Luanda - Angola cumpre, 38 anos como país independente, com os analistas a dividirem-se, na altura de fazer o balanço, entre as conquistas e as expectativas frustradas.

Fonte: DN

Belarmino Van-Dúnem, analista político e colunista do estatal Jornal de Angola, e Filomeno Vieira Lopes, secretário-geral do partido na oposição Bloco Democrático, concordam numa coisa: Angola desperdiçou recursos humanos e naturais durante a guerra civil, que consumiu quase três décadas de independência, e ainda está a pagar a fatura.

Sobre tudo o resto, um vê o copo meio cheio, o outro meio vazio. Van-Dúnem faz um balanço "extremamente positivo" das conquistas do regime liderado por José Eduardo dos Santos, que, desde o fim da guerra civil, em 2002, "tem tentado reconstruir o país". Já Vieira Lopes constata "um défice" nos "ideais de liberdade e justiça social" que acompanharam a independência, atualmente "postos em causa".

Hoje, Angola é um país "integrado" e "interligado", onde os habitantes "de Cabinda ou Cunene podem circular livremente", por estrada ou ligação aérea, elogia Van-Dúnem. O desenvolvimento económico é "bastante marcável" e o "parque industrial está a ser recuperado", enquanto "uma classe média angolana está a emergir, lentamente", retrata.

Van-Dúnem reconhece que "há um trabalho" a "fazer do ponto de vista social, do combate à pobreza, do reforço das instituições públicas" e aventa um reequilíbrio da balança comercial, para que o país passe a exportar tanto quanto importa.

Sobre o poder político, contestado externa e internamente, o analista defende que "é preciso ultrapassar a visão monolítica do sistema democrático, que não pode ser adotada para todos os países".

O sistema constitucional e político angolano tem "especificidades próprias" e "cada democracia tem as suas regras e a sua própria forma de gestão", frisa, comentando a recente decisão do Tribunal Constitucional de retirar ao Parlamento a capacidade de fiscalizar o Executivo. Em causa está um acórdão que considera inconstitucionais algumas disposições do Regimento da Assembleia Nacional, passando a impedir interpelações diretas a ministros e perguntas ao Governo.

"Não devemos ter complexos", desvaloriza, lembrando que o sistema angolano é presidencialista, tendo o chefe de Estado também o poder executivo, enquanto o português é parlamentar e que uma realidade não pode ser transposta para outra.

O regime "tem exercido violência sobre os outros grupos" políticos e sociais, o que impede que se alcancem as "aspirações" da independência, contrapõe Filomeno Vieira Lopes. O exercício do poder em Angola "não permite uma harmonia social" e põe em causa a "coesão" do país. "Muito embora haja um multipartidarismo formal, continuamos com extremas dificuldades", constata.

Angola está numa "fase de transição para a democracia" e num processo de "acumulação de capital", que tem gerado "uma diferença abismal entre pobres e ricos", que "não ajuda os ideais de justiça social", sustenta.

"Temos todo um conjunto de liberdades que se encontram ainda coartadas", exemplifica, identificando as liberdades de expressão, comunicação, manifestação e reunião. "Os problemas que temos são, efetivamente, nossos", mas é de exclusiva responsabilidade interna a "possibilidade de progredir", realça.

Os "problemas" tornam "a independência amarga em vários aspetos" e revelam que "o usufruto do resultado" da luta pela independência "não foi de todos", resume, considerando que a maior conquista desde a independência foi, sobretudo, formal, com os angolanos a passarem a assumir a condução do país.