Luanda - Temos assistido, nos últimos dias, a uma gritante histeria por parte de indivíduos que, a coberto de estranhos pseudónimos e dos mais espalhafatosos argumentos, não pretendem mais senão branquear a imagem dos administradores da Rádio Nacional de Angola (RNA) exonerados em Junho passado por despacho presidencial e substituídos por um novo Conselho de Administração. A algazarra é tanta que já não é possível, a quem como nós conhece profundamente este dossier e tudo quanto lhe está subjacente, continuar a fazer orelhas moucas, aceitando passivamente o estendal de inverdades que tem estado a ser despejado sobre a nova liderança da principal estação emissora do país.


Fonte: Club-k.net


Há que dizer, na realidade, que quando se instituíram os conselhos de administração nos distintos órgãos de comunicação social públicos, o objectivo central em vista era o de pôr fim a uma era em que tais empresas, operando em conformidade com critérios de gestão tradicionais e acanhados,  e sempre ao “colo” da tutela governamental, não estavam em condições de dar o pretendido salto para a modernidade.

De acordo com a nova filosofia, os administradores deviam ser capazes de banir práticas antigas que transformavam os órgãos em empresas pouco mais do que artesanais, e, por outro lado, mediante  a introdução de novos métodos de gestão, proporcionar-lhes autonomia suficiente para levá-los a obter níveis de rentabilidade económico-financeira que afastasse para bem longe o rótulo negativo de serem meros sorvedouros de recursos do Estado.

Não decorreu muito tempo após terem sido investidos os  conselhos de administração dos órgãos de comunicação social públicos, para que se constatasse que os objectivos visados estavam a ser, mais do que postergados, pervertidos no que diz respeito à linha de rumo que a RNA vinha seguindo. No consulado de Pedro Cabral subsistia a mesma “baderna” em matéria de gestão patrimonial e financeira, enquanto a pretendida modernização a nível dos conteúdos radiodifundidos estava muito longe de se efectivar.

Relativamente a este aspecto último, cedo ficou à mostra que Pedro Cabral e pares não estavam fadados para dar o salto em frente. Mas foi em relação ao processo eleitoral que se tornou ainda mais evidente que a RNA acabaria por destoar dos objectivos gerais definidos para a cobertura eleitoral, como se sabe, perspectivada em conformidade com critérios de equidade e o mais democráticos possíveis. Pelo contrário, neste particular a RNA teria batido completamente no fundo, seguindo em contramão com o que a sociedade exigia, se não tivesse havido a mudança que, imperiosamente, foi necessário fazer, com o despacho presidencial que exonerou o Conselho de Administração que teve à cabeça Pedro Cabral.

Mas impõe-se dizer que a necessidade de proporcionar pluralismo e equidade à cobertura eleitoral pela RNA foi somente o mote para a exoneração. Houve, porém, outro conjunto de razões justificativas, que as autoridades terão achado por bem não divulgar. E foi esse “resto” que não veio a público, que se constituiu no “lodaçal” em que o anterior Conselho de Administração se afundou por completo.

Antes mesmo de Pedro Cabral e pares terem sido exonerados, existiam já fortes evidências de irregularidades  administrativas e financeiras. Muitos buracos mesmo. De modo que mal foram apeados (e é pena que isso não tenha vindo a público), a diligência imediata do Conselho de Administração investido em funções foi fazer um levantamento exaustivo sobre o estado da RNA, cujas contas, para começo de conversa, estavam na zona vermelha. Saldo negativo!

E não é para menos. O levantamento ainda não foi cabalmente concluído, mas um relatório preliminar de circulação restrita, a que o autor destas linhas teve acesso, aponta já para gravosos problemas. Mal entrou em funções, a nova administração da Rádio se deparou com a grande batata quente dos salários, que ameaçava pôr a generalidade dos funcionários em rota de colisão com a Direcção.

É que, por erro de cálculo, o anterior elenco administrativo orçamentou como valor suficiente para fazer face aos salários apenas 385 milhões de kwanzas. Na realidade, eram necessários 418 milhões de kwanzas, o que originou um deficit de 33 milhões de kwanzas. O actual Conselho de Administração está a tentar dar o melhor encaminhamento a esse problema que lhe caiu ao colo como um bebé desmamado...

Segue-se o “descaminho” de 5.777.000 kwanzas que o ISEP afectou à RNA. Esta verba, foi verificar-se, acabou por ter destino incerto e que nada tem a ver com as eleições. O grosso do montante foi indevidamente movimentado pelo então Conselho de Administração numa altura em que, já se tendo verificado a exoneração processava-se a troca de pastas com o novo elenco administrativo, apesar de haver uma recomendação expressa para o cancelamento de movimentações bancárias.

Em face disso, a RNA acabou sem suprimento financeiro para cumprir devidamente as suas obrigações em matéria de cobertura eleitoral. Do Ministério da Economia já veio o aviso de que os cofres estão fechados e que já não seriam disponibilizados novos fundos à RNA para tal efeito.

No que diz respeito à situação patrimonial, outros problemas, a começar por um autêntico saque efectuado ao parque automóvel da empresa.Os membros da administração cessante não tiveram mãos a medir, quando souberam da exoneração, e apropriaram-se de 27 viaturas (de função e de serviço) que haviam sido postas à sua disposição, sem que tivesse chegado o tempo que a lei prevê para abate à carga. Aliás, haviam sido adquiridas um mês antes de cessarem funções.  O toque de saque contagiou outros directores da RNA que levaram para casa sem mais nem ontem 30 Toyotas Prado.

Digamos que neste momento o parque automóvel da RNA, mesmo aquele que se destina a apoiar serviços de um modo geral, incluindo reportagens, está completamente desfalcado. Tamanha foi a incúria que cada administrador acaparou-se de três carros para proveito pessoal, tendo também abatido à carga um sem-número de outras viaturas aos funcionários sem o aval do Ministério das Finanças. Não se podia esperar outra coisa de um PCA (Pedro Cabral) que se deu ao desplante de pagar 40 mil dólares a título de reparação de um Toyota Corolla da sua secretária, alegadamente após acidente sofrido no trajecto casa-serviço.

Mas se fossem apenas carros, a coisa talvez passasse. Os danos patrimoniais estenderam-se a meios muito mais sensíveis para o funcionamento de uma empresa estratégica para a política de informação do Estado. Todo o mundo na RNA está de saber que os emissores repetidores e centros de produção inaugurados por Pedro Cabral praticamente não funcionam.

Como se pode depreender deste levantamento, aqui visto de forma superficial, não há razão para as lamúrias feitas em torno da exoneração da administração (mal) capitaneada por Pedro Cabral. Ela foi determinada por razões ponderosas assentes numa gestão ruinosa de que a RNA estava a ser objecto, e que ameaçava descambar a todo instante num descontentamento generalizado dos trabalhadores em geral.

Muito menos fazem sentido as alusões frequentes a Manuel Rabelais, algo que só poder ser visto como uma cortina de fumo destinada a disfarçar o ror de irregularidades acima aludido. Manuel Rabelais, que já não é director da RNA desde Janeiro de 2005, não está investido de competência alguma para exonerar ou nomear os conselhos de administração dos órgãos de informação públicos.

Olhando ainda para o caso na perspectiva do “dia seguinte”, faz igualmente pouco sentido o escarcéu desencadeado pela administração cessante. O mundo não acabou com a entrada em funções de um novo elenco administrativo na Rádio. A vida continua. E por isso mesmo é que Pedro Cabral e equipa foram nomeados pelo actual Conselho de Administração como assessores e assistentes de direcção.

Estes senhores esqueceram-se que eles próprios, quando em funções, não tiveram sensibilidade para pensar no “day after” das pessoas. Por exemplo, não foi o Conselho de Administração cessante que entendeu, sabe-se lá por que carga de água, anular o “protocolo de Lobito”? Um instrumento que dava direito aos directores cessantes, que tivessem permanecido mais de três anos em funções, de manter os salários e regalias que tinham. E esta?!

Recordemos, para concluir esta estória tragicómica, que o relatório e contas da RNA para o exercício de 2011, elaborado pelo Conselho de  Administração cessante, foi chumbado pelo Ministério da Economia. Só por aí, é caso para esperar que os seus “zelosos” membros venham provavelmente a ser chamados à pedra, tendo de justificar os danos causados à nossa mui querida Radiodifusão Nacional de Angola.