Luanda - Da entrevista da senhora Isabel dos Santos destacam-se dois aspectos: a) O critério editorial da Zimbo. Por que razão aquela estação televisiva entrevistou a senhora quando horas antes ela já havia distribuído um comunicado com o essencial do que fez ou do que julga ter feito ao longo dos 17 meses na Sonangol? O critério editorial da Zimbo é discutível porque ao longo de 38 anos o pai de Isabel exonerou um sem número de ministros, presidentes de conselhos de administração, enfim, funcionários seniores do Governo e, no entanto, a estação televisiva nunca se comoveu com a sorte daqueles homens caídos em desgraça. Por que razão Isabel dos Santos mereceu tratamento diferente?

Fonte: Correio Angolense

Em Dezembro de 2016, depois de haver sido exonerado e enxovalhado publicamente por Isabel dos Santos, o agora PCA da Sonangol, Carlos Saturnino, recorreu às redes sociais para defender o seu bom nome e a sua honra. A Zimbo não se condoeu com a sorte do senhor. Porquê, pergunta-se novamente, a senhora Isabel mereceu tratamento distinto, quando sobre a sua exoneração não foram feitas quaisquer outras considerações?


b) Destaque-se, em segundo lugar, o à-vontade com que a senhora falou. Isabel dos Santos escolheu rigorosamente as palavras e só discorreu sobre matérias em que julga ter brilhado ao longo dos 17 meses em que esteve na Sonangol. Isabel dos Santos permitiu-se “brilhar” e até tergiversar pela simples e incontestável razão de que a entrevistadora não estava à altura da empreitada. Encostar “às boxes” uma manipuladora como Isabel dos Santos exige muito mais do que simples beleza física. Exige conhecimento dos assuntos e também alguma astúcia. Laurinda Calças compensou a falta de conhecimento da matéria com excessiva reverência à entrevistada. Por muito pouco quase lhe beijou os pés.


Qualquer entrevistador avisado teria pedido à Isabel dos Santos respostas para, pelos menos, as seguintes 14 questões:

1. A senhora foi nomeada PCA da Sonangol por ser competente ou por ser filha do então Presidente da República?

2. Se é por competência, por que razão a senhora se fez rodear de tantos consultores estrangeiros?

3. A Sonangol é a empresa angolana que mais quadros formou no exterior. Há, na Sonangol, quadros formados nas melhores universidades do mundo. Não obstante, a senhora os espezinhou, preterindo-os a favor de jovens portugueses que nunca tiveram nenhuma experiência no universo petrolífero. Fez porquê?

4. A senhora seria capaz de revelar quanto pagou aos consultores estrangeiros que contratou para a Sonangol? Quanto receberam mensalmente as empresas de consultoria Boston Consulting Group, o escritório de advogados Vieira de Almeida e Associados, e a PWC?

5. As remunerações destes consultores estrangeiros eram objecto de algum tipo de desconto estabelecido por lei?

6. Já agora pode dizer-nos se, na condição de trabalhadores expatriados e tal como estipula a lei, eles estavam em Angola a coberto de visto de trabalho?

7. A senhora seria capaz de revelar publicamente quanto auferia em termos globais pelo cargo que exercia na Sonangol, ou os seus concidadãos não têm o direito de saber isso?

8. A senhora, que se diz paladina da transparência e da boa gestão, acha eticamente sustentável que tivesse posto as suas empresas privadas Candando, UCALL, Efacec Power Solutions ou Wise Intelligence Solutions a prestar serviços à Sonangol?

9. Quando é que foi anunciado o concurso público para contratação de uma empresa com vista à requalificação dos recursos humanos da Sonangol?

10. Mesmo sabendo que não o podia fazer uma vez que não foi empossada no cargo de PCA executiva, à luz do novo estatuto da Sonangol que o seu pai aprovou às pressas, a senhora tentou colocar Maria Jacinto de Sousa Rodrigues, uma ex-cunhada da sua tia Marta, à testa da Sonangol Limited, em Londres. Fê-lo pelo simples prazer de desafiar a lei ou porque não resistiu ao nepotismo, prática em que o seu pai se distinguiu?

11. A senhora deixa a Sonangol com a consciência perfeitamente tranquila depois de haver permitido que estrangeiros como os senhores Mário Leite, Sarju Raikundalia e Suzana Barros da Costa, para só referir estes, estejam a par de todos os segredos da companhia e, por arrasto, do Estado angolano?

12. A sua passagem pela Sonangol permitiu que a senhora tivesse acesso à informação estratégica sobre o sector. Sabendo que a senhora é simultaneamente proprietária de vários bancos, o facto de deter certo tipo de informação deixa-a, convenhamos, em condição privilegiada relativamente aos seus concorrentes. Deste ponto de vista a senhora só tem a bater palmas, certo?

13. A Sonangol tem à testa do seu Gabinete de Comunicação e Imagem um jornalista angolano recrutado na Rádio Nacional de Angola. O que explica o recrutamento do português Paulo Catarro?

14. A sua irmã, Tchizé, queixa-se de perseguição política por parte do actual Presidente da República. É assim que a senhora também interpreta a sua exoneração da Sonangol?


Em suma: Isabel dos Santos “brilhou” porque a Zimbo quis. Concedendo que a estação televisiva quisesse ouvir de viva voz a versão da senhora sobre a sua exoneração, então seria exigível que o entrevistador estivesse suficientemente preparado; que dominasse completamente os assuntos.

Com um entrevistador à altura, a “Princesa” não teria tempo para exibir aquele sorriso zombeteiro.


A rigor, nem sequer se deve falar em entrevista. O que houve na Zimbo foi um exercício de solilóquio de Isabel dos Santos, entremeado pela balbúcie de Laurinda Calças. Esprimida até ao “tutano”, daquela entrevista só saíram vaidade e gabarolice. Por culpa da TV Zimbo, reitere-se.

O tratamento diferenciado que algum segmento da comunicação social (público e privado) dispensa aos filhos de José Eduardo dos Santos é o que os leva a pensar que são seres especiais. É por causa disso (e de outras coisas) que a senhora Tchizé dos Santos se julga importante o suficiente para merecer perseguição política por parte do Presidente da República João Lourenço. Quanta petulância!