Luanda - Passei alguns dias a ler jornais, revistas e notícias, que foram publicadas durante a minha ausência. Confesso que, se não conhecesse o país e não percebesse o que muitas vezes vai no íntimo de muitos que usam a “pena” ou a “língua” apenas como forma de exorcizar o espírito, ficaria absolutamente convencido que tinha acabado de chegar ao mais horrendo dos espaços planetários, onde “uma dúzia de seres monstruosos abocanharam todos os cordeiros que viviam na imensa planície” e que “já não havendo alternativas, Angola irá sucumbir no virar da primeira esquina”.


Fonte: Jornal de Angola


images/stories/Opiniao/jose%20riberiro_poratl.pngDesde a triste picardia de (alguém que se tem, a ele próprio, como o exemplo perfeito do jornalista que devemos ter) considerar que, pelo facto de o Presidente do Partido da situação ter iniciado a intervenção de encerramento do seu último Congresso, dizendo que, depois de discursos e conclusões tão ricas, tinha ficado sem espaço de manobra para dizer muito mais, se tem de concluir que José Eduardo dos Santos perdeu espaço no seio do seu MPLA (que coisa feia), até a revelação de que o Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, constituída para apuramento da existência, ou não, de intolerância política no Huambo, “não se tem comportado como representante de todos os angolanos”, mas que merece ser saudado pela “coragem política” de reconhecer “o ambiente antidemocrático que se vive” naquela província, tudo me fez reflectir sobre o real estado da nossa democracia.


Alguns “gurus da verdade” adoptaram, agora, o discurso da longevidade do Presidente da República naquelas funções. É verdade. Todos reconhecemos esse facto. Porém, talvez não fosse mau que, ao analisar as causas, fossemos suficientemente profundos e tentássemos, sem olhar às consequências, achar o que determinou que as coisas assim ocorressem.


Deixo isso à reflexão de cada um.


Entretanto, peço-lhes que analisem também, com a mesma profundidade, o facto dos principais opositores ao regime (com o qual não tenho qualquer vínculo) serem tão longevos quanto aqueles que eles próprios querem derrubar.


Se não, vejamos: os meus então correligionários que estão hoje, na direcção da UNITA, há quantos anos estão na oposição? O Ngola Kabangu, o Lucas Ngonda e todos os dirigentes da FNLA, há quantos anos estão na oposição? O Filomeno Vieira Lopes há quantos anos está na oposição? Mesmo o Justino e o Vicente Pinto de Andrade há quantos anos estão na oposição?


Façam o favor de contar o tempo que eles e outros, que também integram pequenos partidos, não foram peixe nem carne.


Isto a propósito da necessidade de renovação. Então, não é caso para dizer que a apetência pelo poder é tão grande que eles só vêem o “traseiro” do outro?


Será que só quem está no poder é que se cristaliza, fica sem ideias, se deixa corromper e perde arreigo ao povo? Aos que estão na oposição o tempo não deixa marcas?


Não será legítimo dizer que também a nossa oposição não se renova nem nos homens, nem nas ideias?
Não será legítimo dizer que, tal como os outros, os homens da oposição têm uma obstinação cega pelo poder?


Não é um bom momento para, tal como eu, escolherem também outra forma de ocupação para os dias que lhes restam?


Cada um sabe de si. Eu há muito tomei a decisão de abandonar a vida política e dar o pouco que sei em prol do meu país por via do processo educativo dos nossos jovens.


Por último, não posso deixar de me referir a apelos que têm sido feitos por indivíduos irresponsáveis e descomprometidos com o país, dizendo-se disponíveis para a guerra, decididos a matar gente, atacar igrejas, escolas, bancos, governantes e seus apoiantes.


Será que a nossa oposição política (não querendo acreditar que ela seja a promotora) se revê neste tipo de comportamento?


Será que, de forma covarde e antipatriótica, vai fingir que não percebeu, para depois (untando-se com o sangue dos tombados) tentar cobrar dividendos?


Porquê que os ditos democratas não vêm a público demarcar-se de tão infame atitude?


Onde estão os Vicentes, os Mocos, os Bonavenas, os Celsos, os “representantes dos direitos humanos” e, também, onde está a autoridade do Estado que não responsabiliza os autores destes crimes públicos?


Vou esperar para ver até onde vai o patriotismo desta gente, que todos os dias nos promete democracia, liberdade e respeito pelo próximo.


Cordiais cumprimentos!