Luanda – Nas primeiras horas do dia começaram a circular na rede social fotos sobre um incêndio de grandes proporções, no supermercado Alimenta Angola, causado por um suposto curto-circuito. De repente a notícia fez manchete nos principais meios de informação - Incêndio destrói supermercado "Alimenta Angola" em Viana. Disse para mim mesmo ao ver a foto em anexo partilhada por Gilberto Sebastião no Facebook: “Mais um incêndio eléctrico!?…”

Fonte: Angola Power Services

Esse facto me trouxe a memória o incêndio dos armazéns da Macambira, Incêndio na Ilha de Luanda que afectou mais de 10 residências, etc.. devastados pela mesma suposta causa: O Curto-circuito.

Como profissional do sector eléctrico, sinto-me decepcionado por não podermos fazer nada que pudesse mitigar essa onda de acontecimentos. Do ponto de vista electrotécnico, existem normas e padrões a seguir de maneira a evitar ou prevenir que tais tragédias aconteçam regularmente na nossa sociedade. Por isso, resolvi escrever algumas linhas sobre a protecção contra incêndios eléctricos.

Os profissionais de electrotecnia em Angola, por várias vezes questionaram-se sobre as normas e padrões a adoptar para as instalações eléctricas. A não publicação de um código eléctrico nacional, tem permitido que as empresas executem as obras conforme a sua conveniência ou experiência e muitas vezes contra o que é regulamentado pelas instituições normativas de renome internacional como, IEC, IEEE, BS, NEC (NFPA 70), SABS, etc… 

É sabido que Angola herdou, do regime colonial Português, um sistema de instalações eléctricas que obedeciam a normas que hoje, em alguns casos, já encontram-se desajustadas a realidade tecnológica mundial. Portugal hoje é obrigado a seguir orientações normativas impostas pela União Europeia. Contudo, a grande questão persiste: Quais são as normas adoptadas por Angola para as instalações eléctricas nacionais? Caso existam, onde podem ser obtidas ou consultadas?

A “inexistência” de uma entidade reguladora por muitos anos, deu origem a uma salada russa do sector eléctrico Angolano conforme descrito no meu artigo – A salada russa do sector eléctrico Angolano - http://angolapowerservices.blogspot.com/2012/03/salada-russa-do-sector-electrico.html

Precisamos urgentemente de estabelecer uma norma reguladora do sector eléctrico antes que seja tarde. Angola importa quase tudo de que necessita para o sector eléctrico; desde cabos, tomadas, disjuntores, motores, geradores, turbinas, etc... Contudo, urge a necessidade de se regulamentar essas importações, incluindo aquelas feitas por instituições públicas.

Não podemos continuar a assistir e aceitar que equipamentos inadequados ao nosso sistema eléctrico continuem a entrar no País sem o mínimo de fiscalização. Vendem-se, por exemplo, equipamentos meramente concebidos para o mercado sul-africano, chinês, etc., forçando os compradores a efectuarem modificações para conectarem os mesmos a rede doméstica Angolana. Essas modificações, tem resultado em incidentes que poderiam ser evitados se a entrada de tais equipamentos fosse banida.

Alguns geradores eléctricos concebidos para outros mercados, cuja frequência nominal é de 60Hz, também são vendidos em Angola; Extensões eléctricas concebidas para o mercado Americano também facilmente se encontram a venda. Hoje em dia, facilmente vê-se o famoso chuveiro eléctrico brasileiro a venda. Quem autorizou a comercialização desse produto no mercado Angolano? Quem fiscaliza ou regulamenta os procedimentos para a sua instalação? Enfim, n+1 perguntas poderiam ser feitas a esse respeito.

Do exposto acima, facilmente pode-se aferir que estamos a criar situações para que acidentes que resultem em incêndios por falhas eléctricas ocorram.

COMO PODEMOS PROTEGER UMA INSTALAÇÃO CONTRA INCÊNDIOS ELÉCTRICOS?

É importante reconhecer o facto de que toda sobrecarga eléctrica tem um grande potencial de causar acidentes e princípios de incêndio. As áreas onde existirem instalações ou equipamentos eléctricos devem, segundo algumas normas internacionais, obedecer o seguinte:

1 - Ser dotadas de protecção contra incêndio e explosão. Os materiais, peças, dispositivos, equipamentos e sistemas destinados à aplicação em instalações eléctricas de ambientes com atmosferas potencialmente explosivas devem ser avaliados quanto a sua conformidade com as normas adoptadas.

2 - Os processos ou equipamentos susceptíveis de gerar ou acumular electricidade estática devem dispor de protecção específica e dispositivos de descarga eléctrica.

3 - Nas instalações eléctricas de áreas classificadas ou sujeitas a risco acentuado de incêndio ou explosões, devem ser adoptados dispositivos de protecção, como alarme e seccionamento automático para prevenir sobretensões, sobre correntes, falhas de isolamento, aquecimentos ou outras condições anormais de operação.

4 - Os serviços em instalações eléctricas nas áreas classificadas somente poderão ser realizados mediante permissão para o trabalho com licença formalizada e por profissionais certificados.

5 - Os componentes eléctricos não devem apresentar perigo de incêndio para os materiais vizinhos, devendo ser observadas instruções do fabricante.

6 - Os componentes fixos cujas superfícies externas possam atingir temperatura que venham causar perigo de incêndio a materiais adjacentes devem:

a) Ser montados sobre materiais ou contidos no interior de materiais que suportem tais temperatura.
b) Ser separados dos elementos da construção dos edifícios por materiais que suportem tais temperaturas.
c) Ser montados de modo a permitir a dissipação segura do calor, a uma distância segura de qualquer material em que tais temperaturas possam ter efeitos térmicos prejudiciais.
d) Ser dotados de um mecanismo ou equipamento que permita a refrigeração ou arrefecimento contínuo, mantendo-o assim a funcionar dentro dos padrões de temperatura aceitáveis.

7 - Os componentes instalados de modo permanente que em serviço normal possam emitir arcos ou fagulhas devem:

a) Ser totalmente envolvido por material resistente a arcos.
b) Ser separado, por materiais resistentes a arcos, de elementos da construção dos edifícios ou estrutura nos quais os arcos possam ter efeitos, etc.

Contudo, a obediência as normas e padrões permitem que as instalações sejam desenhadas e construídas de forma a prevenir acidentes eléctricos. Porém, mesmo quando uma instalação é concebida conforme as normas, deve-se sempre ter em conta a sua manutenção devido a degradação dos componentes eléctricos. Isso evita que certos incidentes, resultando em incêndios catastróficos aconteçam.

Em alguns países, o uso de dispositivos de protecção contra curto-circuito e incêndios é obrigatório para as instalações domésticas, comerciais e industriais. Os dispositivos mais usados para a protecção contra incêndios são: 

1 - Os Dispositivos de Protecção Contra Correntes Residuais também conhecidos como Dispositivos DR ou apenas DR, oferecem protecção pessoal contra choques eléctricos perigosos causados pelo contacto directo ou indirecto com a rede eléctrica. Eles também são utilizados para protecção de equipamentos e inicio de incêndio.

Aplicações especiais requerem soluções especiais, como por exemplo protecção contra incêndios ou onde o mesmo é instalado em ambientes agressivos. Existem Dispositivos DR com correntes residuais de 30 e 300 mA fabricados para a protecção contra a ocorrência de incêndio por arco eléctrico. Existem também dispositivos com correntes residuais de 500 mA, concebidos especialmente para a protecção contra incêndio.

Este tipo de protecção diferencial, além de diminuir significativamente a possibilidade de choques eléctricos em seres vivos, também se mostra bastante eficiente contra a possibilidade de curto-circuito de alta impedância (baixo valor de corrente) que gera uma falsa sobrecarga e, em algumas situações, inclusive o estabelecimento de arco à terra, o que pode ocasionar incêndio na instalação.

Em Angola, grande parte das instalações em baixa tensão não são concebidas com este tipo de protecção diferencial e em alguns casos o aterramente é inexistente.

Se num circuito for instalado um disjuntor termomagnético com maior valor nominal que o requerido para a sua protecção, em caso de uma falha por arco ou curto-circuito de alta impedância (baixo valor de corrente), o mesmo pode não ser accionado. Isso permitirá uma deteriorização dos componentes eléctricos do circuito, inclusive o isolamento dos cabos eléctricos, o que resulta as vezes em danos significativos dos equipamentos ou em incêndios eléctricos. 

2 - A fim de proteger a sua casa ou instalações comerciais contra incêndios, um interruptor de circuito contra falhas de arco – AFCI (AFCI sigla em inglês – Arc fault circuit interrupter) pode ser usado para detectar este problema.

O que é um AFCI? É um disjuntor concebido para interromper o circuito em caso de falhas de arco eléctrico. Como funciona um AFCI? Um disjuntor convencional responde somente a falhas por sobrecargas ou curto-circuito. Portanto, não protege contra condições que produzem um fluxo aleatório da corrente. Um AFCI é selectivo de tal forma que um arco normal não é capaz de o accionar.

Um circuito sensível interno é usado para monitorar continuamente o fluxo de corrente. Uma vez detectada um fluxo anormal da condição do arco, o circuito interno acciona e dispara o disjuntor desligando desta forma o circuito e, reduzindo de igual modo a probabilidade de ocorrência de um incêndio. Um AFCI não pode ser accionado durante condições de arcos normais, que podem acontecer quando desligamos um interruptor ou puxando uma ficha da tomada.

Actualmente os AFCI são concebidos como um disjuntor convencional combinando sistemas de protecção tradicional de sobrecarga e curto-circuito.  Alguns desenhadores, combinam protecção GFCI/RCD ou seja o Dispositivo DR e AFCI. GFCI – sigla em inglês para Ground Fault Circuit Interrupter (Interruptor de circuito contra corrente de fugas para terra). Um disjuntor do tipo AFCI tem um duplo propósito: Protecção contra falhas de arco evitando incêndios e protecção tradicional de sobrecarga e curto-circuito.

Não se pode confundir um AFCI com um GFCI. GFCI é concebido para a protecção pessoal contra choques eléctricos, enquanto que um AFCI protege contra incêndios causados por falhas de arco. Um GFCI também pode proteger contra incêndios eléctricos detectando arcos ou outras falhas à terra, mas não podem detectar falhas de arco entre fases que podem causar incêndios eléctricos.

3 - Sistema de monitoramento contra arco eléctrico.

Todo sistema para protecção eléctrica deve seguir algumas premissas:

a) A protecção sempre deve actuar com a finalidade de interromper uma falta capaz de causar danos à segurança e saúde dos profissionais e à integridade dos equipamentos;
b) A protecção deve ser rápida, selectiva e isolar o ponto de falha, garantindo a continuidade operacional com segurança.

O sistema de monitoramento contra arco eléctrico, configurado para luz e corrente, verifica os valores instantâneos de nível de luminância no interior do painel (que pode ser configurado de 100 a milhares de lux), e os valores instantâneos de corrente eléctrica para o caso de curto-circuitos.

Este sistema tem actuação 10 vezes mais rápida que um relé multifuncional (2,5 ms em média), protecção dedicada ao monitoramento do arco eléctrico, baseada em luz e corrente, actua directa na bobina de abertura do disjuntor, e o meio utilizado para transmissão de dados (fibra óptica) é imune a interferências electromagnéticas, também chamado de opto link. Portanto, contacte sempre um electricista especializado e assegure-se que de facto o dispositivo de protecção instalado satisfaz as suas necessidades.