Como comenta a chegada a Luanda de um navio chinês com armas para o regime de Robert Mugabe, no Zimbabwe?
Cremos que o Zimbabwe precisa mais de alimentação do que de armas. Mesmo sendo um país soberano, acredito que o momento escolhido para a importação do armamento não é o mais indicado. Estas armas deviam regressar à origem.

O Governo de Luanda apoia Mugabe. Acha correcto este apoio?
O Zimbabwe é um país vizinho e temos necessidade de manter relações com países vizinhos. Mas não podemos concordar com o apoio de Angola à manutenção do regime do Presidente Mugabe. Queremos que o nosso país defenda os princípios democráticos. Apoiar um regime que perdeu as eleições e não aceita publicar os resultados é contra os princípios democráticos.

Angola terá eleições este ano. Acha possível uma eleição democrática, com hipóteses para todos os partidos?
Pensamos que em Angola estão criadas condições para realizar eleições transparentes, livres, justas. Mas há alguns acontecimentos que começam a preocupar. O partido maioritário, o MPLA, quer introduzir na lei eleitoral uma alteração do prazo previsto para a publicação dos resultados a nível das províncias, de quatro para sete dias. Não vemos razão para alargar este período. E se tivermos em conta o que está a acontecer no Zimbabwe, este alargamento do prazo da publicação dos resultados a nível das províncias é preocupante.

A UNITA tem meios para uma campanha eficaz?
Devo dizer claramente que não. Mas não são os meios apenas que determinam os resultados. Será sobretudo a vontade política e nós temos essa vontade política.

Fizeram sondagens? Sabem qual é a dimensão do vosso eleitorado?
Fizemos sondagens. Não tão frequentes como as que se fazem noutras partes do mundo. Aliás, esses meios financeiros que referi são determinantes para as sondagens. As que fizemos não foram nada baratas, mas temos outras formas de saber o que os eleitores pensam e o apoio que a UNITA tem dos angolanos.

E a dimensão do eleitorado UNITA? Pode revelar?
Não posso revelar porque o país vive num clima de intimidação e nem todos têm a coragem de dizer qual é a sua filiação política. Há os que dizem que não pertencem a nenhum partido, precisamente porque não sabem com quem estão a falar. Nas nossas sondagens, cerca de 45% dos interrogados respondem "não quero dizer". Isso reflecte a dimensão do medo com que se vive.

Como é que surge essa intimidação na vida quotidiana?
Se, por exemplo, for conhecido como militante de um partido diferente daquele que está no poder, tem dificuldades em encontrar emprego ou em beneficiar de algum bem público. E pode ser perseguido na sua própria casa. As pessoas vivem esse receio e ninguém quer perder o emprego e viver na intranquilidade. Então, as pessoas preferem manter-se caladas e dizer "estou convosco, mas não posso dar a cara agora".

Em 2009, haverá presidenciais. Confirma que será o candidato presidencial da UNITA?
Sim.

Nas legislativas, qual é o vosso objectivo?
É ganhar as eleições e formar Governo. Mas se aumentarmos o número de deputados, isso será uma vitória. O que desejamos é ter uma maioria de deputados na Assembleia Nacional [UNITA tem 70 deputados, em 220; o MPLA 129; dez outros partidos elegeram os restantes].

A UNITA quer eleições municipais, mas está difícil...
Já não é só a UNITA. Estamos a lutar para que haja eleições autárquicas e o partido que tem a maioria não estava de acordo. Mas agora já se fala da necessidade de autárquicas. Ninguém discorda, mas há horizontes temporais diferentes. Há quem pense que as autárquicas devem ser realizadas depois das legislativas e das presidenciais. Nós estamos neste grupo. E há aqueles que dizem que deviam ser intercaladas. Não concordamos com esse ponto de vista. Precisamos de tempo para criar condições para a realização de autárquicas.

A UNITA tem ministros no Governo. Isso é positivo para o vosso partido?
Do ponto de vista de estabilidade, da pacificação, este exercício foi positivo, mas a participação no Governo tem sido motivo de críticas, sobretudo de sectores que acham que não se pode fazer oposição estando no governo. Os programas do Governo não são nossos e contêm uma filosofia com que não estamos de acordo. A participação não tem afectado o nosso desempenho de fazer política de oposição.

A economia angolana está a crescer muito depressa. Acha que isso vai beneficiar o partido no poder?
Penso que vai penalizar o Governo. Todas as estatísticas indicam um crescimento muito grande. Começa a haver muito dinheiro, mas esse dinheiro só beneficia pequenos grupos. A gestão da economia só tem beneficiado sectores muito reduzidos da população e isso produz um sentimento de revolta.

E há muita corrupção em Angola?
Naturalmente. O próprio Presidente Eduardo dos Santos diz que a corrupção é o pior mal que temos, depois da guerra. Se o chefe de Estado se pronuncia desta forma, nós, que a vemos todos os dias, sabemos que a corrupção existe em abundância.

Se vencer as eleições, teme que o Governo faça algo semelhante ao que aconteceu no Zimbabwe?
Não vejo razões para que isso aconteça em Angola.

A sua viagem europeia serviu para reunir apoios?
Esta visita por vários países europeus [Portugal, França e Inglaterra] demonstrou que há confiança na mensagem da UNITA. Falámos com sectores empresariais, inclusive com direcções de bancos importantes e notámos que há abertura e esperança.

O que lhe dizem os banqueiros? O que temem mais, quando investem em Angola?
Há uma preocupação comum a todos: a burocracia excessiva.

E com a corrupção?
Sim, falam das comissões. Antes de ganharem alguma coisa com a sua empresa, já há a exigência de 10% de comissão.

A UNITA está unida?
A pergunta surge muitas vezes. Mas onde existe democracia, há ideias diferentes. A expressão de pontos de vista não representa divisões. Pelo contrário. Permitimos a liberdade de expressão e de debate. A diversidade no partido é a força principal da UNITA.

Fonte: Diário de notícias