Benguela - Depois dos factos ocorridos no Kulañgu, no Domingo passado, dia 06/05/2012, que a todos devem fazer reflectir e pensar sobre o estado de ânimo e maturidade da nossa Sociedade; Depois de ter até escutado os que, directa ou indirectamente, estão envolvidos nos acontecimentos, uns como protagonistas, alguns como árbitros, outros como vítimas inocentes, outros ainda como simples observadores, ocorre-me endereçar aos homens e mulheres de boa vontade desta nobre pátria que almejamos pacífica e pacificada para sempre, esta CARTA DE REPÚDIO DE UM CIDADÃO.


Fonte: Club-k.net

Respeitante aos acontecimentos em Benguela

Faço-o porque, sendo filho desta Angola e, em particular, do Monte-Belo/Bocoio, onde se localiza o Kulañgu, lugar em que aconteceram os factos de Vandalismo e Violência barata, sinto-me impelido a fazê-lo, porque de alguma forma fui atingido, senão no corpo, ao menos, na alma e no espírito de cidadão consciente e ciente das suas responsabilidades cívicas.


Faço-o porque sei que me assiste o direito à liberdade de Imprensa e de expressão, nos limites que a lei estabelece, claro está! Auguro-me que possa ser bem compreendido, nesta minha repulsa e condenação, sem meias medidas e embustes, da reacção destemperada e irracional dos militantes da UNITA. Embora se tente colocar tal facto de parte na análise fria do fenómeno e aligeirar, é mesmo isso que eles são. Militantes da UNITA! Vinham eles, segundo relatos concordes, do Acto político organizado no Monte-belo, minha comuna natal, por Altos Responsáveis desse Partido. A confirmação é do próprio Secretário Provincial desse Partido em Benguela que, nesse pormenor, reconheceu efectivamente que foram militantes seus que saíam do Acto Político realizado no Monte-belo.


Morreu alguém, perdeu-se uma Vida, é verdade! O que lamento profundamente e endereço à família enlutada os mais sentidos pêsames!


Mas o facto da morte do um companheiro não autoriza quem quer que seja a actuar como actuaram os militantes do “Galo Negro”, que só fizeram recordar os tempos que já não queriamos nem sequer imaginar, e não queremos mesmo, nem a brincar! Somos um povo de paz e em particular nós, os do Monte-Belo, somos cidadãos, ou seja habitantes da Cidade, onde existem leis e Autoridades, onde a Justiça cabe às entidades apostas para o efeito, onde não vigora a “barbárie” e a lei da irracionalidade selvática. Por isso, deixo por escrito este meu sentimento de repugnância da atitude dos autores, que apenas desporsonifica e põe em causa a seriedade dos seus propósitos.


Surpreende-me que o Dr. Samakuva, com todo o respeito que lhe tenho, tenha, de alguma forma, mitigado a gravidade do comportamento dos seus correligionários. Aqui, no meu entender, não devia haver ambiguidades ou tentativas de escapatórias que sugerem justificar o injustificável. Era necessário assumir, com a devida responsabilidade, o “passivo” que esse comportamento constitui. Só reconhecendo os próprios erros ou de seus companheiros é que há sentido de conversão que tal situação impõe. Só assumindo as próprias mazelas e derrapagens é que os grandes líderes revelam a sua magnanimidade.

 

Aqui só havia lugar é à condenação inequívoca dos militantes e apelar a que, pelo país adentro, adoptem comportamentos que possam contribuir para a consolidação da paz, da tranquilidade, da legalidade, da concórdia e sobretudo, do respeito pela justiça civica e civil, e não a das próprias mãos. Ao que me recordo, esse tipo de justiça é primitiva e não se coaduna com o estágio das sociedades modernas, onde os “cives”- cidadãos renunciaram às prerrogativas, segundo Hobbes, do Estado de Natureza e transferiram esse poder aos que os Representam nessa função, ora seja o Estado Social de Rousseau.


Agora, vir a público e dizer que tais indivíduos não são militantes de seu partido ou que esse é o comportamento normal dos angolanos em geral perante a morte de alguém por atropelamento, para mim isso é encorajar o comportamento ínvio dos militantes e não corrigi-lo. È minorar-lhes o efeito negativo e as consequências nefastas que esse ‘descontrolo de emoções’ causou até aos homens do Evangelho, os sacerdotes da nossa Missão Católica de Ndjinga. E eu, como católico daquela Missão, espero sinceramente que a UNITA assuma as suas responsabilidades civis, porque tanto os ferimentos causados a sacros missionários e agentes da Polícia, como os automóveis vandalizados e outros bens e pertences saqueados, são pecuniáveis. Devem, por inerência da relação orgânica entre os actores e a organização de que são correligionários— esta última deve tomar a seu encargo a Responsabilidade Civil; ou seja, reparar os danos causados, pois essa obrigação decorre dos princípios combinados do Direito Constitucional e Direito Administrativo em matéria de responsabilidade entre agente/órgão, de onde se deduzem as responsabilidades sociais ou civis. Não é aceitável que os cristãos católicos da Ndjinga fiquem sem a assistência espiritual e particularmente nesse momento pré-eleitoral, em que muito os sacerdotes contribuem para a tranquilidade interior dos cristãos e homens de boa vontade, isso por falta do meio rolante, o Toyota que os assistia. Suplico, pois, que, como filho ínclito daquela terra, a UNITA pague, quanto antes, a reposição e reparação do Automóvel que auxiliava os Padres Espiritanos naquela Missão Católica, a nossa Ndjinga!


Quanto ao Morto, que é justo que não se lhe esqueça, a empresa UNITEL assuma também as suas responsabilidades que, pese embora o seu motorista tivesse efectivamente prioridade, pois é ele quem estava na Estrada com prioridade, deveria é reduzir a velocidade por prudência, pois assim procedem os bons condutores quando se aproximam de um entroncamento. A Estrada 250 que vem do Bocoio, Huambo... cujos utentes, porém, obrigatóriamente devem sempre parar antes de se fazerem à Estrada 100, em direcção ao Lobito ou a Luanda.


Agora, a respeito do “aproveitamento político” a que se referiu o Dr. Samakuva, no seu pronunciamento público do dia 09 de Maio, devo recordar-lhe que estamos em Democracia. E até creio que estamos em pré-campanha eleitoral e o menor erro, o menor deslize que qualquer força política tiver, será naturalmente aproveitado políticamente pelos adversários. E é até salutar que, para a fortaleza da nossa jovem democracia, assim seja.


É preciso que se evitem erros de tamanha monstruosidade, passe o pleonasmo; é preciso, numa palavra, não dar chances aos outros, porque “o que não é proibido por lei, é permitido”, e muito mais em Política, que porém, note-se, deve ser sempre submissa à Ética.

 

A terminar, gostaria de tributar apreços pelo trabalho e coragem dos agentes policiais que não deixaram que o motorista fosse linchado, e aplaudo a pronta resposta do Comandante Geral da Polícia que, pela gravidade do caso, se fez deslocar à nossa Provincia de Benguela para, “in loco”, estudar as medidas necessárias a tomar, para que isso não se espalhar pelo país, nesta fase pré-eleitoral que inspira, como é natural, os melhores cuidados. E que os Autores desses crimes sejam penalmente responsabilizados e se instruam os processos e que se lhes apliquem penas exemplares! Tenho dito.

Luanda, aos 10 de Maio de 2012,
Subacrevo-me a punho pessoal,

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Júlio Kuvalela, professor Universitário!