Lisboa – Na década de oitenta,  não havia depois do Presidente José Eduardo dos Santos, quem mais mandasse no regime, que não fosse o antigo ministro do interior,  Manuel Alexandre Duarte Rodrigues “Kito”.   Gozava de  forte  prestigio externo. O falecido Presidente de Moçambique, Samora Machel tinha simpatia por ele e a   dada altura  os americanos  acreditavam que ele era a figura que poderia um dia endireitar Angola. O seu poder terminou  na sequencia de uma cabala montada pelo então Coronel Zé Maria que o acusara de tentativa de  “golpe de Estado” contra JES.

Fonte: Club-k.net

Foi acusado de tentativa de “golpe de Estado” em 1989

Nascido em Luanda mas com  origens entre Malanje e Kuanza-Norte, o general Manuel Alexandre Duarte Rodrigues “Kito”,   71 anos,  é um nacionalista  que cresceu na Igreja Metodista e que  enquadrou-se no MPLA, no inicio  dos anos sessenta a partir do Congo Leopoldeville,  na altura Congo Belga.

De guerrilheiro a diplomata

Alexandre Kito foi um dos poucos, dentro do movimento, que não aceitou dar continuidade aos estudos no estrangeiro para  continuar a lutar com armas na mão contra o colonialismo português.  Na altura,  o então Presidente da JMPLA, Daniel Chipenda, propos-lhe para estudar na extinta União Soviética,  no mesmo grupo de José Eduardo dos Santos e de Pedro Van-Dunem “Loy” mas ele negou justificando-se   que estava ali  para combater.

Nas estruturas do movimento, Alexandre “Kito”  esteve na formação do Exercito Popular de Libertação de Angola (ELPA) e posteriormente na formação das  FAPLAs, braço armado do MPLA.  Como guerrilheiro, esteve na segunda região militar e na terceira região onde permaneceu mais tempo. Segundo algumas testemunhas  que estiveram com ele no leste do país, "Kito" andou nas zonas libertadas mais nunca participou em nenhuma acção de combate como tal, apesar de ter feito vários treinos militares.

Em meados da década de setenta, Alexandre Duarte Rodrigues “Kito”  desempenhou as funções de representante do MPLA, em Lusaka e é nesta qualidade de “embaixador itinerante”, que  participou  em varias conferências internacionais em nome deste movimento de libertação nacional.  

A partir de Lusaka,  manteve vários contactos com os dirigentes da FRELIMO e do ANC. Foi  um dos primeiros dirigentes do MPLA a ter contacto com Nelson Mandela dai ter um filho com  nome deste, Jaime Mandela Rodrigues “Mito”.  Também manteve  contactos com dirigentes do PAIGC entre eles Amílcar Cabral, e conheceu pessoalmente Nkwame Nkruma do Gana e Ahmed Sékou Touré, ex- Presidente da Guine-Conacry.

 Período pós Independência  e o 27 de Maio

No período pós Independência, Alexandre “Kito” começou por fazer parte do Estado Maior das FAPLA como chefe adjunto da segurança do exercito.  Foi ele quem deu a cara pelo MPLA a quando ou depois da intentona de 27 de Maio de 77, na qualidade de  porta-voz das FAPLA e do governo. Coube-lhe  a leitura do comunicado anunciando a captura do então Major Alves Baptista “Nito Alves”, acusado de ser o mentor do suposto “golpe de Estado”, naquele ano.

Não há Registro de que tenha praticado excessos ou ter tirado a vida de compatriotas neste período, apesar do general Silva Mateus ter declarado em 2013, como foi detido em 1978, na presença de Alexandre “Kito”. 

“Fui detido a partir do gabinete do General Alexandre Rodrigues “Kito”. Quando se extingue a DISA, cria-se o Ministério da Segurança do Estado. Depois cria-se a Secretaria de Estado da Ordem Interna que, por sua vez, tinha duas vertentes; uma para a Polícia e outra para a Segurança. Na referida Secretaria estava Alexandre Rodrigues “Kito” e pela Segurança o “Diandengue”. Eu fiquei na Polícia Judiciária. Portanto, fui preso a partir do gabinete de “Kito”, na presença de “Nandó”, “Kifofo” e Mussolo. Porquê? Claro, porque tinha sido acusado de pertencer ao grupo de Nito Alves”,  revelou Silva Mateus actual líder de um grupo interno do MPLA que contesta a liderança de JES.

O  papel para escolha de JES após a morte de Neto 

A quando do desaparecimento físico de Agostinho Neto,  Alexandre Rodrigues “Kito” jogou um papel preponderante para que José Eduardo dos Santos   fosse o escolhido provisório até  ao próximo congresso do MPLA.

Henrique "Iko" Teles Carreira e Lúcio Lara, dois influentes membros do MPLA, na altura, eram  os substitutos naturais de Agostinho Neto por causa da sua trajectória na fundação do movimento, porém convictos que seriam  rejeitados por serem mestiços/brancos,  propuseram  os nomes de Pedro Maria Tonha “Pedale” ou Pascoal Luvualu.  Contudo,  devido às  limitações académicas  de “Pedale” e Luvualu, e também por outras questões, as duas propostas foram preteridas vigorosamente por  Alexandre “Kito” e seguidas  por outros membros do BP  do MPLA que constituíam  um grupo de 10 elementos.

Alexandre Kito e outros “negros” no Bureau Político  de então vincaram pé,   numa “guerra” que durou alguns dias a discutirem até encontrarem quem seria o substituto de Neto. O seu grupo acabou por colocar  JES provisoriamente no poder em detrimento de uma  possível marioneta da ala de  “Iko” e Lúcio Lara. Assim JES ficou  presidente até ao momento. 

A ascensão a segunda  figura do regime

José Eduardo dos Santos,  por outro lado soube lhe ser grato.  Em finais de 1978 nomeou–lhe  para o cargo de Secretário de Estado da Ordem Interna.  No ano  a seguir, fez-lhe  Vice-Ministro da Ordem Interna até  se tornar no titular do cargo, em Julho de 1980.

Manuel Alexandre Duarte Rodrigues que ostentava a patente de coronel a mais alta no exercito, na altura, se tornou no mais poderoso  ministro do regime a época.  O seu protagonismo como “segunda figura do regime”, era  verificado nas ações do próprio JES. Sempre que o Presidente saísse  para as visitas de Estado ao exterior, era  “Kito”, o então ministro do interior que o substituía nas ausências.

Em Dezembro de 1988,  JES indicou-lhe para integrar   a delegação governamental que negociou com a UNITA, o acordo Tripartido na cidade de Nova Iorque, acordando com a retirada das forças estrangeiros do conflito angolano, levando, consequentemente, à independência da Namíbia e à democratização da África do Sul, culminando com o fim do regime do Apartheid.

Foi também nesta  altura que os americanos passaram a manifestar admiração  por ele e ao mesmo tempo identificaram-lhe qualidades que os levaram a acreditar que estariam diante do elemento que poderia trazer a paz e mudar Angola.

 As  intrigas e o afastamento do regime

As primeiras insinuações  contra “Kito” surgiram no seguimento do prestigio externo que estaria a ter, sobretudo a elogios  do então Presidente Moçambicano, Samora Machel que  considerava-lhe um quadro extraordinário. 

Outra insinuação  de que estaria a actuar de forma independente, foi quando o então Ministro comprou o primeiro “Gulfstream”, um jacto executivo de luxo que viria a ser posteriormente motivo de polémica.  Aludia-se que teria comprado sem a autorização de JES.  O  referido jacto  foi comprado com  ajuda de um nigeriano radicado nos EUA,  António Deinde Fernandez que tem relações estreitas com JES. 

O  “Gulfstream” serviu para apoiar JES,  e  usado para apoiar  tanto a  delegação angolana como a cubana nos acordos de Nova Iorque.

 Em Maio de 1989,  Manuel  Rodrigues Alexandre “Kito” seria afastado do cargo de Ministro do Interior,  no seguimento de acusações de um relatório assinado pelo  então coronel António José Maria, a época secretário da defesa do gabinete presidencial que o acusava de ter formado uma força especial para tentativa de um suposto “golpe de Estado” contra o Presidente José Eduardo dos Santos.  O relatório de Zé Maria escrito com ajuda de dois assessores cubanos insinuava  que as referidas forças especiais (que mais tarde vieram a se chamar Policia de Intervenção Rápida) , encontravam-se estacionadas em Cabinda.

Um antigo ministro  do regime, António Jacinto (já falecido) ficou  desiludido com “Kito” por não ter mostrados documentos em seu favor perante uma comissão de inquérito  conduzida por um membro do gabinete presidencial, Nito Teixeira. Os documentos em posse de “Kito” atestavam autorização do Presidente da República para criação  das “forças  especiais”, que deveriam  inicialmente intervir  em Cabinda devido aos problemas que enfrentavam com a FLEC.    

As  provas documentais  atestavam igualmente  que a formação das então chamadas “forças especiais da policia” (Actual PIR) era da competência exclusiva do ministro do interior  através das verbas do seu pelouro e que, bastava o mesmo comunicar ao  BP  do MPLA e ao  Presidente da República.

A época  quem de facto mandava no país era um colégio (BP do MPLA)  chefiado por JES e por “Kito” por  ter sido o homem que ajudou Dos Santos  a chegar ao poder após a morte de Neto.  A queda de “Kito” foi  também  vista, em meios restritos do regime,  como produto de uma intriga do então coronel Zé Maria que quis vingar-se dele  por motivos passionais.

Ao ser afastado, o ex- Ministro  do Interior   manteve-se  como membro do BP do MPLA  ficando ali até a realização do congresso que não o reconduziu. Passou a ser somente coronel do exercito que era a patente mais alta na aquela altura nas FAPLAS, até ter sido  sido enviado como embaixador na África do Sul em 1994.

Desde então as relações entre o Presidente  JES e o mesmo deixou de ser a mesma coisa. Em Janeiro de 2013, o Chefe de Estado indicou-lhe membro do Conselho da República, posição que acumula com as funções de embaixador de Angola  na Namíbia.

Particularidades da sua pessoa

É visto como um quadro bastante disciplinado. Em 1981, por exemplo,  “Kito” mandou prender um agente do regime por supostamente ter deixado perder a mala  do nigeriano  António Fernandez a partir do aeroporto de Luanda.

É casado  desde os maquis com Ângela Catarina Baião (de nome de guerra Bela) sendo dos poucos que mantém a sua mulher que veio com ele das matas.