De acordo com Pain, a eleição está sendo um desafio para os angolanos e a apuração dos votos deve ser um desafio maior ainda. "O que se viu em 1992 foi alegação de fraude e o que se percebe na África, principalmente subsaariana, é que depois das eleições, geralmente a parte que perde acusa a outra de fraude", afirmou à Folha Online.
 
O pleito de 1992 foi o primeiro para cargos legislativos da história de Angola. Na ocasião, foi justamente uma alegação de fraude que retomou a luta armada no país --conflito que só acabaria dez anos mais tarde. "Transparência é fundamental para que as partes estejam satisfeitas com o resultado."

Os primeiros indícios de que uma nova alegação irá se concretizar desta vez começam a aparecer. O maior partido de oposição, a União Nacional para a Independência Total de Angola (Unita), pediu hoje mesmo a realização de uma nova votação. Para Pain, agora, é fundamental que não haja falhas na contagem dos votos.

Pain atribui a desorganização é ocasionada pela falta de tradição no processo democrático. Ao mesmo tempo, os angolanos vivem um clima de tranqüilidade, bem diferente da conjuntura vivida na primeira eleição no país. "Não há como se traçar um paralelo com o que aconteceu em 1992, porque a conjuntura é completamente diferente", disse.

"Há uma ou outra ameaça pontual, afinal de contas estamos falando de uma sociedade marcada por décadas de conflito. Não é por uma lei ou uma questão de paz que os corações e mentes das pessoas vão conseguir armazenar tantos anos de conflitos e constrangimentos."

Vontade

O deputado federal brasileiro George Hilton (PP-MG), que integra a missão de observação eleitoral da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) em Angola, afirmou ter ficado surpreso com a disposição do povo angolano em exercer o direito de voto --lá, o comparecimento às urnas não é obrigatório.

Militantes do MPLA, partido majoritario, que deve ganhar as eleicoes parlamentares, aguardam comboio presidencial em Luanda "Muitos ficaram desde a madrugada. Tem gente que está 12, 13 horas na fila. O sentimento de assemelha muito ao [visto no] movimento das Diretas-Já, que aconteceu no Brasil, pela redemocratização do país", afirmou.

Hilton confirmou que a estrutura eleitoral angolana é "muito deficitária". "Levando-se em conta que há 400 zonas eleitorais só em Luanda, na capital, há muitas zonas que sequer iniciaram o processo de votação", afirmou o deputado à Folha Online, por telefone, de Angola. No local eram 16h40. O processo de votação teve início às 7h e iria até às 19h (das 3h às 15h de Brasília), mas o deputado disse acreditar que a votação se estenderia até as 22h, 23h locais.


O deputado afirmou que muitas das chamadas "assembléias de voto" não tinham material apropriado nem cédulas de votação na hora marcada para a abertura. Outras precisaram ser fechadas durante o dia porque as cédulas tinham acabado. Ele contou que havia "filas quilométricas" formadas pelos angolanos que aguardavam as zonas serem abertas. Uma minoria cansou e foi embora. O deputado afirmou que faz muito calor hoje na Angola e muitas das filas são formadas sob o sol.

O professor Pain afirma que a persistência do povo angolano em votar pode ser explicada pela ansiedade por novas eleições. "Desde o fim do conflito armado, com a morte do [então líder da Unita, Jonas] Savimbi --em 2002--, existia uma vontade muito grande de participar."

"Uma crítica que se faz é que essas eleições já poderiam ter acontecido há algum tempo, afinal de contas o fim do conflito armado foi em 2002. O governo foi prorrogando essa eleição, com a desculpa de que precisava unir o país, que as estradas não estavam bem feitas. Sem dúvida, a eleição desta sexta é um marco fundamental para consolidação desse começo de democracia em Angola."

Fonte: Efe/folha de S.Paulo