Luanda -  1. O discurso da intolerância política, de tão gasto, parecia já definitivamente enterrado. O exercício de aprofundamento da democracia política em que o país se embrenhou desde a conquista da paz, em 2002, tratou de lançar à terra sementes de novos valores.


Fonte: Jornal de Angola

A renovação do discurso político

O debate político cresceu e está cimentada a ideia do respeito pela opinião diferente. Mesmo nos momentos em que o acirrar dos ânimos dava a entender existirem pessoas predispostas a recorrerem à violência, ao vandalismo, raciocínios e atitudes mais serenas, ponderadas, trataram de separar as águas e situar as coisas no devido lugar. Vandalismo é violência e isso é caso de polícia.


Democracia é o debate de ideias contrárias sem recurso à violência e isso traduz não apenas maturidade política, na medida em que é pressuposto para o reforço da unidade nacional, e hoje, mais do que ontem, é uma realidade que pelo país inteiro os militantes dos diversos partidos políticos – do MPLA, da UNITA, do PRS, da FNLA, do Bloco Democrático, da Nova Democracia e etc. – coexistem de forma pacífica. Quem viaja pelo país pode-se dar conta de aldeias onde as bandeiras das diferentes formações políticas flutuam em mastros improvisados. E faz muito tempo que não tínhamos notícias de casos de intolerância, que só ressurgiram quando “fazedores de má política” se meteram à estrada na boleia das manifestações convocadas via Internet. E pelos vistos mesmo nesse aproveitamento “se deram mal”, porque afinal as contas foram mal feitas. Mas ainda assim e como quem não se dá por vencido, o caso foi levado “um pouco mais a sério”, para contrapor à ameaça de um julgamento ético e consequente punição. Mas, para espanto de todos, afinal as conclusões preliminares estão a mostrar que os cidadãos dados pela UNITA como mortos no Huambo, vítimas da “intolerância política”, encontram-se vivos no Wako Kungo, na província do Kwanza-Sul.

 

Um caso insólito, que mostra que enquanto a UNITA pensa que o país parou no tempo, as outras formações vão renovando o seu discurso político, vão procurando adaptar-se à nova realidade, que exige novas formas de pensar, novas ideias para conquistar o eleitorado e conseguir resultados credíveis. Amarrada ao passado e à espera sempre de um empurrãozinho, não admira que a UNITA invoque, ora sim, ora sim, o argumento de “eleições credíveis”, mesmo quando os números esmagadores não deixam dúvidas sobre as opções claras que estiveram na base da decisão do eleitorado. Entre apostar na estabilidade e recuperação económica firme do país e cair na tentação dos equilíbrios parlamentares susceptíveis de desembocarem em períodos de instabilidade política, a escolha foi clara: não havia mais tempo a perder porque muito já tinha sido adiado. E desse adiamento todo o mundo conhece a história.

 

Ainda que a Comissão Parlamentar de Inquérito só no dia 19 virá a público dar conta do seu trabalho realizado no Huambo, é fácil de adivinhar, em traços gerais, que a conclusão aponta para a dificuldade de a UNITA se adaptar aos métodos de fazer política em democracia, preferindo a vitimização para justificar os maus resultados e ganhar visibilidade.

 

2. As comemorações do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa trouxeram à tona o debate sobre o acesso à Internet e seu uso como veículo de comunicação social. A Internet é realmente um mundo deslumbrante, pela velocidade de comunicação, pelas suas múltiplas potencialidades. Mas é também um mundo onde – e assim se tem igualmente revelado - mais facilmente e de forma profusa determinados direitos são violados. Sou dos que pensam que as tecnologias devem estar ao serviço do homem, e não contra este. Nunca, por isso, aceitei os argumentos segundo os quais “não há legislação, por isso nada se pode fazer”, avançados para justificar a falta de actuação em relação a determinados factos veiculados via Net e que à luz do direito se apresentam como lesivos de interesses de terceiros. Lá diz a máxima que, “se o menos não é permitido, então o mais também não o é”.

 

O exercício da liberdade de expressão não pode ser entendido como algo menos responsável, que não contenda com limites, só pelo facto de ter lugar via Net. Ao mesmo tempo que é de aplaudir a ideia da Internet como “recurso verdadeiramente público e universal”, a visão da sua utilização como factor de/e espaço para o reforço da coesão e tranquilidade social, defesa dos valores cívicos e morais, promoção da cultura e identidade nacionais é um imperativo a não negligenciar, na perspectiva de que, no estágio em que Angola se encontra, pode jogar papel complementar. As novas tecnologias, apesar das suas vantagens, estão longe de ameaçarem de extinção os tradicionais meios de comunicação social.


* DG adjunto do Jornal de Angola