Lisboa – O excesso de irregularidades e violações as lei que a Comissão Nacional Eleitoral de Angola (CNE) tem estado a incorrer está a ser considerada como propositada, no sentido de privilegiar um das partes (le-se partido), a quem a presidência desta instituição revela-se comprometida. A conclusão é apoiada num competente levantamento em torno do processo.
Fonte: Club-k.net
Durante o mês de Junho, por exemplo, o processo eleitoral conheceu, em síntese, as seguintes violações à lei:
a) Violação à Constituição – A Constituição confere à Assembleia Nacional reserva absoluta para legislar sobre eleições (art.º 164º (d)). A CNE substituíu-se à Assembleia Nacional, e “legislou”, sob a capa de “regulamento do voto antecipado”. A CNE conferiu a certos grupos sociais ou profissionais, incluindo militares, cidadãos residentes no exterior, polícias, presos, doentes, diplomatas, etc., o direito de votar antes do dia 31 de Agosto. Segundo a CNE, estas pessoas votarão sem cadernos eleitorais, quando a lei estabelece que, sem cadernos eleitorais, não deve haver eleição (nº 1 do artigo 106º da Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais).
b) Violação à Constituição: Ao estabelecer o sistema eleitoral angolano, a Constituição consagra, no seu artigo 143º, o direito de voto apenas para os angolanos residentes no território nacional, e considera como tais os angolanos residentes no estrangeiro por motivos de serviço, estudos, doença, ou similares. Nesse sentido, todos os angolanos nessas condições “são iguais perante a Constituição e a lei” e gozam dos mesmos “direitos, liberdades, garantias e protecção do Estado”. A CNE “legislou” que certos angolanos no exterior, que se registaram, podem exercer o direito de voto, em 2012, e outros não. Não tendo havido registo eleitoral no estrangeiro, para todos os que lá estão a estudar ou a trabalhar, viola-se o princípio da igualdade ao “regular-se” que apenas uns votem e outros não. De facto, somente aqueles que têm dinheiro para viajar e registar-se ao país, poderão votar. Se estes angolanos registram-se em Angola, então deveriam ir votar a Angola. Nos termos do artigo 9º da Lei do Registo Eleitoral, o registo deve fazer-se tanto em Angola como no exterior, exactamente para permitir a votação de todos os angolanos que residam no estrangeiro temporariamente, sem discriminações. Isto é consistente com o disposto no artigo 143º da CRA, que confere o direito de voto a todos os angolanos que residam no estrangeiro por razões de natureza temporária: serviço, estudo, doença ou outras situações também de natureza temporária, sem discriminações. A CNE quer que apenas alguns exerçam esse direito. Por isso, a CNE, ao aprovar tal Regulamento, violou o princípio da igualdade.
c) Violação à Lei 36/11 - A votação antecipada, nos moldes como regulada pela CNE, será feita sem cadernos eleitorais. A lei estabelece que a ausência de cadernos eleitorais é causa para não se realizar a eleição (nº 1 do artigo 106º da Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais).
d) Violação à lei 36/11 – A lei estabelece que cada pessoa só deve votar uma vez. A votação antecipada, nos moldes como aprovada pela CNE, traz consigo um sério risco de os eleitores votarem duas ou mais vezes. Sem cadernos eleitorais digitais, funcionando em rede para permitir que se deia baixa automática dos votantes nos cadernos eleitorais, não será possível evitar que todos os eleitores que votaram antecipadamente, voltem a votar no dia da eleição.
e) Violação à lei 36/11 – No artigo 98º, esta lei estabelece o “direito à dispensa” para todos. E manda que todas as entidades públicas e privadas, organizem as suas actividades de modo a possibilitar aos seus trabalhadores e funcionários o exercício livre do direito de voto no dia da eleição (artigo 4º). A CNE ignorou estas disposições e estabeleceu para extensos grupos sociais e profissionais o direito ao voto antecipado. Apesar de definir o voto antecipado como uma “contingência” excepcional a ser pedida pelo eleitor, os militares e polícias estão a ser forçados pelos seus superiores hierárquicos a dar os seus dados pessoais de registo eleitoral a terceiros para fins fraudulentos. A CNE está a ser conivente com a prática de sérias infracções eleitorais, nomeadamente coacção, artifício fraudulento sobre o eleitor, abuso no exercício de funções e corrupção eleitoral, todas previstas no Capítulo II da referida lei.
f) Violação à lei da contratação pública – a CNE publicou no Jornal de Angola, em 8 e 9 de Junho, o anúncio da abertura de um processo negocial (concurso) para seleccionar uma empresa idónea para fornecer serviços de logística eleitoral. A Lei da Contratação Pública, Lei 20/10 de 07 de Setembro (referida no anúncio), estabelece no número 5 do seu artigo 59º, que sempre que o concurso estiver aberto a entidades estrangeiras, o respectivo anúncio deve, também, ser divulgado através de meios que, comprovadamente, levem a informação aos mercados internacionais. O Jornal de Angola, não é um "meio que, comprovadamente, leva a informação aos mercados internacionais", porque o Jornal de Angola online não mostra aos mercados internacionais as páginas de anúncios. O anúncio também não foi publicado na página da internet da CNE. Das nove empresas (das quais quatro estrangeiras) que manifestaram interesse no anúncio, apenas uma foi avaliada como cumpridora de todos os requisitos e apenas essa foi solicitada a apresentar uma proposta. Esta empresa é a espanhola INDRA, a mesma que fora contratada em 2008, em consórcio com a Valleysoft, e que ajudou JES a fazer a fraude.
g) Violação à lei da contratação pública e à lei orgânica sobre a organização e funcionamento da CNE – Três das empresas desqualificadas reclamaram da decisão da CNE. O Plenário da CNE não conheceu tais reclamações. O recurso foi conhecido e decidido pela mesma Comissão da qual se reclamou, presidida por Edeltrudes Costa.
h) Violação à lei da contratação pública – Houve uma só proposta; a CNE não deu a conhecer a sua decisão aos demais concorrentes, nem informou aos reclamantes sobre a decisão que recaíu sobre as respectivas reclamações. Ademais, o Relatório da Comissão de Avaliação refere que houve “duas reclamações”, apresentadas “fora do prazo legal” quando de facto, houve “três reclamações”, uma delas apresentada dentro do prazo legal. A referida Comissão também cometeu fraude.
Além destas violações à lei, durante o mês de Junho, registaram-se também os seguintes incumprimentos da parte da CNE:
a) Lista dos eleitores - No final do período de actualização do registo e até à presente data, não foram expostas as listas dos eleitores registados, para efeitos de reclamação e correcção, como manda a lei do registo eleitoral (Lei nº 3/05, de 1 de Julho) nos seus artigos 46º, 48º e 49º. Assim, os cadernos eleitorais deverão conter muitos erros e omissões, que talvez não possam mais ser corrigidos em tempo útil.
b) Auditoria aos programas e dados do registo eleitoral – A lei manda a CNE fazer uma auditoria aos programas informáticos, base de dados e demais elementos relativos ao registo eleitoral, que foram mantidos pelo MAT. Esta auditoria deveria ter sido realizada por uma firma especializada independente, antes do MAT transferir para a CNE a custódia dos arquivos e dos programas informáticos em 15 de Maio. O MAT fez essa transferência sem a auditoria ter sido feita. A CNE escolheu a Delloite para fazer tal auditoria, uma firma cuja conduta em Angola não a qualifica como independente do Executivo. Anunciou que a auditoria estava em curso, mas até hoje, a CNE ainda não publicou o resultado da auditoria.
c) Definição dos sistemas de transmissão e tratamento de dados eleitorais – A Lei Orgânica sobre a Organização e Funcionamento da CNE (Lei 12/12), no seu artigo 71º, estabelece o prazo de 60 dias, para a CNE definir os sistemas de transmissão e tratamento de dados eleitorais e os procedimentos de controlo a utilizar nas actividades de apuramento e escrutínio das eleições gerais de 2012. Este prazo terminou em 13 de Junho, sem a CNE ter feito tal definição.
d) Definição da estrutura, organização e funcionamento dos centros de escrutínio - De igual modo, o artigo 30º da mesma lei, estabelece o prazo de 30 dias para a CNE estabelecer e publicitar a estrutura, a organização e o funcionamento dos centros de escrutínio. Este prazo terminou em 30 de Junho. A CNE aprovou um Regulamento, mas tal escrutura não foi estabelecida em conformidade com os artigos 116º e 117º da Lei Orgânica Sobre as Eleições Gerais. A estrutura aprovada pela CNE, não reflecte a composição e a natureza da CNE, como manda a lei. Os sistemas de transmissão e os procedimentos de controlo estabelecidos, ofendem a lei.
e) Observadores eleitorais - O artigo 11º da Lei da Observação Eleitoral (Lei nº 11/12, de 22 de Março), manda a CNE definir o número máximo de observadores internacionais a a serem convidados, até 30 dias antes do início do período de obervação. Este prazo teminou no passado dia 1 de Julho. E a CNE não estabeleceu tal definição.
Com Silva Neto ou Suzana Inglês à cabeça, tudo indica que a CNE vai continuar a subverter, desprezar e violar a lei, antes e durante a eleição, porque no entendidos na material, esta CNE, pelo seu funcionamento, está a demonstrar aos angolanos que ainda não é a Comissão Nacional Eleitoral independente do artigo 107º da Constituição.