Luanda –  Integra da analise do conhecido   especialista do direito criminal, Marcos de Oliveira  face a notícia por nós publicada sobre as provas ocultadas no processo do caso Bárbara de Sá Nogueira.

Fonte: Club-k.net

No final do ano passado Club‐K divulgou uma matéria sobre provas essenciais para a descoberta da verdade material no caso que ficou conhecido como “Barbara de Sá Nogueira” por parte dos órgãos de investigação criminal, pelo Ministério Publico e até mesmo pelo Tribunal que julgou o caso em primeira instância. Na altura Club‐K prometeu trazer a lume outros elementos, devido ao nosso compromisso com a verdade.

Para satisfazer o nosso público leitor, antes de passarmos a outros desenvolvimentos sobre o caso em si mesmo, entendemos para melhor elucidar os interessados, convidar um especialista em Direito Criminal, que, dada a delicadeza do caso, pediu o anonimato, para emitir a sua opinião técnica que a seguir publicamos.

Atento não apenas ao teor do texto publicado pelo Club‐K, mas essencialmente, aos elementos de prova enumerados e publicados no vosso artigo, depois de uma profunda analise dos mesmos e confrontada a situação com as normas do direito probatório, mais concretamente, as normas do artigo 174.o do Código do Processo Penal e 67.o, no2 da Constituição da República de Angola, que consagra o principio da presunção da inocência, importa dizer à titulo de introdução que, ainda que a arguida inicialmente declarasse que assune a autoria dos factos, mas se esta versão não encontrar qualquer apoio nos outros elementos de prova constantes no processo, neste caso seriam justamente os resultados dos exames em falta, ou de eventuais depoimentos ou declarações de outros participantes processuais que viram essencialmente como as coisas aconteceram, ou ouviram algo de importante relacionado com os factos da arguida ou de outras pessoas envolvidas no caso, esta confissão não serve para sustentar, de per si, a transformação do juízo de probabilidade em juízo de certeza e, desta feita, sustentar uma decisão condenatória, isto porque, em processo penal só um juízo de certeza deve servir de fundamento de uma decisão condenatória, uma vez que, quer os artigos atrás citados, com maior relevância do artigo 67o, no2 da CRA, consagram como consequência jurídica o princípio geral e sagrado do Direito Penal do in dubio pro reo, isto é, na duvida deveria o Tribunal decidir a favor da arguida.

Outrossim, para além de não terem sido juntos aos autos os resultados dos exames sobre os elementos de prova essenciais recolhidos no local do crime para a descoberta da verdade material, como por exemplo o exame das impressões digitais encontradas na faca e no carro da vitima, através dos quais se determinaria com exactidão quem foi a pessoa que utilizou a faca e que escondeu a viatura no local onde a mesma foi encontrada e, face a forma como o cadáver da vitima foi encontrado, isto é, de braços abertos, a versão sustentada no processo pela acusação de que a arguida confessou que colocou‐o (cadáver) numa mala no dia da ocorrência dos factos e só no dia seguinte é que levou para o local onde foi encontrado não colhe, uma vez que se assim fosse 24 horas depois o mesmo (cadáver) nunca poderia apresentar‐se naquela forma (de braços abertos), razão pela qual, as conclusões da peritagem, segundo as quais “de acordo com as declarações de Judith Maria Graça da Silva, reportadas nas fotos 83, 84 e 85, o momento em que ela, colocou o cadáver na mala, posteriormente em sacos, no dia 31 de Maio de 2013, não coincide com a realidade dos factos porquanto que o processo de rigidez cadavérica vai de 4 à 8 horas. O que impossibilitaria colocar os restos mortais de Barbara Marise Meneses de Sá Nogueira, na mala, ...”, desvalorizando de igual forma esta versão o que reforça a ideia do in dubio pro reo.

Isto porque o Direito Processual Penal não se conforma com a verdade formal, mas sim com a verdade material ou objectiva, isto é, o Juiz da causa penal, contrariamente, ao Juiz da causa cível que é passivo porque só age em função do pedido das partes, o primeiro é activo e tem a obrigação legal por força dos princípios da verdade material e do inquisitório de chegar, de per si, a verdade tal qual as coisas aconteceram e na mínima duvida por força do juízo de certeza que é o único fundamento para que seja tomada uma decisão condenatória, deve decidir a favor do arguido, já que, pelo que ficou exposto acima as decisões condenatórias não podem ser tomadas com base em presunções.

À guisa de conclusão, o processo em causa enferma de graves irregularidades que põe em causa a seriedade da justiça do nosso país, restando apenas ao Tribunal de recurso, no caso actual, o Tribunal Supremo, já que, embora a Constituição actual institucionalizou formalmente os Tribunais da Relação estes ainda não existem do ponto de vista material, absolver a arguida com base no princípio in dubio pro reo, ou na piores das hipóteses declarar nulo o julgamento e, consequentemente, a decisão condenatória por insuficiência de corpo de delito, à luz das disposições combinadas dos artigos 98o, n.o1 e §2o, do Código de Processo Penal.