Luanda  - “A UNITA tinha uma estrutura civil com vários “ministérios” preparados que servia para dar resposta às necessidades da população nas zonas libertadas e para a eminente tomada do poder.


Fonte: Unitaangola.org

A primeira visita foi à volta da Jamba, em plena mata, para observar animais selvagense manadas de elefantes. Estávamos muito ansiosos por abandonar a Jamba e não desfrutamos totalmente do espectáculo de ver aquela manada de animais de grande porte, que tinham cerca de três metros de altura, e que caminhavam lentamente sem que aparentemente se interessassem pela nossa presença.


Voltaram a dizer-nos que tinham regulamentado a caça aos paquidermes para evitar a sua extinção e o tráfico de marfim dos zambianos, que violavam com frequência a fronteira. Visitamos um hospital de campanha e o quemais nos impressionou foi a quantidade de mutilados em convalescença, vítimas de minas anti-pessoais.


Visitamos uma escola de arte. Não vimos os alunos porque, segundo o director, estavam a trabalhar no campo. Contou-nos que os disciplos da escola eram jovens militares com incapacidades físicas causadas pelos ferimentos dos combates, mas que tinham uma certa vocação artística e criavam murais e grandes cartazes de propaganda para os actos que organizavam na Jamba.


Numa sala estavam expostas mais de 200 obras artísticas, de qualidade e teor diferentes, a maioria em alusão à guerra. Quando perguntei ao director se tinham obras com outros temas, respondeu-me que a “arte numa determinada época é expressão das vivências da sociedade. As obras estão relacionadas com a guerra porque são as principais experiências vividas pelos homens que as criam”. Mostraram-nos uma pequena impressora, fotocopiadora e outros equipamentos modernos. Ali imprimia-se quase toda a propaganda emitida pela UNITA e Revista Kwacha que era editada para o interior e exterior de Angola.


Continuamos o percurso, visitando o atelier de costura com mais de 150 máquinas para coser ecortar diferentes tipos de tecido e com cerca de 200 trabalhadores. Tal como noutros lugares, a maioria das pessoas que ali estava tinha limitações físicas mas, segundo eles produziam mais de 800 uniformes por dia. Contaram-nos que tinham outras unidades nas localidades de Likuwa e Mavinga e que estavam a preparar mais pessoal para trabalhar a dois turnos e aumentar a produção. Além de roupa militar, também confeccionavam calças, camisas e roupa civil. No inicio da nossa visita tiraram-nos as medidas e quando estávamos a sair do ateliê, entregaram-nos um par de calças a cada um de nós feito à medida.


Ficamos surpreendidos por também nos mostrarem as instalações de reparação de armas onde arrajavam armamento proveniente tanto de países capitalistas como de socialistas. No local vimos morteiros de vários calíbres, canhões de artilharia terrestre, camiões, vários tipos de armas ligeiras, conjunto de foguetes de 57 milímetros utilizados pela força aérea angolana e cubana, um tangue T-55 que puseram em marcha e andou pelo pátio das instalações e outros veículos retirados às FAPLA.
Percebia-se que havia uma boa organização nas instalações. Tinham tornos para fazer peças e mostraram-nos alguns projécteis de morteiros fabricados por eles.


O chefe do laboratório comunicou-nos que também tinham oficinas de reparação em vários locais e faziam objectos artesanais como colheres, pratos, ferros de passar a roupa a carvão e outros objectos com restos de veículos, aviões e armamento.


Contudo, a visita que mais me eimpressionou foi a da escola. À entrada, esperava-nos o “ministro da Educação” da UNITA, o director da Escola e um grupo do pessoal da direcção e da docência da escola.


O “ministro” explicou-nos em poucos minutos a organização da escola, a quantidade de alunos que frequentavam vários anos escolares – cerca de 1900- e a quantidade de centros que tinham noutras zonas. Mencionou um numero a meu ver astronómico, de mais de 200 000 crianças, jovens e militaresde ambos os sexos que tinham aulas e que esse número aumentava todos os dias, por isso estavam a preparar mais professores.


Após a sua apresentação, iniciámos um percurso por várias aulas de história universal, física e língua portuguesa.


No exterior do local, debaixo das árvores, observámos vários grupos de crianças de anos diferentes sentados em assentos rústicos, quadros presosem troncos de árvores e professores a dar aulas. Algumas dessas educadoras levavam os seus filhos pequenos às costas. Aquele quadro impressionou-nos, porque as crianças, que na sua maioria estavam no sexto ano, apoiavam os cadernos nos joelhos e quando chegavámos punham-se de pé e entoavam canções. No final da visita, reuniram todas as crianças e o “ministro da Educação” disse-me:


Peço-lhe que diga algumas palavras às crianças, mas por favor nada de política. Diga apenas o que achou da escola, que isso é muito importante para elas.


Ficamos estupefactos. Em todos os locais por onde passámos fomos apresentados como “os amigos cubanos” e disseram as nossas patentes militares, nomes e apelidos, mas ninguém nos pediu para falar.


Não vacilei nem por um instante e comecei por dizer que lera certa vez. Utilizei as palavras mais simples que consegui encontrar no meu fraco português:


- o que importa é que são salas de aulas bonitas, nem os assentos cómodos, nem outros materiais. O que importa são os alunos, a professora e a vontade de ambos: um de aprender e o outro de ensinar. Os países subdesenvolvidos – continuei – sobretudo os do continente africano, são os que têm a taxa de analfabetismo mais elevada e para sair do subdesenvolvimento é preciso estudar. Em que condições de sacrifício, isso não é importante.


Apesar do analfabetismo e do subdesenvolvimento dos países estar associado à exploração, às guerras, à geopolítica e a outros factores intrinsecamente vinculados à política, não consegui violar o pedido que o “ministro da Educação” me fez e socorri-me de várias frases do nosso apóstolo da independência José Martí, que resumiam de forma magistral tudo o que eu não pude dizer.


Expliquei que Cuba foi colónia da Espanha, tal como Angola foi colónia de Portugal.


- o nosso herói nacional José Martí, combatente contra esse colonialismo, disse ser culto é a única forma de ser livre e as crianças são a esperança do mundo. Além disso, tentei com um vocabulário acessivel explicar às crianças o significado daquelas ideias. Saímos do local visivelmente emocionados com as cenas que presenciámos das crianças que, com rostos felizes, estudavam naquelas condições incríveis”.