Luanda - Sendo a norma fortemente influenciada pela mentalidade de cada época histórica e os condicionalismos a ela associadas, a liberdade de expressão e de imprensa em Angola está exactamente neste quadro referencial. Voltando um pouco à história do constitucionalismo jurídico-formal angolano (depois da descolonização política) identificou-se a seguinte evolução da problemática em causa: A Constituição de 11 de Novembro de 1975 afirma que a “[...] lei assegura o direito de livre expressão, reunião e associação”. (artigo 22). Ainda a mesma Constituição não se esquece de dedicar linhas à liberdade de crença e de consciência. (artigo 25).

Fonte: Club-k.net

A Constituição de 07 de Fevereiro de 1978 retoma a formulação à letra dos artigos 22 e 25. Já a Constituição de 23 de Setembro de 1980 nem sequer fala de um direito fundamental de âmbito participativo e cidadão. Esta é a fase do auge do Socialismo, durante a qual havia a negação mais ou menos geral das liberdades públicas e o Estado punha em causa constantemente o exercício dos direitos. Esta era a fase de elevação, fortalecimento e consolidação da República Popular de Angola e do MPLA, partido do trabalho (MPLA-PT).


A Constituição de 6 de Maio de 1991 marca o primeiro passo jurídico-formal para a democracia ao instituí-la principiologicamente nos artigos 1º, 2º e 3º. Quanto à liberdade de expressão, se torna evidente como conseqüência lógica do novo sistema político: a democracia. Segundo o artigo 24 “são garantidas as liberdades de expressão, de reunião, de manifestação, associação e de todas as demais formas de expressão”. Por sua vez, o artigo 27 estabelece que “é garantida a liberdade de imprensa, não podendo esta ser sujeita a qualquer censura, nomeadamente a de natureza política, ideológica e artística. A lei regulamenta as formas de exercício da liberdade de imprensa e as providências adequadas para prevenir e reprimir os seus abusos”. Esta Constituição que marca os primeiros passos para a democratização, no plano jurídico, também reserva espaço para a liberdade de consciência. “A liberdade de consciência e de crença é inviolável. O Estado angolano reconhece a liberdade de cultos e garante o seu exercício, desde que não sejam incompatíveis com a ordem pública e o interesse nacional”. (artigo 32).


A Constituição de 16 de Setembro de 1992 retoma os artigos do texto constitucional anterior, mas em artigos numericamente diferentes. No artigo 32 garante a liberdade de expressão, de reunião, manifestação e associação; artigo 35 garante a liberdade de imprensa e no artigo 45 a liberdade de consciência, de crença e de culto. Este texto constitucional de 1992 também retoma os artigos 1º e 2º que reafirmam Angola como um Estado democrático e de direito e por conseguinte, defende o pluralismo no plano político, religioso e cultural.


A Constituição de 2010, em vigor, particulariza-se pelo alargamento dos direitos fundamentais, em que a liberdade de expressão e de imprensa também voltaram a ser contempladas. O artigo 40 garante a liberdade de expressão de forma elástica, incluindo os aspectos correlativos:


1. Todos têm o direito de exprimir, divulgar e compartilhar livremente os seus pensamentos, as suas idéias e opiniões, pela palavra, imagem ou qualquer outro meio, bem como o direito e a liberdade de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações.


2. O exercício dos direitos e liberdades constantes do número anterior  não pode ser impedido nem limitado por qualquer tipo ou forma de censura.


3. A liberdade de expressão e a liberdade de informação têm como limites os direitos de todos ao bom nome, à honra e à reputação, à imagem e à reserva da intimidade da vida privada e familiar, a protecção da infância e da juventude, o segredo de Estado, o segredo de justiça, o segredo profissional e demais garantias daqueles direitos, nos termos regulados pela lei.


4. As infracções cometidas no exercício da liberdade de expressão e de informação fazem incorrer o seu autor em responsabilidade disciplinar, civil e criminal, nos termos da lei.


5. A todas as pessoas, singulares ou coletivas, é assegurado, nos termos da lei e em condições de igualdade e eficácia, o direito de resposta e de retificação, bem como o direito à indeminização pelos danos sofridos.


A Constituição prossegue no artigo 44, referindo-se a liberdade de imprensa nos seguintes termos: 1. É garantida a liberdade de imprensa, não podendo esta ser sujeita a qualquer censura prévia, nomeadamente de natureza política, ideológica ou artística; 2. O Estado assegura o pluralismo de expressão e garante a diferença de propriedade e a diversidade editorial dos meios de comunicação; 3. O Estado assegura a existência e o funcionamento independente e qualitativamente competitivo de um serviço público de rádio e de televisão;

4. A lei estabelece as formas de exercício da liberdade de imprensa.


O direito de antena, resposta e de réplica política também encontram acolhimento (artigo 45) assim como a liberdade de consciência, de religião e de culto (artigo 41). A par do reconhecimento constitucional, no quadro das leis ordinárias também há um conjunto de dispositivos e leis dedicadas exclusivamente à liberdade de expressão e de imprensa e os aspectos afins. Em 1991, a Lei n.º 22/91, de 15 de Junho — Lei de Imprensa — que assegurou o direito de informar e de ser informado, liberalizou a comunicação social, permitindo a coexistência de órgãos de comunicação social públicos, privados e de confissões religiosas.

No seu dispositivo 4º reza que,1. A imprensa não está sujeita a qualquer forma de autorização; 2. Nenhum cidadão pode ser prejudicado na sua vida privada, social ou laboral em virtude do exercício legítimo do direito à liberdade de expressão do pensamento através da imprensa.


Em relação ao exercício da actividade de radiodifusão, concede possibilidade de abertura de estações comerciais privadas, mas dá preponderância ao Estado no serviço público de radiodifusão, (artigos 24 e 25); do exercício da actividade de televisão concede ao Estado o direito exclusivo nesta área. (artigo 30) e sobre o direito de resposta e aspectos a si ligados encarregam-se os dispositivos 34, 35, 36, 37 e 38.


Apesar dos sinais liberais que esta lei de imprensa traz, como manifestação inequívoca de que o socialismo estava teoricamente ultrapassado, ainda assim apresenta muitas lacunas e fraquezas que não se adéquam às exigências internacionais sobre a matéria, por exemplo: ela não veta o monopólio e o oligopólio, deixando que a questão seja tratada numa lei específica (artigo 7º). Pela sua importância, e a exemplo dos outros países, esta questão deveria ser proibida na lei de imprensa. Outra fraqueza desta lei consiste no fato de criminalizar a actividade jornalística por meio da tipologia criminal de calúnia, injúria e difamação (artigos 42, 43, 44 e 45). Os resquícios do autoritarismo ficam bastante claros na carga punitiva, responsabilizatória e processual que a lei de imprensa trouxe ao dedicar 19 artigos ao assunto.