada à nova Constituição. Vamos esperar que a lei seja regulamentada em relação a estas questões. A lei vai decidir quais são os procedimentos que serão acautelados.


A senhora ministra falou muito das rádios comunitárias na reunião da SABA...
A criação das rádios comunitárias devem ser encorajadas, tendo como principal matriz o desenvolvimento. As rádios comunitárias têm o papel de aconselhar os agricultores e outras pessoas sobre os problemas existentes numa determinada comunidade. Devem promover a cultura, o desporto e outras preocupações nacionais. As rádios comunitárias, televisão e jornais comunitários, que vamos ajudar a criar, devem ter uma participação activa na construção de sociedades mais justas, capacitando e dando voz ao seu público.


Sabe-se que o país, através do seu ministério, vai ajudar a Televisão da Guiné-Bissau a resolver os problemas que a obrigaram a encerrar. Em que pé se encontra esta acção?
Enviámos uma equipa de técnicos para fazer avaliação da actual situ- ação da televisão da Guiné-Bissau, que tem muitas dificuldades, e vamos ver as possibilidades de poder ajudar o povo guineense.


O que tem a dizer sobre a formação dos jornalistas fora de Luanda?
Sempre defendi que a formação de quadros é suporte essencial para um jornalismo de excelência e de investigação. Posso afirmar que desde Fevereiro até agora realizámos mais de 20 cursos. Estes cursos não foram apenas para os jornalistas dos órgãos públicos, mas também para os privados. Participaram também jornalistas de outras províncias. Notava-se que havia uma grande ausência de jornalistas mulheres, tantos nas coberturas jornalísticas como nos cursos. Estabeleci quotas para as mulheres. Nós temos perspectivas de formar jornalistas na Universidade Anhembi Murombi, de São Paulo/Brasil, já mandámos jornalistas fazer cursos de superação no Instituto Galileu, em Israel. Visitarei nos próximos tempos Portugal e espero aí estabelecer cooperação a nível de formação dos jornalistas angolanos.


E a construção da escola de jornalismo do Huambo...
Está nas prioridades de 2011. Ainda estamos na dúvida se vamos designar escola de jornalismo ou de comunicação social, que é muito mais.

TV Zimbo não está em situação de ilegalidade