Luanda - De modo geral a dissidência é uma divergência de interesses ou de opiniões sobre uma determinada questão concreta. Dentro de um lar, entre o casal ou entre os pais e filhos pode verificar-se desacordos entre si. De igual modo, tem sido frequente o surgimento de desavenças no seio das comunidades, instituições ou organizações políticas sobre diversas questões.


Fonte: http://baolinangua.blogspot.com

CASA que alberga dentro de si todos estratos sociais

A questão fulcral tem sido a de identificar com exatidão a natureza da contradição e a razão da discórdia. A cisão, em si, é o fenómeno natural que acontece frequentemente na vida humana. Acredito que, são poucas vezes em que a razão ganha a substancia absoluta. O futuro, por regra, é o mestre mais consequente que tem sido capaz de desvendar aquilo que o presente é incapaz de discernir ou reconhecer. Demasiadas vezes a nossa visão tem sido bastante curta a fim de nos permitir prever o futuro, bem distante.


O mundo contemporâneo e os fenómenos sociais estão num processo constante de transformação profunda e acelerada. O que exige uma capacidade enormíssima de inovação, de modernização, de restruturação e de adaptação. No meio de tudo isso, a inteligência humana está no centro das transformações que decorrem no mundo e que nos permite descobrir e estabelecer os instrumentos eficazes de trabalho.


A espécie humana, desde sua génese, tem tido a capacidade de sobrevivência devido a sua faculdade racional que lhe permite antecipar os acontecimentos nefastos. A vida dos homens obedece à uma serie de factores que condicionam e regulam a sua conduta. Todavia, ela é o mundo cheio de contradições e de desafios incessantes que atuam de alavancas no processo de transformação e do progresso.


O êxito ou o insucesso da discórdia não depende necessariamente da razão que originou este elemento. Pois, há inúmeros factores intervenientes neste processo que sempre buscam uma nova realidade capaz de contrariar, melhorar e impulsionar uma determinada situação. Um Bebé recém-nascido pode ter uma saúde perfeita. Posto no mundo dos vivos é exposto a variadíssimas condições ambientais que intervém na evolução do seu estado de saúde.


Isso acontece igualmente com os partidos políticos que têm de enfrentar continuamente uma competição politica dura para que tornam capazes de se afirmar, conquistar e sustentar os seus espaços sociais. A concorrência política, em si, é o factor chave para determinar a capacidade de liderança, de concepçao, de estruturação, de organização, de mobilização, de congregação, de unificação e de inspiração.


Nas sociedades democráticas, em que o espaço de atuação é amplo, as dissidências encontram pouca expressão. Dado o facto de que, o espaço de realização das mulheres e dos homens, como pessoas singulares e coletivas, é aberto a todos. Não se colocam inibições ou freios artificiais. As regras do jogo são transparentes, iguais e justas e a Victória depende somente da meritocracia de cada concorrente.


Com certeza, o direito de contenda democrática, per se, atenua os conflitos internos resultantes de repressão de todos aqueles que aspiram realizar-se na vida. Por isso, a ocorrência de dissidências constantes numa força política é um indício evidente de incongruências ou de negligências anacrónicas. Logo, não é aceitável permitir a existência de elementos dentro duma organização cuja visão é de combater e destruir os valores e os grandes talentos da sociedade.


Quando este espirito toma conta da alma de um partido politico, há toda certeza da frequência de dissidências. Além disso, o papel fundamental de uma formação política é de acolher os cidadãos, prepará-los, projetá-los e conduzi-los aos cargos políticos e públicos. A sua missão é de realizar as mulheres e os homens na sua luta quotidiana pela prosperidade e progresso. Quando isso não acontecer, este partido está a margem das suas responsabilidades básicas e deixa de merecer os atributos da representatividade e da legitimidade politica.


O ingresso num partido político equivalente ao contracto social. É como um casamento. Quando deixar de existir o clima saudável de concórdia e de harmonia no lar, o divórcio tem sido inevitável. Numa sociedade aberta e democrática, as pessoas têm o direito de decidir livremente sobre as suas vidas. É preciso que haja respeito e dignificação de outrem. A democracia funciona assim, na liberdade de escolha e no respeito escrupuloso da vontade de cada um de nós. Isso caracteriza a essência da civilização moderna da Aldeia comum em que todos estamos inseridos.


Faço-me lembrar dos anos longínquos da fundação da UNITA, em 1966, quando me encontrava em Lusaka. Naquela época, o Ceu estava bem nebuloso e se registavam muitas especulações, calunias, difamações, mentiras, boatos, incriminações e uma serie de coisas por aí. Nesta altura, a UNITA era tida como “splinter group”, isto é, uma facçao dissidente, maoista e aventureira.


A subestimação da sustentabilidade deste novo Movimento de Libertação Nacional era total e absoluta. Não vinha na mente de ninguém, na época, o papel preponderante que este partido viria desempenhar na luta de libertação nacional; na resistência contra o expansionismo soviético em Africa; na conquista do multipartidarismo e na imposição do sistema democrático em Angola. Suponhamos, se ela não tivesse sido fundada, Angola não estaria na condição de Cuba, do sistema do partido único, totalitário, que já se implantava a partir de 1975?


Na altura, eu discordei do meu tio, irmão mais velho da minha mãe, Senhor Jacob Musheke Khamalatah, Representante do MPLA na Zâmbia. Eu, como estudante, morava na casa dele, onde frequentava a Sede da UNITA, sita no Cairo Road. Meu tio e outros membros da família exerciam pressão enorme sobre mim com fim de me ingressar no MPLA.

 
Não cedi a esta pressão e mantive intacta a minha decisão de seguir o meu rumo. Independentemente dos grandes desafios que a UNITA viria enfrentar na sua longa e sinuosa caminhada. O mais importante foi o facto de que, houve o entendimento por parte do meu tio e de outros membros da família. Fomos capazes de superar as nossas diferenças politica e salvaguardar a coesão e a unidade de toda família. Na vida é assim mesmo, cada um tem o direito de decidir livremente. Seria absurdo se isso transformasse num bicho-de-sete-cabeças.


Portanto, é preciso ter muita cautela na avaliação dos fenómenos da dissidência. Por isso, não comungo com a escola de pensamento que defende a tese de que, as dissidências não têm impactos negativos sobre os partidos políticos. No caso específico da UNITA, a dissidência do Mais Velho Miguel N´Zau Puna foi desastrosa. Pois, ele era um dos três pilares principais que mantinham o equilíbrio na Direção da UNITA. Tivera sido o Conselheiro mais confidente e mais interventivo que partilhava intimamente com Dr. Jonas Savimbi os momentos cruciais da tomada de decisões difíceis e complexas.


Além disso, foi o companheiro e amigo mais íntimo do Presidente da UNITA. Os dois eram como o Comandante Fidel Castro e Ché Guevara durante a Revolução Cubana na Siera Maestra. Miguel N´Zau Puna sempre foi um patriota convicto que pugnava e inspirava o espirito revolucionário e nacionalista. Acima disso, destacou-se como uma referência incontornável da identidade nacional. É filho de Cabinda que aceitou os desafios, no momento decisivo, de caminhar ao Leste de Angola e combater o Colonialismo Português com a arma na mão. Não existia entre ele e Dr. Savimbi uma afinidade etno-cultural.


Portanto, a dissidência do Miguel N´zau Puna criou-nos grandes transtornos e causou grandes prejuízos sobre a credibilidade da UNITA junto da Comunidade Internacional. Acho que, de certo modo, influenciara a postura hostil dos Estados Unidos da América, em 1992, diante UNITA. Mais tarde, isso vinha repercutir-se na conspiração da morte do Presidente fundador. Uma conspiração em que se envolveram destacados dissidentes da UNITA, alguns dos quais com lugares de destaque na Direção actual do Partido. Porquê se pretende tapar o sol com a peneira? Acima disso, os efeitos das diversas dissidências continuam a abalar os alicerces do Partido.


Essa cultura evasiva corrói a sensibilidade e a sensatez de um partido político em poder julgar as situações de modo objetivo e tomar medidas efectivas. Contudo, é preciso reconhecer o facto de que, o realismo politica, a honestidade e a coragem são virtudes cardiais dos grandes líderes que se destacaram nos momentos mais conturbados da história universal. Porque souberam reconhecer os factos e enfrentá-los de modo objetivo e adequado, sem subterfúgios ou bode expiatório.


No dia 11 de Novembro de 2010, tivera feito uma reflexão sobre os cenários mais prováveis da situação interna da UNITA e do País. Naquele ensaio, previa o surgimento da 3ª. Via que teria como objetivos principais combater a má governação cancroide e impulsionar o processo da transformação democrática em Angola. Tinha a percepçao de que, a liderança e a base social desta força politica sairiam das fileiras dos partidos históricos, sobretudo da UNITA e do MPLA.
Apelava, na altura, para que se tomasse medidas adequadas de buscar consensos sobre algumas questões fundamentais no sentido de poder restaurar a unidade e a coesão interna das fileiras do partido e assumir a liderança do processo de mudança que o país tanto espera. Nenhum partido político é capaz de realizar uma mudança democrática no país enquanto as suas fileiras estiverem dilaceradas.


Na mesma reflexão afirmava que, era importante distinguir entre a condução do partido numa sociedade fechada de guerra e aquela que se realiza numa sociedade aberta, democrática, competitiva e em paz. Nesta última, exige uma ampla abertura; um maior espaço de consenso; maior eixo de flexibilidade; maior esfera de iniciativa e atuação individual; maior ângulo de liberdade de pensamento, de expressão, de escolha e de ação; maior capacidade de tolerância; e maior espaço de concertação e de compromisso.


Evidentemente, a minha previsão não afastou-se muito das transformações em curso, do nascimento da CASA que alberga dentro de si todos estratos sociais, políticos, religiosos, raciais e etno-culturais. Se trata, de facto, de grande desafio que é capaz de fraturar ainda mais as fileiras dos partidos históricos angolanos. Qualquer avaliação precipitada e má concebida irá arrastar a situação presente aos níveis mais elevados do declínio.
Durante 15 Anos da minha permanência na Europa Ocidental, sobretudo na Republica Federal da Alemanha, tive a oportunidade de acatar alguns valores básicos da vida política, sendo:


a) Os Indivíduos, os Povos, as Igrejas, os Partidos políticos, as Nações e os Estados devem saber conviver e coexistir pacificamente com aqueles que não sejam das mesmas nacionalidades, concepçoes, crenças, culturas e raças. Só assim que se torna viável construir um mundo solidário, pacifico, estável, seguro, próspero e progressivo.

b) O direito e a liberdade dos cidadãos de assumirem as suas decisões sem constrangimentos ou rancores de quaisquer índoles dependem essencialmente do espirito de tolerância, de aceitar e respeitar a vontade de outrem sem ressentimentos ou revanchismo.

c) Os cidadãos devem prestar maior atenção aos partidos políticos de estatura nacional e com a vocação do poder. Pois, de uma forma ou outra influenciam e exercem enormes impactos sobre as suas vidas individuais e coletivas. Para tal, é preciso cultivar nos cidadãos a cultura de liberdade, de libertá-los do obscurantismo e da alienação cultural e introduzir neles as capacidades de lutar, sem tréguas, pelos seus interesses vitais.

d) O princípio de alternância democrática consiste na valorização dos interesses de cada cidadão e na capacidade de identificar, em cada circunstância, o Partido melhor situado para empreender e materializar este desiderato nacional. Os membros do Partido A e C podem juntar os seus votos e depositá-los no Partido B capaz de transformar este desiderato numa realidade concreta. Este exercício não exige necessariamente os membros dos partidos em causa renunciar a sua militância dos seus respetivos partidos.

e) As Lideranças desempenham o papel decisivo na História dos Povos. Neste respeito, se o Povo Alemão tem sido capaz de superar os grandes obstáculos causados pela derrota na II Guerra Mundial de 1938-1945, foi graças aos seus grandes líderes, nomeadamente: Konrad Adenauer, Willy Brandt, Helmut Schmidt e Helmut Kohl. Estes estadistas tiveram a visão, a coragem e a flexibilidade de se adaptar justamente à nova realidade e enfrentar, com cabeça erguida, as Potencias Vencedoras da II Guerra Mundial. Esses dignatários, da época contemporânea, são hoje louvados e honrados por todos cidadãos daquele país europeu que se transformou de novo num líder gigante do Velho Continente.


O exemplo da Alemanha demonstra o facto de que, a derrota na Guerra é uma condição relativa e passageira. Se ela for bem explorada pode se transformar numa grande oportunidade e numa força gigantesca. Perante a crise económico-financeira que assola a Zona Euro, a Alemanha emergiu como a tabua-de-salvação, demostrando o seu potencial económico, tecnológico, científico e know-how. 


Parafraseando, eu acredito profundamente nesses valores e fazem parte do quadro integrante do meu pensamento, da minha convicção politica e da minha conduta pessoal. É preciso reconhecer os valores e a força indómita de realizar a Vontade de um povo sofredor. Os momentos dramáticos exigem líderes carismáticos e visionários com convicções fortes de transformar o Sonho do seu povo numa realidade concreta. Neste respeito, o Martin Luther King Jr., exclamava: “I have a Dream.”


A realização de um Sonho, não depende apenas da vontade de querer fazer, mas sim, da capacidade de poder realizar. Foi nestes moldes em que decidi, em 1966, seguir o Dr. Jonas Malheiro Savimbi, um líder de proporções incalculáveis.