Luanda  - Para além destes instrumentos de dimensão continental, também existem outros na região Austral de África, da qual Angola é parte. Os Estados-Membros da SADC (Comunidade de Desenvolvimento dos Países da África Austral) celebraram o Protocolo sobre a Cultura, Informação e Desporto, em 2001, no qual estabelece os princípios de independência dos mídias em relação aos governos, reafirmando a necessidade da independência editorial dos meios de comunicação, além de rejeitar quaisquer interferências externas. (artigo 1º).

Fonte: Club-k.net

Apesar deste empenho jurídico-formal da comunidade africana, a nível pan-africano e regional, ainda assim, organizações profissionais de mídia e da sociedade civil exortaram as instâncias da União Africana a apresentarem um protocolo adicional à Carta Africana dos Direitos Humanos relactiva à liberdade de expressão durante a cimeira de Julho de 2007 em Accra, no Gana.


Este pedido está contido numa resolução tomada no termo de uma Conferência sobre o Reforço da Liberdade de Expressão em África, organizada na capital ganense de 25 a 26 de Junho de 2007.


Face ao recuo da liberdade de expressão no continente, agravado pela impunidade crescente que beneficiam os autores das violações da liberdade de expressão em África, os participantes da Conferência denunciaram a interpretação limitativa que fazem os Estados do artigo 9º da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.


De acordo com a PANA, eles instaram a Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos a fazer com que a questão da liberdade de expressão na África seja um ponto em permanente análise nos relatórios periódicos apresentados pelos Estados signatários da Carta diante da Comissão.


Esta Conferência sobre o Reforço da Liberdade de Expressão na África, que agrupou durante dois dias em Accra, jornalistas, organizações profissionais de mídia, de defesa da liberdade de imprensa e de expressão, assim como organizações da sociedade civil, discutiu a liberdade de expressão no continente, os seus avanços e retrocessos.


Durante os trabalhos, os participantes revelaram que a Declaração de princípios sobre a liberdade de expressão em África tem lacunas, nomeadamente a ausência de caráter vinculativo deste texto elaborado em Outubro de 2002 em Banjul, na Gâmbia, por isso, parece que não é suscetível de garantir a liberdade de expressão no continente. A conferência foi organizada pelo Centro para a Pesquisa, Educação e Desenvolvimento dos Direitos Humanos em África (CREDO) e pela Fundação para os Media na África Francófona (MFWA). O resultado final da referida assembléia foi entregue aos chefes de Estado da UA durante a cimeira de Accra.


Ainda segundo a PANA, um dado particularmente chave foi o facto das organizações decidirem fazer pressão junto do Relator Especial da Comissão Africana dos Direitos Humanos e Povos, encarregue da liberdade de expressão, para que o protocolo fosse elaborado e adotado.
Para além da Fundação para os Media na África Francófona (MFWA), existe também na África Austral uma ONG com relactiva capacidade de pressão na SADC, encarregada de monitorar a situação da liberdade de expressão na região, Media Institutie of Southern Africa (MISA).


A defesa da liberdade de expressão ganhou outros contornos, na esfera pública global, ao propiciar o nascimento de muitas ONGs em escala local, regional e transacontinental. As organizações de dimensão global que se dedicam a advocacia da liberdade de expressão são: Freedom House, fundada em 1949 e que teve como primeiros membros honorários Eleanor Roosevelt e Wendell Wilkie; Artigo19, sediada em Londres e fundada em 1987; Repórteres Sem Fronteiras (RSF)36,ONG de origem francesa foi fundada em 1985 pelo jornalista Robert Ménard; Amnistia Internacional, sediada na Inglaterra, foi fundada em 1961 pelo advogado britânico Peter Benenson e a Human Right Watch, fundada e sediada nos EUA em 1978 . Estas duas últimas são generalistas, ao passo que as três precedentes dedicam-se exclusivamente a questão da liberdade de expressão.


Case study de Angola como negação relativa do sistema regional africano em matéria de liberdade de imprensa. Angola aderiu e adotou para o direito interno os instrumentos internacionais fundamentais onde defende-se a liberdade de expressão, tanto da ONU quanto da União Africana, por isso, tem obrigação de respeitá-los, aplicando-os: Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, subscrito em 10/01/1992; Pacto Internacional de Direitos Económicos, Sociais e Culturais, subscrito em 10/01/1992; Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher, subscrito em 17/09/1986; Convenção sobre os Direitos da Criança, ratificado em 05/12/1990; Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos, ratificado em 02/03/1990 e a Carta Africana sobre Direitos e Bem-Estar de Crianças, ratificado em 11/04/1992.


Em relação às convenções, declarações e tratados não subscritos por este país, ainda assim existem duas razões para respeitá-los: a ética política contemporânea impera que se promova os direitos humanos e a necessidade de legitimidade interna e externa. Hoje, um dos principais caminhos para que os governos se legitimem é a promoção dos Direitos Humanos.


Mesmo a aceitação de um Estado na relação com outros no sistema internacional pressupõe respeito aos Direitos Humanos, sob pena de ter grandes limitações de articular-se na geopolítica global. Sem ingenuidade, há de se ressalvar que quando um Estado viola direitos e tem relações aparentemente normais com o mundo, é porque a real politik impera.


Esta digressão pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos, permitiu perceber que há uma preocupação mais ou menos global em relação à necessidade de se respeitar e promover a liberdade de expressão e de imprensa. Apresentadas as justificativas jurídicas sobre a liberdade de expressão e conexas, impõem-se as seguintes questões: faz sentido um Estado negar aos cidadãos o exercício da palavra? A liberdade de comunicar pelas mais diversas formas e meios é um favor ou é um direito humano? Negar à mulher e ao homem a palavra prenunciaria o fim da sua vida digna? Na contemporaneidade alguma civilização ou Estado teria um futuro risonho com o fim da palavra? Colocadas as questões, parece que o presente artigo está em condições de entrar na ideia central: a liberdade de imprensa em Angola, mais concretamente no quadro legal e o comportamento da mídia supostamente pública no processo de democratização. Um país que apesar de ser membro da União Africana criou algumas normas que negam os avanços regionais em matéria de liberdade de imprensa e aprofunda a gravidade do problema com uma mídia politicamente controlada pela classe dominante.