Luanda - A preocupação da maioria dos cidadãos prende-se com a legalidade e transparência das próximas eleições, as primeiras sob cobertura da “Constituição Jessina” de Fevereiro de 2010, uma das mais atípicas, onde não se percebe bem o sistema de governo, a sua prática, a forma eleitoral e a legitimidade de actuação.


Fonte: Folha8


Pode afirmar-se, com o testemunho da história, que uma verdadeira revisão constitucional, em países democráticas, decorre sempre sob a égide de uma Assembleia Constituinte e não de uma composição partidocrata, como ocorreu com a actual, visando acobertar apenas um homem: o presidente do MPLA e da República.


Numa Constituinte estão representadas delegações de todas as classes existentes, isto é, dos partidários, aos intelectuais, aos técnicos, aos militares, dos letrados e do povo.


De norte a sul do País todas as cidades e comunas se deviam fazer representar com procuradores eleitos. Assim se formaria uma representação vasta, diversificada, independente e livre, através dos mais notáveis valores sociais.


Para além da autonomia administrativa é numa Assembleia Constituinte, com o contributo de todos os seus componentes, que se geravam as principais regras gerais que moldariam a colectividade no que se chama “Lei Fundamental”.

 

Numa verdadeira revisão da Constituição os governantes são meros administradores temporários dos interesses do colectivo, desta forma o Presidente governa, a Nação administra-se. O Presidente coloca-se como presidente de todos angolanos e não dos angolanos do partido no poder e quando assim é governa, cumprindo a Constituição efectuando uma clara distribuição da justiça e pela defesa do solo a unidade necessária à segurança de todos.

 

O País administra-se, realizando a multiplicidade dos seus interesses na multiplicidade dos vários órgãos que legitimamente os exprimem. Só se é soberano dentro de processos transparentes e elaborados com lissura, salvo contrário está-se na suspeição.


E a actual Constituição é um manto de suspeição, estou farto de o repetir, desde logo se diz estarmos num regime presidencialista, onde não se elege um presidente mas uma lista de candidatos a deputados, apresentadas por partidos políticos.


Assim sendo e no rigor do constitucionalismo democrático, estamos diante de eleições legislativas, que atipicamente, no caso angolano, colocam no cume da sua lista um cidadão qualquer em sua representação, que mais tarde, em caso de vitória da lista, assume a mais alta magistratura do país.


Ora uma estratégia governista de revisão constitucional, sempre cria problemas para o futuro daqueles que não se revêem na formatação partidocrata, onde impera a desorganização e o oportunismo político.


Assim o oportunismo de se vetar uma Assembleia Constituinte, substituida por uma representação numérica partidocrata, decretou a pena de morte a uma verdadeira democracia, abrindo brechas a todo sorte de arbitrariedades.


Tanto assim é que a amplitude das competências atribuidas ao Presidente da República, não constituem hoje, uma fonte de equilibrios ou de estabilidade, pelo contrário. Hoje assistimos a uma anarquia constitucional, desfeitas que foram as bases de equilibrios, imprescíndiveis em democracia, com a instauração da partidocracia dirigente ao seu mais alto nível.


A actual Assembleia Nacional não fiscaliza o executivo, por não estar estruturada para tal, por conseguinte não é possível um controlo aos desvios da rés-pública.


Uma nova Constituição, de que aliás os povos angolanos andam carecidos, é absolutamente distinto do mísero e insignificante arranjo que nos foi imposto: a Constituição é coisa grande demais, diria o meu amigo Mário Saraiva, para que se confie a membros de um partido político, por mais categorizados eles fossem.

 

O País que trabalha e pensa não deveria ficar de fora de qualquer Assembleia de poderes constituintes. Num Estado de Direito, o respeito a lei e a democracia são importantes, como forma de se acautelar situações que possam manchar a imagem do País.


É claro que na forma republicana podem acontecer incapacidades nas pessoas dos presidentes. Seres humanos que são, não estão imunes a doenças de incidência mental e outras, mas aqui torna-se embaraçosa, por ter tudo sido feito visando “alojar” um homem.


Efectivamente, a Constituição angolana de Fevereiro de 2010, não prevê a hipotese de um presidente sofrer de perturbações mentais que o tornem inapto a exercer funções. É omissa a tal respeito. Não é fácil supor o processo a usar para afastar do poder um presidente adoecido mentalmente. E este ponto deveria ser acautelado, até mesmo pela experiência vivida em 1979, com o passamento inesperado de Agostinho Neto.


Se um dia voltar a ocorrer em Angola, tal como Sariva previu, ter-se-à de fazer ad hoc uma apressada revisão constitucional, criando um novo artigo referindo a destituição? Aí está um caso que deveria preocupar os futuros legisladores.


O que até certo ponto surpreende é que os ilustres deputados do MPLA sem mandato dos eleitores em 2008, na sua presciência, não se esqueceram (desígnios de Deus ou do Diabo?) da eventualidade, mais improvavél do que a doença, quanto a nós, de aparecer e sermos governados por um presidente criminoso e ou ladrão.


O n.º 1 do art.º 127.º da Constituição diz o seguinte: “O Presidente da República não é responsável pelos actos praticados no exercício das suas funções, salvo em caso de suborno, traição à Pátria e prática de crimes definidos pela presente Constituição como imprescritíveis e insusceptíveis de amnistia”.


Ora, o sublinhado é nosso é que ainda fazendo, o homem pode, pelos seus companheirios de partido ser perdoado, amnistiado, numa só palavra a República de Angola, agora que vai a votos admite constitucionalmente a presidi-la um criminoso.


Comentários? Não os faço. Deicxo-os ao cuidado dos cidadãos angolanos, aos quais o assunto mais respeito por estar relacionado com o nosso futuro.