Luanda - Fiquei impressionado com o aparente conhecimento do Sr. Boaventura Araújo sobre a matéria que tem que ver com a cegueira. Porém, parece que às vezes ser cego é cegar nossa ignorância à cegueira do nosso próximo: eis a vantagem de se ser cego, não nos apresentamos ao mundo como os detentores da visão lúcida.

Fonte: Club-k.net

Quando abordou a questão da manifestação do MPLA no estádio 11 de Novembro que visava apoiar e saudar a candidatura do seu líder JES e os números de pessoas presentes naquele acto, que se ligam e desligam das informações veiculadas, dependendo da crença “deles” e “sua”, notei algo interessante: a exaltação da sua crença em relação àquela defendida pelos militantes do MPLA.

Embora, seja capaz de encarar legitimidade nessa sua intenção propositada, porém infeliz por retractar a cegueira dos outros lá da outra banda do oceano das crenças, critico o facto de se ter esquecido de um pormenor, ilustro através de uma célebre frase do escritor e crítico francês do século XX Anatole France que dizia "O homem não crê no que é, crê no que ele deseja que seja." Os do MPLA crêm naquilo que desejam que seja o MPLA, ou seja, o partido das massas. A UNITA, de igual modo crê na sua “missão natural” de governar Angola.

Quanto à famosa frase “O pior cego é aquele que não quer ver”, impõem-se algumas questões: Quem define o que devo ver? E, não querer ver é uma liberdade do fórum individual ou é uma esfera que o colectivo regula? Que dogmas definem o que é realmente bom para se ver e crer? Em tudo isso, talvez não seja necessária uma resposta para cada uma das perguntas, porque é minha intenção evitar a divagação. Mas deixo um conselho que julgo vir mesmo a calhar: Não questione as crenças alheias.

Quanto ao seu apelo à felicidade daqueles que crêem o que o Sr. Boaventura não crê, o que considero outro erro de análise, se considerarmos que a felicidade em si mesma encerra diversas facetas, interpretações e até formas, digo-lhe que cada um é feliz à sua maneira. Deve haver pessoas felizes no celibato, na guerra, no caos, na prisão, ou como dizia Sigmund Freud, o pai da psicanálise "A felicidade é um problema individual. Aqui, nenhum conselho é válido. Cada um deve procurar, por si, tornar-se feliz."

Por último, que cada um viva de acordo com suas crenças, desde que não atentem contra a continuidade da humanidade.

Aurélio Quintas