Luanda - [...], na verdade, não é a linguagem que se encontra no tempo, mas o homem se encontra na linguagem e fala do seio da linguagem — assim também acontece com toda palavra e com todo espírito. O espírito não está no EU, mas entre o EU e TU. Ele não é comparável ao sangue que circula em ti, mas ao ar que respiras. O homem vive no Espírito na medida em que pode responder a seu TU. Ele é capaz disso quando entra na relação com todo o seu ser. Somente em virtude de seu poder de relação que o homem pode viver no espírito. Mas é aqui que se levanta, com toda a sua força, a fatalidade do fenómeno da relação. [...]. Somente o silêncio diante do TU, o silêncio de todas as línguas, a espera silenciosa da palavra formulada, indiferenciada, pré-verbal, deixa ao TU sua liberdade, estabelece-se com ele na retenção onde o espírito não se manifesta mas está presente.(BUBER, 2009, pp.76-7).


Fonte: Club-k.net

Com a presente preposição, Martin Buber reafirma a ontologia da linguagem, da comunicação humana. E ao mesmo tempo dá um dado pragmático para o exercício do diálogo autêntico, ao se referir a necessidade do silêncio como respeito pela liberdade do interlocutor no diálogo, na relação. “Somente aquele que conhece a relação e a presença do TU, está apto a tomar uma decisão. Aquele que toma uma decisão é livre, pois se apresenta diante da face”(BUBER, 2009, p.85).


O filósofo da ontologia do diálogo e da relação acredita de tal maneira na sua imprescindibilidade para a realização do projecto humano e por isso insiste em vários argumentos, universalizando a questão dizendo que (2009, p.86), “todos, mesmo os mais tolos, conheceram de alguma maneira, seja por natureza, ou um modo intuitivo ou obscuro, o encontro, a presença; todos de algum modo pressentiram o TU; agora o espírito é para eles a garantia”.

 
A finalidade da relação é o seu próprio ser, ou seja, o contato com o TU. Pois, no contacto com cada TU, toca-nos um sopro da vida eterna. Quem está na relação participa de uma actualidade, quer dizer, de um ser que não está unicamente nele nem unicamente fora dele. Toda actualidade é um agir do qual eu participo sem poder dele me apropriar. Onde há participação de si não há actualidade. A participação é tanto mais perfeita, quanto o contacto do TU é mais imediato.

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O homem é tanto mais uma pessoa quanto mais intenso é o EU da palavra-princípio EU-TU, na dualidade humana de seu EU.


Entre as críticas levantadas contra o pensamento de Martin Buber, destaca-se o facto de o considerarem demasiado ontologista na caracterização do diálogo, da relação e da comunicação.  Para os críticos, apesar da importância da comunicação na realização da pessoa, não faz sentido subordinar as outras dimensões a elas como fez Buber.


Para Christians — comparando o pensamento de Buber ao de Freire — afirma (2004, p.83): “O primeiro é moralista quando o segundo é marcadamente político; um sublinha a acção interior; o outro destaca a acção social; e isso não porque as teorias do diálogo de ambos sejam essencialmente diversas, mas porque são elaboradas no interior de diferentes weltanschauung”.


Não se pode pensar que Buber era ingênuo e não estava preocupado com a dimensão política, social e transformadora da palavra, da comunicação e do diálogo. Prova disto é o Hassidismo e sua atitude com os outros e com o mundo.


O pensamento de Buber pode ser sintetizado nas seguintes categorias: liberdade, inter-humano, subjectividade, pessoa, responsabilidade, decisão diálogo, reciprocidade, palavra, relação.


Finalmente, o presente artigo entende que não é possível o exercício da liberdade de expressão e de imprensa sem que a pedagogia da relação, do diálogo e da comunicação incuta com razoabilidade e retórica esta dimensão às mulheres e os homens. Só assim é possível que as pessoas sejam capazes de se “digladiarem” na arena pública num ambiente verdadeiramente democrático que terá a mídia como intermediário técnico a agenciar um exercício humano e nada mais. Somente humano e os meios técnicos como instrumentos ao seu serviço, onde valerá a fortaleza do argumento e não das armas ou da pujança económica e financeira.  Em suma, só pode debater quem tem a relação e o diálogo como cultura. O diálogo como cultura se fenomeniza, é mundanizante só assim se pode libertar o homem como defende Paulo Freire.


Paulo Reglus Neves Freire nasceu a 19 de Setembro em Recife e morreu em São Paulo a 2 de Maio.  Foi um educador e filósofo brasileiro. Destacou-se por seu trabalho na área da educação popular, voltada tanto para a escolarização quanto para a formação da consciência. É considerado um dos pensadores mais notáveis na história da pedagogia e da comunicação a nível mundial, tendo influenciado o movimento chamado pedagogia crítica. Tem uma vasta produção cientifica, com mais de trinta livros publicados. Só para citar alguns: Educação como prática da liberdade, Extensão ou comunicação, Pedagogia da esperança, Pedagogia da autonomia etc. É um autor bastante fecundo, porque a sua vasta obra inspirou muitos estudos multiepistémicos.


O pensamento comunicacional de Freire tem como centro o diálogo, sempre o diálogo e não a transferência de dados conforme a visão tradicional sobre a comunicação. A comunicação visa evocar o mundo, sobretudo a realidade onde se vive. Não faz sentido que se obrigue as pessoas a evocarem dados estranhos a sua realidade mundanizante. Na comunicação dialógica há que se observar a escuta como pré-requisito para que ela se dê.