O acto da indigitação de C Gomes Jr, agora apenas dependente da conclusão pelo STJ da apreciação de três pedidos de impugnação parcelar das eleições (AM 333), foi tornado possível por efeito de uma iniciativa conjunta de Angola e Cabo Verde tendo em vista persuadir Nino Vieira a “moderar” a sua posição sobre o assunto.

N Vieira, aparentemente movido por ressentimentos pessoais que alimenta em relação a C Gomes Jr, mas agindo também por pressão de considerações segundo as quais o regresso do antigo PM ao poder, nas circunstâncias propícias em que ocorrerá, implica o seu apagamento político, vinha tentando condicionar/obstruir a nomeação.

Em concreto, N Vieira reservava-se a prerrogativa de escolher ele próprio o PM, com base numa lista de três nomes que a direcção do PAIGC lhe apresentaria; no caso de a sua escolha vir a recair em C Gomes Jr condicionava a respectiva indigitação a uma retractação pública do mesmo por alegadas ofensas à sua pessoa, com base nas quais apresentou queixa.

2 . Os ressentimentos de N Vieira em relação a C Gomes Jr radicam no fim desauspicioso de antigos laços de amizade e interesses mútuos; as ofensas, em declarações públicas de C Gomes Jr identificando-o como “mercenário” ou insinuando, conforme interpretação de N Vieira, a sua implicação no assassinato do comodoro Lamine Sanhá, CEM.

As exigências de N Vieira e a rejeição das mesmas pela direcção do PAIGC, que as considerava destituídas de fundamentação jurídico-política, mas igualmente desfasadas da posição de fraqueza (AM 329), com que o mesmo saiu das eleições, deram azo a apreensões internas e externas, na esteira das quais ocorreu a iniciativa Angola/Cabo Verde.

A par das tensões políticas com C Gomes Jr, N Vieira abriu um diferendo com Kumba Yalá, contra o qual apresentou no MP queixa-crime baseada na acusação de o ter difamado quando, na última campanha eleitoral, o acusou de implicação no narcotráfico. Têm sido notadas interferências de N Vieira nos procedimentos do MP.
Os litígios de N Vieira com os líderes dos dois principais partidos, acrescidos de manifestações de mal estar com os chefes militares, que considera não terem sido suficientemente diligentes no caso do atentado de que foi alvo, estavam a gerar um clima contraproducente para o próprio e potenciador de riscos de convulsão.

A saber:
- Surgimento de sentimentos de exasperação na sociedade em geral, provocados
pela ideia de que está a retardar/bloquear expectativas benignas de
estabilização/normalização criadas pelo resultado das eleições.
- Aproximação entre o PAIGC, PRS e outros partidos, já presente na eleição,
quase por unanimidade, de Raimundo Pereira, vice-presidente do PAIGC,
como novo presidente da ANP; junção dos militares a tal aproximação.

3 . A iniciativa de desanuviar o clima das relações N Vieira/C Gomes Jr partiu originalmente de Angola. O insucesso da primeira diligência (diálogo exaltado), levou José Eduardo dos Santos a solicitar os bons ofícios de Pedro Pires, de Cabo Verde, tendo sido esta, de facto, a razão da inesperada deslocação do mesmo a Luanda.

O plano então delineado consistiu numa deslocação imediata de P Pires a Bissau para consultas com N Vieira e outras “partes interessadas” no caso, i.e., C Gomes Jr, K Yalá e os chefes militares. Com P Pires viajou Higino Carneiro, o dirigente angolano que tem no Governo e no MPLA o “pelouro” da Guiné-Bissau (Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe idem).

Na viagem entre Luanda e Bissau foi efectuada uma escala em Abidjan destinada a pôr a CEDEAO e o presidente da Costa do Marfim, Laurent Gbagbo, ao corrente das iniciativas em curso e solicitar apoio para as mesmas – que foi prestado.
A missão em Bissau foi dada por concluída depois de garantias de N Vieira de que indigitaria C Gomes Jr para o cargo de PM, sem condições. A última personalidade recebida por P Pires foi K Yalá, que também obteve garantias de um procedimento do MP mais consentâneo com a lei na apreciação da queixa-crime de N Vieira.

Fonte: Africa Monitor