Luanda - Todo processo escravocrata/colonial, tem sido culpado como a razão pela qual as pragas em África subsistem. A corrupção, a pobreza, os grandes índices de analfabetismo, as guerras, os problemas étnicos e raciais, as doenças, etc. Quanto a obstrução e a proscrição ao diálogo em África, pouco ou nada se fala acerca da sua origem. Alguns autores vêm condenando as atitudes dos homens negros de hoje, como o reflexo daquilo que viveram e herdaram das atitudes dos seus donos de engenho.


Fonte: Club-k.net

Porquê que não se dialoga em África?

Daí que esses homens, uma vez soltos, apropriaram-se da força para conquistarem e se conservarem no poder, seja batendo nas suas mulheres, adultos ás crianças, ou mesmo impedindo-os de falar, como forma de  impor controle e dominação sobre esses, como afirma Bell Hocks: …Seguem  assim o mesmo modelo hierárquico das relações de poder da época da escravidão, ou aqueles que os senhores de engenho usavam contra eles, transportando para as suas famílias relações espelhadas na brutalidade.

     
A autorização para falar diante dos “mais velhos” ou noutro contexto, dos proprietários dos homens, dá-se assim, pela conveniência e concordância com os donos da palavra, no sentido em que entendemos palavra/comunicação como poder.
    

Em países como o nosso que, as relações entre mais velhos e mais novos cristalizaram-se por apenas elogios dos mais novos e críticas e conselhos dos outros, um terceiro olhar ou dizer, é identificado em todas as instâncias como inimigo. Isto é, filosófica, política, étnica ou ideologicamente; daí a justificação do monopólio das agressões, quando subsidiadas por acusações previamente construídas por jornalistas e ou no dia á dia onde se oportuniza a conspiração entre as linhas de pensamento sem medir-se espaços nem cultos, não apenas na política mas como no campo religioso onde procede de igual modo, senão pior.
    

Decerto não poderemos viver eternamente na contradição, mais talvez enquanto homens, seremos por toda vida actores por essência natural. Muitos críticos sobem ao proscénio político apontando o dedo aos maestros da gatunagem  e delinquência que são os gestores do território angolano. No entanto, em seus lares e noutros lugares sociais, enquanto professores, amigos, maridos etc. são igualmente solípsos e ditadores. Lembro-me ainda em tempos de aula, como o exame oral representava terror ao aluno e os professores orgulhavam-se e excitavam-se ao ver os alunos possuídos pela síndrome do pânico. Muitos deles são os que hoje se insurgem  contra a ditadura imposta em Angola. Outros reclamam das perseguições feitas pelos governantes aos opositores, mas igualmente perseguem os estudantes a quando das divergências em salas de aula, porque não acreditam que a Universidade é também um palco democrático e, portanto de igualdade e  liberdade.
    

Até hoje, ainda em  escolas de base e em universidades, encontramos estudantes formandos, sem terem sequer um dia a liberdade e sem medo, pronunciarem uma dúvida em sala de aulas, de tão amedrontados e envergonhados que se encontram. Ou seja, envergonhados por poder errar, porque muitas das vezes o próprio educador ri do erro do educando ao ponto de lhe engolir a naturalidade; a espontaneidade. Caros docentes, senhoras e senhores, não assaltem a humanidade dos vossos educandos por favor. Quantos são os que se formaram no silêncio e são chamados de quadros? Ainda hoje professores anti pedagógicos, continuam a dar preferência aos alunos mais destacados ao invés de motivarem os menos aplicados e ou trata-los em igualdade. Muitos desses educadores, são os que hoje se insurgem contra a desigualdade e a má distribuição da riqueza ou com a preferência de etnias nos cargos políticos. São os mesmos que directa ou indirectamente, consciente ou inconscientemente , oprimem os estudantes que não atendem os seus intentos a nível profissional e ideológico. Os chamam de burros e outros sinónimos, desresponsabilizando-se quase sempre a deficiente educação a que se cimentou o ensino no país, com professores, repletos de pedagogias caseiras, de guerra e de terror e, ensinando dentre outras anormalidades, como se dá a ditadura e  a corrupção, isto ainda no ensino de base.
    

Nós dos anos 80 convivemos com esse fenómeno desde cedo lá nos anos 90 lá na sua gestação, nas escolas do Estado, Alda Lara, Mutu Ya Kevela etc. como ainda hoje continua nas demais escolas estatais e agora privadas. Alguns por vícios, outros por desrespeito a sua profissão pelos lacrimejantes salários que recebem, justificam tal prática, porém em ambos os gumes os estudantes seriam mutilados.
    

Em tempos li num jornal romântico  e de uma estética partidarizada “Diálogo com a juventude, mais um marco histórico do presidente da república”. Observei tamanho esforço que representa o diálogo para as autoridades angolanas, num país parido no continente construído pela tradição oral. Em tempos também assistimos a efeméride de o presidente da república Eduardo dos Santos, após vários anos no poder, ser  entrevistado supostamente de forma espontânea, um tipo  free style, por um “jornalista” da emissora SIC, mas ou menos ao estilo dos carismáticos Lula da Silva ou Hugo Xaves. Ora, nem a tradição da oralidade têm coitados.
    

No país, vários são os partidos que buscam pelo debate aberto com o partido do poder, com transmissão directa dos discursos de cada um, de forma descortinar os mistérios e deficiências dos mesmos e termos enquanto eleitores um panorama macro da realidade do país. Todavia temos visto apenas embargos e fintas dos actuais líderes a esse respeito.
    

Gostaria de terminar esse artigo dizendo que o mesmo não vem favorecer os discursos que alimentaram ou alimentam o ocidente durante muitos séculos, quando os seus catedráticos pensadores acusam África de ser um continente sem história ao não considerarem a tradição oral como fonte histórica. Ou como o grande filósofo maliano Amadou Hampatê Bâ apenas enfatizou a oralidade africana. Pelo contrário, tal como foi recentemente revelado, a produção literária em África teve e tem o seu lugar,  a publicação da Unesco nos seus oito excessivos volumes de história de África, bem como a expressiva contribuição literária também revelada  na universidade de Tombukutu no antigo império do Mali, são alguns exemplos.