Luanda - Na colonização museke era o bairro habitado pelos indígenas ligado com a cidade pelo tampão social habitado pelos assimilados. Nos dias de hoje, é geralmente tido como sinónimo de desordem (sem ruas, etc.), pobreza (sem estruturas de habitabilidade, etc.).

Fonte: Club-k.net
Museke é associado à delinquência (daí o kuduro ter sido associado a delinquência) e tantas outras maldades que afectam a cidade. Por essa razão, a erradicação da pobreza ou os objectivos do Millennium vão ao desencontro dos museke. A questão agora é: demolir ou conservar?

Definição

Hoje, chamamos “museke” bairro que não tem ruas asfaltadas, por causa de “areia” (museke quer dizer areia). Isto é, falta de urbanismo: sem ruas, sem espaços verdes, sem espaço lúdico, etc. Na verdade, “museke” espelha um mosaico de confusão habitacional. Esse é museke físico.

Museke é também a vida que se leva neste bairro: uma solidariedade extrema (pedir sal ou óleo ao vizinho, por exemplo), uma privacidade diminuída (as discussões de uma casa transita para outra casa vizinha sem demora), uma irmandade real (confiar seu filho ao vizinho na sua ausência, ou em caso de ausência prolongada, vigiar sua casa), etc. Esse é o museke social.

Museke é, finalmente, a forma de se comportar neste espaço. A falta de “lugares espaçosos” na realidade física, diminui também, os “espaços mentais”; a solidariedade e a irmandade de museke confundem, as vezes, o individuo que se imiscua nas conversas dos outros sem receio mesmo quando não é chamado. Isto é o museke físico e o museke social estruturam a forma de comportamento no indivíduo que lá habita.

Problemática

Museke é, ao mesmo tempo, um espaço físico, um espaço social e um espaço mental. Quando se pretende demolir o “museke” que na verdade é o “espaço físico”, esquece-se que ir-se-á demolir simultaneamente o “espaço social” e o “espaço mental”. Será isto possível? Quais seriam as consequências na realidade social?

Há Solução?

Vou me pronunciar apenas na realidade de Luanda. O Estado angolano garante, através da Lei, a habitação ao cidadão. Então, como proceder, no caso da demolição? Será necessária uma conservação? No caso da demolição, o Estado deve antes estudar cada “museke”, procurando saber: quais são as pessoas que lá vivem? Como eles concebem habitação, habitabilidade e como se comportam perante os seus espaços? Quais são as condições socioeconómicas? Quais seria a média das suas habilitações? Que tipo de escola que frequentam? Quais são suas crenças? Quais são os suportes da socialização que fazem sua educação, sua cultura?

Somente em busca destas respostas que o Estado decidirá se valeria demolir, mas antes construir “museke urbanizado” (como se pretendeu fazer no Zango, por exemplo) onde as populações serão realojadas. Ou, ainda, se valeria conservar o “museke”.

Na verdade, somente um valor alto e histórico poderá levar a conservar o “museke”, mas não se trataria aqui de uma “conservação” no sentido popular. Conservação aqui é no sentido arquitetónico – ver Ruskin, por exemplo – onde serão incluídos outros suportes culturais para operacionalizar novos rendimentos (por CyberCafé, Boutiques, etc.), e requalificadas outras infraestruturas (casas comuns tornarem-se “casas museus” ou biblioteca, etc. com estruturas próprias).

De museke ao Kilamba

A maioria da população de Luanda vive nos museke, e estes multiplicaram-se por causa das imigrações causadas pela guerra. Aqueles que trabalham na “cidade de Luanda” são tidos como diferentes, e as zungueiras sabem quanto a cidade é chique: poder económico de adquirir os produtos ao bom preço, 24 horas da electricidade, casas com mobílias, nova tecnologia, etc.

Por isto, sair dos museke para viver na cidade era sonho generalizado. Há quem alugaram suas casas no “centro da cidade de Luanda” ou mesmo vendido, para ir instalar-se nos museke onde criaram “museke urbanizado”.

A ocupação de Kilamba pelo “museke” foi uma demolição mental real. Houve dinâmicas. Habituados a pisar quizaca, habituados a pedir óleo ao vizinho, etc. os ex-habitantes encontravam novas barreiras. Kilamba não significava algum aumento de salário nem tão pouco uma promoção profissional.

Significava, portanto, aquisição de um “comportamento psicossocial” que irá aumentar o teto das despesas. Alias, pela distância e precaridade de transporte público, muito foram obrigados a adquirir meios de transporte individuais.

O espaço social dos museke é quase ausente na cidade de Kilamba, pois as estruturas não facilitam tanto. Mas houve dinâmicas. Numa fase de Consolidação da Paz, o país precisava preservar alguns valores culturais (solidariedade, por exemplo).

Contudo, o “museke social” é revivido no táxi – para aqueles que ainda o usam. Mas passa a ser um “museke meio-urbano, meio-rural”, e até certo ponto, repugnando (sem o saber directamente ou o sabendo cientemente) aspectos antiquados do museke original.

Qual será o destino do museke de amanha?

Angola está decida a desenvolver e já mostra consistente estabilidade económica e política. Na próxima será a vez da projeção social. Face as metas internacionalmente estabelecidas, Angola assumirá paulatinamente uma acção exterminadora contra os museke (pobreza, analfabetismo, etc.).

A minha posição é a seguinte. Os museke físicos devem ser abolidos, porque não oferecem condições: em caso de incendio, os bombeiros encontram dificuldades; a maior mortalidade infantil é devido a falta de unidades hospitalares e falta de higiene; escolas sem condições de escolaridade; falta de água potável, etc. Ninguém optaria pela continuação deste “museke físico”.

Portanto, há “museke social” que é preciso identificar seu valor sociocultural, adaptá-lo para os rendimentos humanos e socioeconómicos que gerem o bem-estar social e económico, ao benefício dos habitantes. Para os “museke históricos”, já vimos que há necessidade de conservá-lo rentabilizando-o consoante as demandas e exigências contemporâneas.

Em relação ao museke mental, será necessário potencializa-lo através de novas estruturas de socialização (família condigna, escola com condições e igreja em busca da integridade espiritual) no seguinte método: estudar e entrevistar os habitantes de museke, construir habitações consoante suas aspirações (em busca da dignificação da vida humana) para depois desalojar e realojá-lo.