Aparentemente, se o Presidente fala de um amplo debate do projecto de Constituição que definiria qual das modalidades a adoptar – o sufrágio indirecto ou o sufrágio directo e universal – viventes que somos dentro de um país democrático (que, como compreendemos, dá os seus primeiros passos depois de uma guerra prolongada) não nos deveríamos preocupar agora com este assunto aguardando a vez das discussões. O tempo e o espaço que dispomos para abordar esta questão não nos dão latitude para grandes divagações teóricas sobre as vantagens e desvantagens de uma ou outra opção. Mas há que referir, sem ambiguidades, que há duas preocupações urgentes que essas colocações levantam:

I. No quadro da Lei Constitucional que rege actualmente o país, a próxima Constituição não deve alterar a modalidade de eleição por sufrágio «universal, directo secreto», como o é claramente atestado pela alínea d) do seu artigo 159º, que estabelece os limites materiais da aprovação da «Constituição de Angola». É preciso acrescentar – para não nos atermos a uma visão meramente positivista da lei – que as próximas eleições presidenciais estão intimamente ligadas às passadas eleições legislativas (com que poderiam até ser simultâneas) e criaram, no âmbito da ordem constitucional vigente, expectativas político-jurídicas (caso do anúncio de candidaturas independentes) que seriam incompreensivelmente frustradas.

II. A referência a uma ampla discussão de uma Constituição que definiria uma modalidade de eleição diferente da actual, para além de ser ela (a Constituição) a condicionar a elaboração de um calendário, induz a ideia da possibilidade de adiamento das eleições presidenciais, para lá de 2009, pela complexidade que um debate dessa natureza implica; o que, a meu ver, não ajudaria nada a consumar, num horizonte temporal conveniente, o corrente processo de normalização da vida política,económica e social, de que o Presidente da República e o MPLA têm sido os grandes timoneiros, com a colaboração de todos outros principais agentes políticos e da sociedade civil angolana, com repercussões bastante positivas no plano internacional.

Resumindo-me, e sem entrar, como referi acima, na profundidade das vantagens e desvantagens de uma ou outra modalidade de eleição presidencial, fico-me – e não acho pouco – na quase consternação, perante a eventualidade de um cenário que, mesmo possível, em termos políticos, em face da esmagadora maioria do partido no poder, configuraria uma situação de «golpe jurídico-constitucional» que não gostaria que fosse encorajado por ninguém, especialmente pelo MPLA, que não me parece necessitar dessa manobra tão perigosa para fazer valer a vitória do seu candidato natural às presidenciais já comprometidas para 2009.

Fonte: SA