Luanda – É um dos deputados mais antigos do Parlamento e preside ao PRS desde a sua fundação, em 1990. Defende o voto secreto e declara-se insatisfeito com a fiscalização ao Governo. Eduardo Kwangana recebeu o SOL, no final da semana passada, na sede do Partido de Renovação Social (PRS), num gabinete simples e forrado a livros e papéis.

Fonte: Sol
E falou sobre as regalias dos deputados, que não acha excessivas tendo em conta a importância da função, e sobre o ambiente de camaradagem que, fora dos acesos debates, existe entre os deputados dos diferentes partidos.

O que é ser deputado de todos os ‘tempos’?
É uma experiência muito boa. No Parlamento, há sobretudo o exercício da democracia. É o único sítio onde ela se exerce, a par da Federação Angolana de Futebol, se bem que esta exerce-a, muitas vezes, melhor, porque há discussões e vence quem tem qualidades para sem aquilo que chamamos de ‘aldrabices’. Na Assembleia Nacional, trocamos ideias e, às vezes, enervamo-nos, mas abraçamo-nos quando saímos.

Como é a convivência partidária?
É salutar. Podemos zangar-nos lá dentro, mas, quando chegamos aos corredores, aquilo passa.

Está satisfeito com o trabalho desenvolvido pelos deputados?
Acho que não tem havido problemas na elaboração das leis. O que falta é a execução e o acompanhamento. O trabalho de um deputado não é só participar nas plenárias. O exercício de fiscalização, de acompanhamento, é necessário. Houve uma altura em que os deputados foram vedados de o fazer, mas em todo o mundo os parlamentares devem fiscalizar, controlar, exigir contas a quem gere o Orçamento Geral do Estado.

Porque é que os cidadãos desconhecem o que se passa no Parlamento?
O regime não deixa que as plenárias sejam transmitidas ao público, como têm sido outras actividades da cultura e desporto. Quanto mais divulgação houver sobre a Assembleia Nacional, mais acompanhamento as pessoas terão, via televisão, rádio e internet. Os jornalistas só apresentam um resumo, mas os nossos jovens também consultam muito pouco a imprensa e não aparecem na plateia.

Que grandes questões se debatem?
Uma é a nossa luta para que o voto seja secreto. Muitos não conseguem votar segundo a sua vontade, votam segundo a política partidária. Nem todos estão de acordo com tudo, sobretudo na bancada maioritária. Eu voto segundo o que a minha consciência determinar, sem ser pressionado pelo chefe da bancada. Isso é coarctar o direito do deputado.

Há deputados que nunca intervêm...
Cada um tem o seu carácter e às vezes um dom. Uns falam muito e outros pouco. Mas isso não significa dizer que não sejam importantes. Depois há os bajuladores, têm que falar para os chefes ouvirem e subirem mais alguns degraus. São conhecidos, tanto a nível dos deputados como da população. Outros esperam que os outros falem para eles puderem falar. Esses querem ser ouvidos.

Como comenta as críticas às regalias dos deputados?
Todo o dirigente tem que ter regalias, muitas, poucas ou médias. Não é normal um deputado andar a pé. O que não pode acontecer é termos mais do que deveríamos, contradizendo a nossa realidade.

E isso tem acontecido?
Nunca aconteceu. Acompanhou a ‘propaganda’ sobre os Jaguares dos deputados? Alguém teve que criar aquele alarido em Luanda para se começar a questionar. Às vezes o deputado sabe que vai entrar o modelo X, mas não sabe quanto custou. Por exemplo, eu tenho um BMW e não sei quanto custou. Foi uma escolha da direcção da Assembleia. Mas os deputados que tomaram posse em 2012, até hoje, não têm viaturas, a menos que os partidos lhes tenham atribuído alguma.

Os deputados não se sentiriam bem sem carro?
Pode dar-me um exemplo onde tal aconteça? O senhor jornalista também tem que ter as mínimas condições de trabalho. Sem viatura, não sei como o deputado iria... tinha de ir de candongueiro! Penso que todos funcionários do Estado têm que ter condições de trabalho. Outras questões são o salário, o passaporte diplomático...

Os deputados portugueses não têm viaturas oficiais.
Cada país tem a sua história. Se calhar recebem valores e cada um vai comprando o que quer. Quanto é que ganha um deputado? Este não é um problema meu, é da secretaria-geral do Parlamento. O salário-base do deputado é de 430.736 kwanzas, e depois há subsídios tendo em conta a função, o número de filhos, entre outros. Mas um deputado não ganha muito mais do que isso.