Luanda  - O resultado das eleições legislativas angolanas já era esperado: venceu o partido MPLA (Movimento Popular de Libertação Nacional), liderado por José Eduardo dos Santos, estando o primeiro no poder há 37 anos e o segundo há 33.


Fonte: AIU

Sempre existirão dúvidas se José Eduardo dos Santos conseguiria alguma vez ganhar eleições presidenciais transparentes, unipessoais e directas, sendo que estando previstas para o ano de 2009, num “golpe palaciano republicano”, aprovou uma Constituição que não constava em programa eleitoral algum, ferindo a nascença, naquilo a que alguns apelidam de III Republica (historicamente, a Republica Atípica), pois torna as eleições legislativas naquelas que igualmente conferem o poder ao Presidente e Vice-Presidente (poder executivo) do pais. O entusiasmo do público que ratificou o governo de José Eduardo dos Santos durante três décadas, em especial, aqueles que apoiaram na última, a época de paz (2002-2012) desapareceu, algo demonstrado pelo fraco desempenho do seu partido, MPLA, nas recentes eleições a Assembleia Nacional e as fugas a legalidade provocadas de forma propositada pela Comissão Nacional Eleitoral, controlada de forma explicita pela Presidência da Republica Angolana com o forte receio de que uma grande descida percentual arrastasse o país para uma crise de contornos indefinidos. Aliás, como governaria Eduardo dos Santos em minoria, se não consegue governar com maiorias acima de 60%?


Ao contrário da Europa, assolada por uma crise de dívida soberana, e dos Estados Unidos, cujos líderes discutem sobre a contenção do seu défice, Angola assemelha-se para alguns a um oásis de estabilidade e continuidade. Mas essa continuidade lembra mais a Primavera Marcelista, ou estagnação, da era Salazarista (Estado Novo).


Os dez anos com um crescimento médio anual do PIB de 11%, durante o governo sustentado com duas maiorias parlamentares, alegadamente fraudulentas (1992-2007 e 2008-2012), permitiram à Angola pagar algumas dívidas, acumular quase 20 biliões de dólares em reservas de moeda estrangeira e juntar-se às principais economias emergentes. Entretanto, o “Escândalo Financeiro do BNA”, e a gestão não transparente da equipa económica, demonstrada hoje na riqueza dos mesmos, do ex Ministro Adjunto do 1º Ministro, Aguinaldo Jaime, ex Ministro das Finanças, José Pedro de Morais e ex Governador do Banco Central (BNA – Banco Nacional de Angola), Amadeu Maurício, sem contar com o decréscimo do preço do petróleo, o nepotismo, caciquismo, gestão e negócios danosos para o Estado, incompetência governativa, parece ter deixado o país de rastos, hoje sustentado pelas linhas de crédito chinesas, por enquanto que os seus líderes gabaram-se de que o Estado poderia resistir à crise financeira de 2008 (vide declarações de Aguinaldo Jaime).

Dados os fundamentos económicos de Angola, a diminuição da popularidade de José Eduardo dos Santos não pode parecer surpreendente. Em recente estudo, foi apresentado como o mais impopular líder de África (Gallup). As previsões do Fundo Monetário Internacional, que apontam para 7% de crescimento de 2012 a 2020, posicionam Angola bem aquém daquilo que seria necessário para combater as fossas de pobreza (apontadas pelo Presidente como “dois dígitos” de PIB, ou seja, acima dos 10%), em parte provocadas pela gestão danosa e desvio de fundos, hoje aplicados em controlar o sector financeiro e da informação português (mais de 10 biliões de dólares provenientes de Angola em menos de 10 anos (todos os grandes bancos lusitanos têm capital angolano e a compra do grupo de Radiotelevisão Portuguesa que transmitiu em directo todo cerimonial de tomada de posse do Presidente Angolano, em 2012, na RTP 2 e RTP África, algo que não ocorre com nenhum outro país (africano e não africano, devido ao investimento na Impresa, Zap, Zon e Tv Cabo) e não acontece com o Chefe de Estado do próprio país). Além disso, o Orçamento Geral de Estado angolano aparece desequilibrado, no que consta ao preço do petróleo que aparece avaliado em aproximadamente 100, não contabiliza de forma realista a venda de barris e está avaliado em 10 biliões de dólares, valor muito abaixo dos 101 biliões de dólares estimado em PIB pelo Banco Mundial e pela Organização Mundial do Comercio.

As tendências a longo prazo também pioraram. O “Boom” demográfico presente desde o fim do conflito armado, embora a mortalidade infantil e mortes por parto sejam igualmente elevados, não possibilitaram ao Executivo a introdução da maioria da população no sector industrial e de serviços, nem os licenciados que engrossam cada vez mais o grupo de descontentes, devido ao “mercantilismo” na obtenção de promoções, nomeações ou mesmo simples empregos. Na verdade, o índice de desemprego é tão elevado que existindo uma vasta equipa económica (Ministérios Económicos: Finanças, Planeamento, Economia, Administração Pública – Emprego e Segurança Social, Banco Central e por vezes, uma equipa de Estado denominada Coordenação Económica e a Sonangol), por questões estratégicas, que poderiam destroçar ainda mais a moral do Executivo, não existem projecções nacionais, nem internacionais, entregues a OIT (Organização Internacional do Trabalho), sobre a taxa de Desemprego, Emprego, Peso do Estado e Peso dos Privados a nível urbano e rural.


Angola continua a ser essencialmente um "Estado Rendeiro" – isto é, um estado cuja principal fonte de receitas são as rendas – neste caso, de petróleo, gás diamantes – ao invés dos impostos, mantendo assim à distância as exigências de representação política. Em vez disso, o Estado é o alvo de empresários políticos que se empenham em conquistá-lo, a fim de obter as rendas que ele controla. Daí a total falta de transparência neste área.


O país tem a maioria das características habituais dos estados rendeiros: autocracia, instituições políticas e judiciais fracas, governo arbitrário, ausência de um Estado de direito, pouca transparência, restrições à liberdade de expressão, corrupção generalizada, clientelismo, caciquismo e nepotismo. Também comuns aos Estados rendeiros são os horizontes curtos de investimento, a vulnerabilidade à volatilidade dos preços dos produtos de base – ficando eufóricos com a sua subida e entrando em crise quando descem – e um sector industrial subdesenvolvido e pouco competitivo.

O Investimento externo, embora crescente, teme a burocracia, corrupção e ligações em teia, daí tentar sempre “retirar” os seus lucros e dividendos da forma mais engenhosa como “royalties, receitas de propriedade intelectual e taxas de licenciamento em paraíso fiscal.

O ex “El Dourado” de hoje é um reservatório gigante de matéria-prima e a sua economia depende em larga escala dos seus produtos primários – indústria mineira e perfuração petrolífera. Angola é o segundo maior exportador africano de petróleo e precisa urgentemente de encontrar comprador para o seu gás proveniente do Projecto Angola LNG, no Soyo, possuindo enormes reservas comprovadas de gás (em perigo devido a descoberta de outras reservas de exploração muito mais baixa). Estes produtos representam mais de dois terços das receitas de exportação do país e são a principal fonte de receita do Estado, entretanto mal distribuído e razão da fortuna demonstrada por cidadãos angolanos em especial em Portugal, Inglaterra, EUA, França e África do Sul.

O impacto sobre a governança é demasiado previsível. Em 2011, a organização Transparência Internacional, na sua Análise do Ìndice de Percepção de Corrupção, posicionou o pais em 172.º lugar num total de 182 países, a par com a Nigéria, Guiné Equatorial, Iraque e Sudão, no que diz respeito ao "controlo da corrupção", um dos indicadores de governação a nível mundial do Banco Mundial. A relação com o FMI está praticamente destruída devido a incapacidade do Estado Angolano tornar claro quanto recebe de rendas da venda dos recursos naturais (em especial o petróleo, controlado pela família presidencial (antes nas mãos do sobrinho de Eduardo dos Santos, Manuel Vicente) e dos diamantes – daí aguardar-se com expectativa a aplicação da Lei Dodd-Frank) e que destino deu a mais de 32 biliões de dólares nos últimos anos. Em relação ao Estado de direito, tanto a ONU como o relatório dos EUA, são claros: não houve uma melhoria mínima, “é exercido um controlo apertado e centralizado sobre os órgãos de comunicação, existem prisões e agressões arbitrárias por parte das forças de segurança”.

Entretanto, a infra-estrutura está a desmoronar-se, até mesmo dentro da indústria extractiva vital, ao mesmo tempo que o fabrico não é competitivo a nível nacional quanto mais internacional. Os cientistas e investigadores, economistas, juristas nacionais não gozam de confiança por parte dos decisores que recorrem a “expatriados” que são efectivamente, no papel de consultores e assessores, a “mão-de-obra cinzenta” do país – “qualquer parecer, qualquer estudo, a própria Constituição da Republica, teve de ser desenhada em Portugal, daí o crescendo do racismo e xenofobia. No que consta a fiscalidade, vai encontrar sempre consultores brasileiros”. Com efeito, as universidades angolanas estão ausentes dos rankings africanos e mundiais e os angolanos que frequentam universidades em países ocidentais, normalmente ocupam espaços nas instituições menos bem quotadas e uma vez no país, mais facilmente são reconhecidos por empresas estrangeiras, do que pelas nacionais, cujos empregos “doces” (Sonangol, Ministério das Finanças, Alfandegas) estão dependentes da teia elitista, tal como a atribuição de bolsas de estudo internas e externas.


No que consta educação e competitividade, Angola tem uma posição fraca, estando muito atrás muitos países em desenvolvimento (todo sector financeiro é controlado pelo actual presidente). O mesmo se aplica à capacidade de inovação e à tecnologia (sectores condicionados a elite presidencial, como a Unitel, Movicel, Tv Cabo a semelhança do todo o sector financeiro nacional (BIC, BFA, BESA, BAI, Millennium).


Angola ainda está aquém do mundo subdesenvolvido no que diz respeito ao uso da Internet (quando comparado a Nigéria, os Congos, Zimbabwe, Namíbia e África do Sul), embora tenha a mesma proporcionado espaço para o discurso não regulamentado, permitindo aos utilizadores contornar o órgão noticioso oficial que é esmagadoramente pró – Regime. Devido a capacidade dos movimentos “on-line”, o regime tentou aprovar uma lei ditatorial de repressão, ameaçando prisões, mas, motivado pelo medo da “Primavera Árabe”, terá recuado, mas não terá desistido.


A transformação completa da economia angolana continua a ser duvidosa. Economistas independentes, ligados a Faculdade de Economia da Universidade Católica, em Luanda, afirmam que "as reformas significativas são altamente improváveis – pela simples razão de que iriam colidir com os interesses das elites dominantes em Angola. Em qualquer país rico em recursos e antidemocrático, a classe política e os interesses comerciais que o rodeiam têm pouco ou nenhum incentivo para apoiar direitos de propriedade mais fortes, Estado de direito e concorrência. Na verdade, essas mudanças estruturais iriam enfraquecer o domínio da elite no poder político e económico. O status quo – regras opacas, tomadas de decisão arbitrárias e défice de responsabilidade – permite o enriquecimento de quem está lá dentro, especialmente através da obtenção de uma percentagem das receitas da exportação de produtos".


Ao assinalar o trigésimo sétimo aniversário do fim do colonialismo, esta nação terá muito que comemorar. Infelizmente, o que não mudou vai dar-lhe muito com que se lamentar.


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