Luanda -  Comecemos pelo momento político actual, em que se diz e também se escreve que o MPLA está a viver uma quase crise nervosa, por causa do 7 de Março, manifestações da oposição … Não estamos preocupados. Nem pensar. Havíamos de preocupar-nos com umas dezenas de pessoas ?...


Fonte: O Pais

 As pessoas têm o direito de dizer o que pensam

Então o que justifica a contra-manifestação de 5 de Março?

Nós não fizemos nenhuma contramanifestação. Essa é a leitura que algumas pessoas estão a fazer, mas nós não fizemos nenhuma contramanifestação …

 

Mas não estava programada …

Estava. Há muito tempo. Já fizemos outras, como se sabe. Aquela deveria acontecer uma ou duas semanas antes, não a fizemos no momento programado porque a queríamos enquadrar também no âmbito do Congresso da OMA. E seria uma manifestação de apoio à acção governativa, mas decidiu-se pelo lema da paz. Nem vale a pena discutir isso, faz parte do nosso programa, está escrito.


O MPLA tem no seu programa e manifesta-se, mas as críticas que lhe são dirigidas são exactamente porque os governos provinciais, suportados pelo MPLA, impedem a realização de manifestações de outros.

O que se tem de entender é que o MPLA não tem nada a ver com isso, em primeiro lugar. Não é o MPLA quem decide sobre manifestações.

Em segundo lugar, o direito de manifestação é um direito constitucional, inalienável do nosso ponto de vista. As pessoas têm o direito de dizer o que pensam, desde que cumpram as regras. O que se deve é comunicar aos órgãos competentes a pretensão de realizar uma manifestação. Mas há regras.

 

E uma delas diz que as actividades políticas, por exemplo, só se podem realizar até às vinte e duas horas.

Quem cumprir as regras não terá qualquer dificuldade. Nós não temos nada a ver com isso. Julgo é que os decisores sobre estas coisas devem confrontar-se com solicitações que não respeitam as regras. Tenho-o repetido: nós preocupamo-nos com a vida interna do MPLA, a nossa acção, o nosso trabalho, o nosso Executivo.

 

Então porque é que o MPLA se atira com muita força ao secretário-geral da UNITA, Camalata Numa?

Não confundamos as coisas. Uma coisa é o direito à manifestação, outra coisa é a exaltação à insubordinação. São duas coisas diferentes e incompatíveis. Quem é democrata e não sabe diferenciar isso, não sabe o que está a fazer em democracia. As pessoas têm o direito à livre manifestação, mas não têm o direito de ofender ninguém …

 

Uma greve de fome não ofende ninguém …

Mas ele fez alguma greve de fome? Isso é o que vocês dizem, eu não vi greve de fome alguma. Isso é problema vosso que fazem a campanha dele, não é nosso. O que eles fizeram foi uma tentativa de exaltação à insubordinação. E foi contra isso que nós nos manifestámos. Tanto que uma comissão de deputados já esteve no Huambo a fazer um levantamento da situação, esse dossier entrou na comissão competente da Assembleia Nacional. Porque é que as pessoas querem subverter a verdade? Qual é a intenção?

 

Olhando para o actual momento político, acha que a UNITA estaria em condições de ter, pelo menos a veleidade, de incitar a uma insubordinação pública e, por via disso chegar ao poder?

Não. Tomada do poder não …

 

E criar dificuldades ao Executivo?

Mas isso fazem-no permanentemente, não é nada de novo, não é nada que até militantes da UNITA não tenham denunciado. Quem está atento percebeu isso, que houve quem tivesse denunciado algumas acções da UNITA, sendo militante da própria UNITA. Outros, no quadro dessa situação, demarcaram-se da sua direcção, mas isso são problemas da UNITA.

 

Portanto, os últimos problemas do Huambo não são do Numa nem de outro militante, é uma acção partidária superiormente dirigida, é o que diz?

Isso eles é que têm de dizer. Nós vamos constatando, vamos recebendo a informação mas, de resto, não temos nada a ver com isso. O que se tem de perceber é que o MPLA é um partido político e, nessa qualidade, faz a sua acção interna, projecta na sociedade as suas preocupações e o que pretende realizar, por via do Executivo em quem o povo depositou confiança. Isso é o que o MPLA faz e vamos continuar a fazer. Mas estamos atentos a determinados movimentos, e sempre que tivermos matéria de facto viremos a público denunciar. É o que temos vindo a fazer, alertar a sociedade para determinado tipo de comportamento. O resto compete às instâncias do Estado agir, não compete ao MPLA. Se for a uma cadeia na perspectiva de, pelo facto de ser detentor de algum poder político, tirar um indivíduo que cometeu um crime, eu estou a cometer outro crime e a polícia deve exercer o seu papel. E o papel da polícia é deter, em flagrante delito.

 

Estamos num Estado democrático de direito, as pessoas têm de respeitar a lei. E isso não tem nada a ver com o ser membro do bureau político do MPLA ou secretáriogeral da UNITA, somos todos iguais perante a lei e todos temos de nos subordinar a ela.

 

Entretanto houve uma manifestação no último fim-de-semana … como reage quando as pessoas têm necessidade de se manifestar pelo direito de expressão?

Eu acho que as pessoas têm o direito de manifestar aquilo que lhes vai na alma, acho que não temos de ter objecções em relação a isso. Se me perguntasse se eu me revejo naquilo, eu dir-lhe-ia que não. Porque se em Angola não houvesse liberdade de expressão não haveria jornais nem se diria nos jornais aquilo que se diz. Em Angola há muito mais liberdade de expressão, a esse nível, do que existe em muitos países que se dizem democráticos. A questão está no nível das pessoas que o fazem… vir a público ofender outrem, se isso é democracia, então onde começa e termina o respeito pelo próximo, que é também um direito inalienável em democracia? Esses ditos democratas são quem tem de nos explicar como é que eles fazem essa destrinça.

 

Onde é que começa o direito dele e acaba o meu, onde é que começa o meu e acaba o dele. Se eu vier para a rua e disparatar a mãe deste ou daquele e é democracia, quem se revê neste tipo de democracia que o faça.


Só que a lei deve ser exercida, deve ser aplicada.


Bem, ouvindo-o, fica-se com a impressão de estar tudo bem, com os naturais jogos partidários em democracia, mas depois temos personalidades do MPLA a alertar sobre pessoas que eventualmente não estão confortáveis com a paz.

É que se você começa com comportamentos que lesam a personalidade e, pior que isso, lesam a integridade física das pessoas, tem que haver acção, isso não fica assim.

 

Você não pode sair da sua casa, chegar aqui e começar a partir carros porque está em democracia … Como é que o MPLA reage àquilo que parece ser uma estratégia da Oposição e que passa por concentrar a crítica mais no presidente do MPLA que no partido? Separando os corpos …

Nós já conhecemos essa estratégia. O MPLA é um bloco único, nós estamos unidos, essas acções vindas de fora não mexem com a nossa estrutura. Nós vamos continuar a trabalhar, o MPLA está a crescer, e muito, a olhos nus, temos projectos sérios, credíveis e que a sociedade entende como sendo bons e por isso mesmo perfilha-os, é nesse caminho que vamos continuar. Nós não decrescemos, nós crescemos, quem está a decrescer é que entra em pânico.


 

O MPLA vai a congresso já este mês… acha que é uma boa altura? Em pleno Abril, com muitas chuvas e notícias de pontes que cedem, estradas a degradar-se ….

É um bom momento …


Mas é um momento em que a acção governativa pode estar mais sob crítica ….

É bom. Porque, se calhar, se fizéssemos noutra altura esquecíamo-nos que a chuva cria buracos, atira pontes abaixo, que a chuva mata pessoas, que deixa outras ao relento e que é preciso estarmos organizados para fazer face a esse tipo de problemas, que é preciso uma maior capacidade de resposta. O Congresso vai analisar o que foi feito nestes últimos dois anos e vai perspectivar as acções fundamentais que o MPLA entende como sendo prioritárias para o desenvolvimento do país. Vamos analisar, ver os níveis de resolução das propostas que fizemos em 2008, vamos ver formas de incrementar, com mais agilidade ali onde fomos menos felizes …. O congresso vai fazer esse tipo de avaliação, vai projectar o futuro e vamos sair mais coesos e mais organizados, com uma perspectiva muito mais clara sobre o que temos de fazer nos próximos tempos.

 

Mas podemos ter aqui dois planos: um que é partidário, e em dois anos as coisas podem ser mais pacíficas, e outro que o do período legislativo, em que a governação vai a meio do mandato, normalmente este é o ponto de viragem, que os projectos começam a ganhar forma e se começam as inaugurações … tendo havido uma grave crise financeira e económica mundial, o MPLA, projectando até à próxima legislatura, vai dizer à sociedade que trabalhou para suster os efeitos da crise ou que tem obra para mostrar?


Nós não trabalhamos para suster os efeitos da crise. Felizmente nós preparamo-nos antecipadamente para uma eventual crise e, graças a isso, conseguimos manter os níveis de governação mais ou menos bem.

Naturalmente, nas grandes obras houve que fazer alguma contenção e este freio pode levar-nos a não atingir algumas das metas que tínhamos previsto, mas a crise doeu a todos, não foi só aqui. Só estamos mais ou menos bem porque tínhamos reservas para fazer face à crise, se as não tivéssemos teríamos entrado em colapso.


E neste dois anos tivemos também momentos que não foram de muita paz entre o Executivo e o MPLA … Dê exemplos.

O caso das demolições em que membros do MPLA expressaram a sua insatisfação com alguma acção deste género e mais recentemente as notícias da insatisfação com as propostas de alteração das regras e dos valores mínimos para o investimento privado que é uma forma de sacudir a economia e pô-la a andar … Há diferenças na forma como uns e outros pensam que as coisas devem ser realizadas. É natural, num partido como este, detentor de tantos quadros e quadros com tanta valia, que haja gente que pense de maneira díspar. Isso é democrático.

O MPLA também está confrontado com isso. Naturalmente, nós não nos podemos rever em atitudes que possam ter algum excesso, quaisquer que elas sejam e sejam adoptadas por quem quer que seja. No seio do partido nós temos essa capacidade, de dizer que não estamos de acordo com isto ou com aquilo, que não estamos de acordo com esta ou com aquela forma de atingir determinados fins, porque esses fins podem ser atingidos com comportamentos, atitudes e acções diferentes. Isso as pessoas são livres de dizer. O mesmo se põe em relação a alguns projectos de lei … seguramente as pessoas já me ouviram dizer que um dos órgãos em que gosto de estar é o grupo parlamentar do MPLA, é um órgão onde as coisas são profundamente discutidas, onde se percebe bem a existência de correntes de opinião, muitas vezes divergentes, mas sempre com o intuito de se encontrar os grandes consensos. Claro que às vezes são debates acalorados, muito interessantes.


Outras vezes há, e aqui temos de fazer mea-culpa, se calhar, alguma pouca agilidade na transmissão dos objectivos políticos de determinada iniciativa, e se as coisas não forem suficientemente bem esclarecidas é natural que o debate seja ainda mais acalorado. Ele é sempre, mas dependendo dos níveis de informação que os detentores do poder para a análise daquele projecto tenham, este debate é muito mais acalorado. É natural que estas coisas aconteçam. Eu já disse isso numa entrevista: quando o MPLA age em uníssono, para os adversários é porque no MPLA não há democracia, todos dizem a mesma coisa, se dentro do MPLA, e nos fóruns apropriados, alguém se manifesta de forma contrária, é um dilema porque já há alguém disposto a dar um golpe … por amor de Deus, onde é que está, então, a consciência democrática das pessoas?

 

A evolução ideológica do MPLA quebrou a antiga aliança camponesa e operária? Vê-se a Oposição a dirigirse mais ao campo agora …

 Acredita mesmo?

 

Temos Camalata Numa constantemente no Bailundo e arredores, tivemos Isaías Samakuva, o presidente da UNITA, a andar pelas Lundas e Moxico, por estrada…

E acredita nisso? Alguma vez a UNITA fez diferente disso? A UNITA esteve sempre lá e o MPLA ganhou cinco a zero. Esquecem-se disso muito rápido. O MPLA tem, neste momento, 4.8 milhões de militantes. 74% são camponeses …

 

São esses que vêm a carne a ser importada, a tangerina a ser importada …

Eu vou chegar lá. Mas são esses que dão os mais de cinco milhões de votos que o MPLA teve nas eleições. Não foram os intelectuais que ganharam as eleições, foram os operários e foram os camponeses, mas particularmente os camponeses. Está a ver onde está a contradição do raciocínio?

 

Mas o MPLA chega ao governo e as suas políticas ainda não os favorecem …

Porquê que diz isso?


Temos constantemente queixas sobre as importações sem controlo e que os mercados se fecham aos produtos agrícolas angolanos…

Acha que em tão pouco tempo era possível fazer, no âmbito da agricultura, aquilo que são os grandes projectos para o desenvolvimento do país? Acha que poderíamos sair, em tão pouco tempo, da agricultura familiar rudimentar para a agricultura extensiva sem criar os mecanismos de base elementares, sem ter a tecnologia, sem formar as pessoas … acha que isso é assim? Alguém vai chegar e vai soprar numa varinha mágica e temos milhares de hectares de cana? Há um trabalho de base que está a ser feito. E dou-lhe exemplos. Também há coisas muito bonitas que estão a ser feitas neste país e vocês não andam. Vá visitar os projectos agrários no Kwanza Sul, vá ao Lubango para ver o que se está a fazer na horto-fruticultura… um bocadinho por todo este país …. Daqui a pouco tempo vou ter o prazer de lhe dizer ‘vá à Lunda Norte, vá ao Dundo ver o que está a fazer a Granja’ … isso é que vai criar auto-suficiência, são esses projectos.


Temos é que continuar a redinamizar a pequena agricultura, no sentido de manter o nível de vida das pessoas, ir melhorando paulatinamente até que sejamos capazes de ter os níveis de produção que todos almejamos para o curto e médio prazos…


Portanto, as bases no campo não estão mexidas?

Pelo contrário, estão a ser consolidadas. Isso é que traz o pânico a alguns partidos políticos, isso é que traz o pânico. É que eles pensavam que eram os donos daquelas regiões e o MPLA foi lá ganhar cinco a zero. Uma vez disse isso à falecida deputada Anália de Vitória Pereira: enquanto ela se metia no carro para andar pelos bairros a ver onde o MPLA estava a meter a bandeira, nós já tínhamos subido no mastro e tínhamo-la posto. Essa é a diferença. Alguns estão preocupados com o que fazemos porque fazemos, eles têm de se habituar a fazer. Nem neste momento de crise você viu a iniciativa de nenhum outro partido político no sentido de, de forma prática, ajudar os necessitados. Não se viu um único partido político da Oposição a fazer uma campanha de recolha de bens para os necessitados …

 

Não têm dinheiro…

Precisa haver dinheiro para apelarem aos seus militantes para oferecer roupas e bens não perecíveis? É essa a consciência como cidadão? Os partidos políticos não têm apenas de lutar para obter o poder político, têm de mostrar à sociedade que são capazes de exercer o poder político, e o poder político exerce-se resolvendo os problemas das pessoas.

 

E uma das formas de ajudar a resolver os problemas das pessoas é criando leis, regulamentos …. Mesmo para o grupo parlamentar do MPLA. Não se fica com a ideia que a iniciativa legislativa está mais do lado do Executivo que do parlamento?

Onde é que isso não é assim? Dême um exemplo de um país onde o parlamento produza mais que o Executivo, não existe. Eu sou deputado há quase vinte anos, conheço muitos parlamentos, conheço muitos países, a realidade é assim, até nos Estados Unidos da América. A diferença está que sendo nós os detentores do poder político, o Executivo não é uma coisa diferente do MPLA, nós temos camaradas a trabalhar no partido e temos camaradas a trabalhar no Executivo, somos um único corpo. Os camaradas que estão lá (Executivo) mesmo quando têm ideias, passam por aqui.

 

As ideias são trabalhadas aqui e depois são materializadas lá.

 

Isso esvazia um pouco o papel fiscalizador de um parlamento dominado pelo MPLA …

Não. E digo-lhe mais, este grupo parlamentar, e digo-o à vontade, porque internamente as pessoas sabem qual é a minha opinião, o actual grupo parlamentar do MPLA está a produzir mais, e melhor, que o que produzimos na legislatura passada. Já houve muitos projectos de iniciativa do próprio grupo parlamentar, vários.

 

E isso é bom. Mas, tal como quando a iniciativa é do Executivo, a questão é analisada aqui. Quando as iniciativas são daqui elas também passam pelo Executivo, porque tem que haver essa simbiose, essa sincronização na acção, porque nós somos um único corpo que é o MPLA.

 

Este mesmo MPLA que vai a Congresso e que não discutirá, aparentemente, a sua liderança, mas a imprensa vai publicando com insistência dados sobre uma possível renovação em alguns postos, nomeadamente no topo … isso preocupa o MPLA ou é mais conversa externa?

Não é uma questão de preocupação, um partido dinâmico, no seu processo natural vai mudando pessoas no exercício de funções de responsabilidade política. Agora, com os timings que a própria democracia impõe, nós, nesses ciclos, vamos ter que nos ir ajustando em função da realidade de cada momento. Tratando-se de um congresso extraordinário, em princípio não haverá mexidas na direcção superior do partido, nem haverá motivos para que isso aconteça nesta fase …

 

É, portanto, especulação, quando se fala da eventual saída de Roberto de Almeida da vice-presidência?

Eu estou a falar-lhe como porta-voz do MPLA e estou a dizer-lhe aquilo que é a realidade e o que nós estamos a tratar. Não está na agenda do Congresso qualquer eleição de uma nova direcção, pelo menos até este momento. Isso não significa que não possa haver, o próprio Congresso tem essa capacidade.

 

Mas, como lhe digo, pelo menos os órgãos colegiais da direcção superior do partido não se pronunciaram sobre esta matéria. Pelo contrário, quando analisamos o ajustamento da direcção para os próximos desafios, nós entendemos que primeiro deveríamos fazer o Congresso Extraordinário e ser o Congresso a mandatar o Comité Central para agir em conformidade, tratando de todas as questões inerentes à preparação do partido para o próximo pleito eleitoral. Isso implicará a apresentação dos seus candidatos, quer o futuro Presidente da República, o Vice-Presidente da República, os futuros deputados … todos esses assuntos serão tratados, de acordo com o que está decidido até este momento em que estamos a conversar, pelo Comité Central, que tem este mandato estatutário.

 

Há alguém que cita sempre fontes do MPLA, nós somos um partido aberto, as fontes somos nós que estamos aqui e estamos mandatados para falar sobre o partido. Não conhecemos outras fontes. E não estamos nem sequer preocupados com quem queira alimentar este tipo de coisas. A verdade é que não temos nada sobre a mesa para substituir ninguém. Mas, se o Congresso eventualmente chegar a essa conclusão, poder-se-á, eventualmente, fazer aqui ou ali algum ajuste.


Mas ,neste momento, não há nada.

Aliás, mesmo para o Congresso o fazer teria de haver um processo antecedente e nós não estamos a trabalhar nesta matéria.

 

O MPLA realizou um encontro com empresários ligados ao partido …

Ligados ao partido não, nós fizemos com empresários afectos ao MPLA …

 

Mas tendo o MPLA o Executivo, estando a governar nas províncias e a dominar o parlamento, isso não exclui os outros da actividade económica?

Não. Nós temos de ouvir primeiro os nossos camaradas para depois vir para a sociedade, é assim que o partido deve funcionar.

 

Com que impressão ficou, temos um empresariado capaz, ou ….

Temos um empresariado nacional embrionário, com forte tendência a consolidar-se. Precisamos, do ponto de vista da organização do próprio Estado, de trabalhar no sentido de dar um maior conforto a este empresariado, alargar esse empresariado… isso é o que quisemos ouvir das pessoas, porque o que se pretende é alargar a base do nosso empresariado e não olhar a cores partidárias, olhar aos cidadãos como tal. Na distribuição nacional da riqueza não se pode olhar a cores partidárias. Agora, um partido que se preze, responsável, tendo uma base militante tão rica, deve primeiro ouvir essas pessoas, saber o que entendem sobre o alargamento e como se deve fazer, como devermos criar, com as entidades bancárias, um crédito que não seja tão oneroso como temos hoje … ouvir os militantes para depois alargar o debate. O núcleo dirigente do MPLA é constituído por meia dúzia de pessoas, a massa pensante do MPLA não se reduz aos órgãos de direcção do partido, está na base dos seus militantes, temos de os ouvir.

 

Teremos, no pós-congresso, um MPLA mais virado para a produção nacional, com uma aposta forte no empresariado?

É o que se pretende, criar grupos nacionais sólidos para sermos o garante da nossa independência económica. Em todos os estratos e a todos os níveis, desde a micro empresa até aos grande grupos. Foi o que fomos ouvir, falamos com empresários de todos os estratos. A distribuição da riqueza nacional deve ser vista como uma das fórmulas para a dignidade das pessoas. Eu não me sinto inclinado a ser empresário, mas quero viver com dignidade, quero ter esse direito. Penso que devem ser os meus próprios concidadãos, não interessa a cor política, desde que detenham poder económico, devem ser eles a garantir que eu possa ter o mínimo de condições de vida.

 

A Oposição continua a dizer que a Constituição consubstanciou um golpe, para o MPLA é assunto encerrado, haveria coisas a rever, há coisas para se arrepender…?

Arrepender de quê? Nós revemonos na Constituição. Nós jurámos uma Constituição em que nos revemos. Se ainda há coisas para melhorar, nós dissemo-lo antes até de a aprovarmos, porque não há nenhuma Constituição no mundo que seja perfeita, a nossa nunca o seria.

Por mais que tentássemos, haveria sempre, com o decorrer da vida, aspectos a melhorar, a mudar … e isso é o que vai acontecer. Agora, as grandes questões, até as ideológicas, um Estado mais ou menos participativo, mais ou menos interveniente na esfera económica, as questões sociais … nós defendemos o que está na Constituição. Quem pensa o contrário tem um rumo, que é continuar a trabalhar para um dia ter o poder político e poder fazer uma proposta de alteração da Constituição naquelas que são as suas grandes âncoras.

 


Diz que o MPLA vai crescendo e se vai implantando cada vez mais a nível nacional. Se essa implantação se reflectir no número de votos o MPLA poderá, nas próximas eleições, alcançar um resultado superior, ou, pelo menos, igual ao que obteve nas últimas legislativas. Isto, visto do Ocidente, valores altos de reconhecimento, ou de eleição, pelo voto, acaba por criar algum desassossego.

Não se gosta de olhar para outras realidades em que um partido ou uma personalidade ganhe com valores às vezes perto da unanimidade dos votos. O MPLA não teme ser visto com alguma desconfiança?

Nós não temos esse tipo de preocupação. Não estamos preocupados com quem nos quer impor regras democráticas quando não é capaz de o fazer no seu próprio país, onde não é capaz de pôr as pessoas a votar, os governos são votados com trinta por cento do eleitorado total … Nós aqui conseguimos pôr noventa e cinco por cento do total dos eleitores a votar. Esses eleitores dão 81,65% a um partido político e nós temos problemas por isso? Pelo contrário, temos que nos regozijar pelo nível de representação popular que temos, pelo voto popular sólido. E é nisso que continuaremos a trabalhar.

 

As pessoas não gostam de entender que em África os povos são evoluídos, também pensam e têm capacidade de opção, e então entendem que nos podem impor regras. Nós não vamos à Europa ou aos Estados Unidos impor regras a ninguém. Aqui o povo vota com livre consciência. E se nós somos capazes de mobilizar as pessoas para irem votar, eles (Ocidente) deveriam era vir saber como é que o fazemos, que é para aprenderem, serem humildes e deixar de ver isso como um elemento negativo. Eles têm é que vir saber como é que nós trabalhamos para pôr as pessoas a votar. Se calhar ainda não aprenderam, por isso é que lá só trinta por cento dos eleitores é que vão votar. E ficam muito felizes quando atingem os trinta por cento.

 

Temos é de lhes dizer que eles é que têm de vir cá aprender connosco como o fazemos.

Agora, nós trabalhamos no voto garantido. E o voto garantido é o voto militante. Nós não somos um partido eleitoralista, somos um partido de massas, que integra no seu seio operários, camponeses e intelectuais, ao contrário da maior parte dos países europeus. Sabe quantos militantes tem o PSD em Portugal? Trinta e poucos mil. Sabe quantos militantes tem o partido do Paulo Portas (CDS-PP)? Vinte e tal mil militantes. Eu estou a dizer-lhe que nós temos 4.8 milhões de militantes. Não vê diferença nisso? Por isso é que nós temos mais de cinco milhões de votos e eles são eleitos com pouco mais de um milhão de votos, essa é a diferença. Nesse nível não tenho qualquer problema em dizer que estamos à frente deles, estamos mais evoluídos, porque aqui há uma consciência democrática que deve ser respeitada.

 


O cidadão quando vai votar fá-lo de livre consciência, vai por saber que é um direito cívico que lhe assiste. E ele deve, e tem que, do nosso ponto de vista, exercê-lo, não interessa em quem vota, o que interessa é que as pessoas se preocupem, de facto, em exercer o seu direito cívico de eleger os seus representantes. É nisso que a gente trabalha e é isso que eles são incapazes de fazer. Então deixem de nos criticar e melhorem as suas performances. Nós temos de ter orgulho no que fazemos, não temos de nos acanhar porque pusemos seis milhões de pessoas a votar. Temos de ter orgulho e não andar com “encapotamentos” ou com vergonha do número que temos. Temos de ter orgulho de sermos angolanos.