Luanda - A poucos meses atrás, o jornal Semanário Angolense dedicou uma das suas edições à um tema que fez jorrar muita tinta de lapiseiras e queimou milhares de neurôneos: “o adiamento das Eleições Gerais de 2012”.

 
Fonte: Club-k.net

Aquilo não foi um acto de informar os leitores mas sim um apelo estratégico com fins inconfessos.

 
Na sua mais hábil forma de exercer o jornalismo opinionado e com a ajuda de uma meia dúzia de comunicólogos, o Semanário Angolense, justificou a temática daquela edição, dentre outras explicações, pelo facto de que muito tempo se desperdiçava no caso da Dr. Suzana Inglês, que acredito ainda não ter se recomposto do trauma da mesma experiência.


Ao contrário do título deste texto, sou de opinião de que boicotar ou anular as Eleições Gerais de 31 de Agosto de 2012, não será de benefício do interesse comum de um povo que tanto almeja a mudança, apesar de termos mais de mil motivos para o boicote.


Saliento que para além de não aconselhar o boicote ou anulação das eleições, acredito que a abstenção e/ou o voto em branco, por mais que são constitucionalmente de direito de cada angolano, não servirão de elementos ou métodos catalizadores no alcance da mudança e de um Estado Democrático e de Direito na República de Angola.


Razões para o boicote

 

Será que temos mesmo razões de boicote das eleições de 31 de Agosto de 2012? Sim, temos e eu explico:


Os trabalhos feitos pelo Ministério da Administração e Território (MAT), pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE) e o Tribunal Constitucional (TC) no corrente processo de preparação do pleito eleitoral, mesmo na falta de uma observação microscópica, deixa muito a desejar.


A fraude eleitoral é evidente mesmo para os menos atentos, e esclareço que ela não acontece apenas no dia do voto, na contagem das mesmas e na manipulação dos resultados anunciados.


A fraude começa logo durante o processo eleitoral: o caso Suzana Inglês e a não anulação das decisões que ela tomou aquando da sua presidência illegal na CNE; A usurpação de poderes da CNE pelo MAT, o registo eleitoral e a sua logística; A falta de transparência no concurso público de empresas que prestam serviços eleitorais (muitas das empresas alegadamente pertencentes a membros do partido no poder); A persistência na utilização dos serviços da empresa espanhola, Indra, que alegadamente ajudou na fraude das eleições de 2008; O secretismo à volta do Ficheiro Central do Registo Eleitoral (FICRE) e dos Cadernos Eleitorais e a não divulgação das mesmas a tempo útil; O processo de auditoria dos dados do FICRE e dos cadernos eleitorias; Por não terem acesso ao FICRE, muitos partidos da oposição tiveram que engolir sapos e aceitarem, mesmo sem verificarem no FICRE, a rejeição das suas candidaturas pelo TC que alegou a não existência de milhares de assinaturas no sistema.


E tem mais, segundo reportagem, a CNE prevê instalar 10.349 assembleias de voto, 25.359 mesas de voto e igual número de cadernos eleitorais. Questiono: Será que haverão actas onde todos os membros das mesas assinarão e sera que afixar-se-á imediatamente as mesmas actas na porta onde se realizarão os votos?


Divulgou-se uma agregação de 9.757.671 eleitores no mapa entregue aos partidos políticos e coligações de partidos concorrentes às eleições. Questiono: Na falta de divulgação dos cadernos eleitorais para que os eleitores verifiquem se constam ou não nos mesmos, sera que é coerente determinar a quantidade de 25.359 cadernos eleitorais? É coerente determinar as 10.349 assembleias de voto mesmo sem saber de uma estimativa comprovada de eleitores, que deve ser feita após publicações dos cadernos eleitorias?

 
Na minha óptica, o anúncio da realização do voto na diáspora foi apenas mais um dos bálsamos para apaziguar as reivindicações da comunidade angolana no exterior do país.


Sabia-se de antecedência que este ano não haveria voto na diaspora angolana, tudo porque esperou-se até o último minuto para os génios da CNE, e porque não do MAT, perceberem que não haviam condições humanas e logísticas para a realização do voto, para além do registo eleitoral que nunca foi feito.


Surpreendemente, mesmo após um extenso processo de registo eleitoral que contou com prorrogações, a CNE iniciou no dia 25 de Julho, a emissão de segunda via de cartões de eleitor para as pessoas que extraviaram ou danificaram os seus cartões. Apenas resta-me perguntar onde é que realmente este processo de registo eleitoral irá culminar visto que estamos por aí a um mês para o pleito eleitoral.

 
Essas e outras causas, são actos de injustiça que constituem fraudes realizadas durante a processo de preparação eleitoral.

 

Razões para não boicotar

 

Antes de mencionar as razões para não boicotar as eleições, reitero que o exercício da abstenção e do voto em branco, constitui um disperdício de esforços quando ainda existem partidos a que podem merecer o voto, por mais que seja o direito de cada cidadão, porque um voto consciente faz a diferença e Angola precisa de voto de cada eleitor para definir o seu futuro.


O boicote das eleições deste ano, não será do benefício do interesse do povo angolano porque para além da fraude, o regime criou mecanismos que possibilitarão a criação de uma legitimidade falsa para a sua continuidade.

 
No caso da desistência ou boicote por parte de alguns partidos políticos da oposição e coligações como a UNITA, a CASA-CE e o PRS, existem partidos que foram criados meramente para superar esse possível incidente.


Na ausência de uma oposição verdadeira, existem actualmente partidos ou coligações fantasmas que irão concorrer somente para manterem o regime no poder.


Boicotar as eleições implicará a criação de um cenário onde o partido no poder irá concorrer com o próprio partido no poder por mera razão de se realizarem eleições e defender a legitimidade da sua permanência com outros partidos fictícios.


E no caso de realização de eleições onde o regime concorre com o próprio regime, tudo que advir das mesmas eleições deverá ser aceite, por leis atípicas que já existem, por todos os cidadãos angolanos, o que pode prolongar a concretização da democracia em Angola.

 
Em suma, deve-se participar nas eleições mas também deve-se redobrar os esforços e a vigilância na minimização da fraude existente, e a observação e exposição de qualquer acto fraudulento que possa minar as eleições deste ano.


Então, vamos boicotar as eleições?